O banquete dos abutres no Novo Banco
Espantosamente, há muita gente espantada (passe a redundância) com o que está a acontecer no Novo Banco. Uns com as negociatas que temos vindo a conhecer. Outros com a alegada legalidade das operações de venda de ativos, por serem autorizados pelo Fundo de Resolução, conhecidas – e, portanto, autorizadas – pelo Banco de Portugal. Outros ainda pelo facto de as ditas operações constarem do contrato de venda à Lone Star, etc., etc. O espanto em Portugal sempre foi uma espécie de pantomima, o instrumento de uma pequena propensão para a farsa. Fingimo-nos espantados com tudo o que conhecemos para que não nos chamem alguns nomes, não nos peçam responsabilidades ou encargos. O desconhecimento, verdadeiro ou fingido, sempre foi uma poderosa arma da impunidade. E lá pelas bandas do Novo Banco toda a gente sabe isso.
Ora, com mais ou menos armadura de verdade formal ditada pelos contratos, pelo Fundo de Resolução ou seja lá o que for, o que ali está exposto é uma vasta teia de interesses que joga com o privilégio da informação, do tempo em que é obtida e toda a extensão que comporta, para concretizar negócios chorudos.
Em Portugal, foi sempre assim. As grandes negociatas com dinheiros públicos, vampirizando o Estado por conta de um qualquer imperativo categórico, como o de evitar riscos sistémicos na banca ou a falência da máquina fiscal, como aconteceu no caso dos perdões fiscais em 1986, sempre tiveram na sua origem atos legislativos que conferiram a necessária cobertura da legalidade à pura trafulhice. A lei sempre serviu os ladrões letrados e confortavelmente untados pela legitimidade eleitoral, bem como os respetivos amigos.
O mesmo acontece agora no Novo Banco. As operações estão alegadamente autorizadas, os destinatários fazem o negócio de uma vida com o dinheiro dos contribuintes portugueses, que vai a toda a velocidade para os bolsos dos homens dos fundos-abutre, dos seus amigos, intermediários e cúmplices. O que se passa no Novo Banco é um verdadeiro banquete de abutres por conta de todos nós. Podem explicar tudo o que quiserem, envolvendo as notícias (em particular do jornal Público) num manto de vitimização por alegada perseguição, podem querer manchar o trabalho de escrutínio jornalístico com um dos habituais ventiladores de lama, que já eram a arma dos seus antecessores no BES e ficaram lá esquecidos à disposição dos atuais gestores, que nunca conseguirão mascarar o essencial do banquete pantagruélico que por ali corre. E não vale a pena começar a gritar por justiça, exigindo ao direito penal e aos tribunais que resolvam o que uma parte muito influente do poder político armou e blindou em relação a investigações judiciais. Isso nunca levará a lado nenhum. Se cumprirem as suas funções mais básicas de fazer política em nome do povo, os senhores deputados deveriam chamar o assunto ao parlamento com toda a urgência. A menos que queiram esperar pelo fim das férias, que os calores de agosto sejam substituídos pelos ventos do outono, e que o Chega se aproprie do assunto para poderem dizer que recusam abordagens populistas a um assunto tão sério… W
A foto aérea mostra a mancha negra causada pelo MV Wakashio. Encalhado há duas semanas a sudeste da ilha Maurícia, no oceano Índico, o petroleiro está a derramar parte das 4 toneladas de gasóleo e petróleo naquela zona protegida, ameaçando os recifes e lagoas de Blue Bay ou Pointe d’Esny. A França já enviou técnicos para o local, para tentar evitar a catástrofe.