Texto exclusivo
“Nova ou velha educação”, por Roberto Carneiro
Q são por videoconferência “duas vezes por semana porque não posso pagar mais”, conta a mãe, que o sente mais “distraído”, com maiores dificuldades de concentração e “perdeu ritmo de trabalho”.
Há crianças mais novas com explicações. Desde março que o centro de explicações Sala da Marta está a ajudar uma menina de 8 anos, que tem os pais em teletrabalho. “Recebemos pedidos novos de pais que estão preocupados com o que se está a perder neste 3º período”, explica a professora responsável, Marta Vieira.
No caso desta estudante do 2º ano, a escola privada de Lisboa realiza aulas diárias por videoconferência de duas horas com um intervalo de meia hora e que inclui aula de música e de ginástica à turma de 18 alunos. A rapariga já não desaparece da frente do computador durante a aula, mas distrai-se e começa a pentear-se. E não consegue fazer sozinha as cinco fichas que a escola envia todos os dias. “Está sempre a chamar-nos. Divaga muito e connosco é mais desafiadora”, diz o pai.
Ana Benavente recorda que esta é uma solução para quem pode pagar. E desse modo, quem não pode tem mais uma desvantagem – sobretudo quando se apresentar a exame. “Esta obsessão política de mantê-los, dá ao exame um poder mágico ignorando outras questões. Os mais novos, que estão no 4º e no 6º ano, são quem mais sofre com a falta de sociabilidade. Estão cheios de pena de não reverem os colegas. Na Suíça decidiu-se que, antes das férias, voltariam nem que fosse uma semana porque não é a mesma coisa online e presencialmente. Aqui não”, diz. h Os exames são uma forma de acesso ao ensino superior que dão a “ilusão de justiça, equidade e meritocracia”, explica José Matias Alves, que investigou o tema no seu doutoramento. “Há muitas aprendizagens que são vitais para a vida que não são desenvolvidas na escola por causa dos exames”, diz o professor da Universidade
Católica Portuguesa. Este período de reclusão forçada poderia ser aproveitado para desenvolver essas competências em vez da “reprodução de conhecimento” que logo a seguir aos exames os alunos esquecem. Adivinha até a “exaustão emocional” da preparação para os exames deste ano, que tornará a “aprendizagem mais difícil”: “Em vez de aprenderem mais, podem aprender menos.”
Leonor Lima quer ser médica e, por isso, os exames de Biologia e Físico-Química deste ano são importantes. Mas está preocupada. “Durante estas semanas cumpri as metas das disciplinas, mas não consegui tirar
O papel dos pais, a falta de orientações das autoridades de Educação para se fazer o acompanhamento da estabilidade emocional dos alunos à distância e a necessidade de inovar são alguns dos temas abordados num artigo de opinião exclusivo do ex-ministro da Educação e pedagogo Roberto
Carneiro que pode ler em
LEONOR ESTUDA “5 A 6 HORAS” POR DIA, MAS É DIFÍCIL CONCENTRAR-SE. TEME NÃO CONSEGUIR MÉDIA PARA MEDICINA
Itália e Espanha só reabrem em Setembro. Holanda e França (1.º ciclo) estão a reabrir. Alemanha fará o mesmo. A Noruega alargou ao secundário um bocado de tempo para estudar para o exame. Acho que teria outro empenho no estudo se estivesse a ter aulas na escola.”
A aluna do 11º ano, da Secundária de Palmela, estuda todos os dias cinco a seis horas, mas diz que “é muito difícil” concentrar-se. “Há tanta coisa que podemos fazer em casa: falar com os amigos, ir até à cozinha.” Tem dúvidas de que consiga a média para entrar em Medicina.
Existe ansiedade nos docentes e alunos que terão de regressar a 18 de maio, conta Eulália Medeiros Paulo, professora e mulher de Paulo Guinote. A sua turma de 12º ano tem-lhe feito perguntas sobre máscaras, limpeza ou as viagens nos transportes públicos. “A minha filha, que está no 11º, já me perguntou se a mochila tem de ser trocada todos os dias?”
Aliás, diz José Matias Alves, as condições sanitárias, apesar de necessárias, podem trazer mais problemas do que benefício. “Existe o risco de a escola passar a ser um espaço concentracionário. Os alunos não podem ir ao recreio, não podem conviver. Para irem almoçar têm de ir em turnos. Ninguém consegue viver assim”, diz o professor da Faculdade de Educação e Psicologia da Universidade Católica do Porto. Eulália Medeiros Paulo antevê que “será difícil entre eles não se tocarem, não estarem juntos. Se o próprio primeiro-ministro e o ministro da Educação apertaram a mão”. W