A ADAPTAÇÃO É O CAMINHO
Graças a marcas como Sossego e Trinca Bolotas, a Herdade do Peso duplicou as vendas nos últimos cinco anos e, apesar da atual crise, encara o futuro com confiança.
privilegiada da Vidigueira, vizinha da protetora serra do Mendro e do Alqueva, a Herdade do Peso até uma pequena barragem tem nos seus 465 hectares – de que apenas 120 são de vinha, de modo a respeitar a biodiversidade.
Os números não enganam: esta propriedade com 12 tipos de solo em relevo ondulado, foi aposta certeira da Sogrape, referência no Douro com o Barca Velha e sucesso mundial com o Mateus Rosé, quando entrou no Alentejo na década de 1990.
O PRODUTOR
Embora tenha negócios em várias regiões do País, a Sogrape guarda um lugar especial para a Herdade do Peso. “Graças à sua extensão e variedade de terroir, já representa dois terços do volume de negócios, o que contribui para a nossa liderança em Portugal”, diz à SÁBADO o administrador João Gomes da Silva, explicando que a sua estratégia assenta em dois eixos: “Os vinhos de gama média, Sossego, mais em conta, e Trinca Bolotas, orientado para um consumidor jovem e cosmopolita. Por outro lado, a exploração das terras para lá do óbvio, virada para vinhos premium, para quem quer sofisticação e mais complexidade.” Refere-se, claro, aos topos de gama: Herdade do Peso Reserva (€16), Essência (€28,50) e Ícone (€85), pequena fatia das vendas, mas fulcral para o prestígio da marca.
“Temos vinhos de referência na gama média e as pessoas valorizam isso. Preferem marcas de confiança, que já conhecem. É o normal num clima de incerteza”
A HISTÓRIA
Hoje a vender o dobro de 2015, 150 mil caixas, de 9 litros, anuais, de um total de 14 referências, a Herdade do Peso, onde a pandemia não beliscou o ritmo de trabalho, tem tido um crescimento constante a dois dígitos. Não espanta, pois, que a inovação ande a par da
tradição. As castas são as regionais, com foco na Alicante Bouschet em tintas e Antão Vaz em brancas, e na adega vigoram as barricas usadas (e em breve tonéis, mais pequenos) e os estágios curtos, para não deturpar a identidade natural dos vinhos. Mas também se arrisca na modernização tecnológica e na investigação: há painéis solares a ajudar as maturações e nova vinha, “para ver o que dá”, da casta Verdelho, dos Açores.
O VINHO
“Essencial é que o vinho mostre o lugar de onde vem”, afirma Luís Cabral de Almeida, o enólogo da herdade. Tem a vida facilitada pela terra e o seu relevo atípico, mas não se limita a ver a natureza a trabalhar: “Procuro aproveitar e preservar as condições naturais, mas também experimento, para escolher as uvas certas para cada vinho.”
O resto é intuição, misturada com uma estratégia clara: “Fazer vinhos únicos, mas diretos, sem madeira. Há uns anos, era
um caminho arriscado não jogar com os aromas fora da uva, mas tivemos a coragem de o fazer e o consumidor deu-nos razão, aderiu.” Exemplar é o êxito Trinca Bolotas tinto: nasceu em 2014 com 120 mil garrafas e em 2019 ultrapassou o milhão.
O FUTURO
Para João Gomes da Silva, o futuro será risonho, apesar da pandemia: “É verdade que houve um decréscimo, sobretudo devido ao fecho de restaurantes e hotelaria, a representar 30% das vendas, mas acredito que é uma situação passageira. Aliás, já temos novas encomendas.”
Quanto às exportações, que garantem 14% do negócio, “notou-se um congelamento”, mas uns mercados compensaram outros: “Em janeiro e fevereiro, desapareceram os asiáticos, mas o Brasil bateu recordes.”
Ao mesmo tempo, as vendas online cresceram e, nas lojas, mantiveram-se: “Temos vinhos de referência na gama média e as pessoas valorizam isso. Preferem marcas de confiança, que já conhecem e apreciam, a aventurar-se em novidades ou coisas diferentes. É o normal num clima de incerteza.”
E, se a incerteza marca o momento, “a adaptação é o caminho” e vai sendo planeada “mês a mês”. Sem medos, como refere Luís Cabral de Almeida: “Este negócio vive de investimentos a décadas, desde sempre. Plantamos uma vinha e só engarrafamos o que dá 10 anos depois.”
Nesse contexto, meia dúzia de meses de crise são só um percalço, como defende Gomes da Silva: “Isto não nos vai destruir. Só temos de acompanhar as mudanças e saber reagir ao mercado.” W