OS NEGÓCIOS DA ALTICE
A empresa vendeu discretamente vários imóveis a empresas ligadas a Hernâni Vaz Antunes
Foram vendidos quatro prédios em Lisboa, que eram do fundo imobiliário da antiga PT, por um total de cerca de 15 milhões de euros. Os compradores têm ligações a um complexo circuito empresarial montado em Braga, na Zona Franca da Madeira e no Dubai. E com relações muito estreitas ao empresário Hernâni Vaz Antunes, a familiares e sócios. Na mesma altura, duas dessas empresas venderam uma moradia de luxo a Alexandre Fonseca e dois apartamentos a amigas íntimas de Hernâni e de um dos donos do grupo Altice, Armando Pereira.
A 2 de março de 2020, no primeiro andar do Cartório Notarial da Av. 5 de Outubro, em Lisboa, dois procuradores de empresas finalizaram o negócio imobiliário sinalizado quase um ano antes com um cheque de 1,4 milhões de euros. Naquele dia, Ana Magalhães e Ricardo Sobral representaram, respetivamente, a Meo/Altice Portugal e a Smartdev, uma empresa sediada na Zona Franca da Madeira, especializada em informática, telecomunicações e imobiliário, constituída com um capital de 60 mil euros em março de 2019, cerca de um mês antes da assinatura do contrato de promessa de compra e venda do imóvel da antiga Portugal Telecom (PT).
Segundo o documento definitivo da escritura pública do prédio de Lisboa a que a SÁBADO teve acesso, o negócio imobiliário custou à Smartdev um total de 7 milhões de euros, pagos através de dois cheques do Millennium bcp. Primeiro, foram avançados os já referidos 1,4 milhões, depois, mais 5,6 milhões de euros quando foi assinada a escritura. A transação não teve a intervenção de intermediário oficial, ou seja, não esteve envolvida uma agência imobiliária.
O imóvel em causa da Altice Portugal é um edifício com uma área coberta de 398 metros quadrados, composto por subcave, cave, loja, galeria de loja e nove pisos, localizado em pleno centro da capital, o nº 32 (também o A e B) da Avenida Fontes Pereira de Melo. Conhecido como o edifício Sapo (em alusão a um dos serviços emblemáticos da PT, que lá terá estado sediado), trata-se de um prédio envidraçado escuro situado ao lado da 10ª Repartição de Finanças e junto ao Teatro Villaret.
Quando se consulta o histórico do edifício na Conservatória do Registo Predial de Lisboa, percebe-se que se trata de um dos muitos imóveis que fez parte durante largos anos do antigo Fundo de Pensões do Pessoal dos TLP/PT (infografia págs. 46 e 47). Adquirido em 1993 a Maria del Pilar Sotomayor pelo Fundo de Investimento Imobiliário Fechado TDF e, três anos depois, permutado com a Portugal Telecom, SA, o imóvel acabou em 2000 integrado no património do Fundo de Pensões do Pessoal da PT/CGA.
Administrado há longos anos por uma sociedade gestora cujo controlo passou também para a Altice aquando da compra da PT em 2015, a Previsão (o presidente da Administração é João Zúquete da Silva, também CCO da Altice Portugal), o prédio da Fontes Pereira de Melo (e mais outras dezenas de imóveis) foram incorporados, em 2006, no Fundo de Pensões do Pessoal dos TLP que, quatro anos depois, foi adquirido pela PT Comunicações (posteriormente, Meo, Serviços de Comunicações e Multimédia). Em 2010, o prédio estava integrado num fundo imobiliário (juntamente com o Fundo de Pensões Regulamentares da Companhia Portuguesa Rádio Marconi) avaliado num total de cerca de 229 milhões de euros. Segundo uma das escrituras públicas referente a estes negócios imobiliários, há cerca de 10 anos, o edifício Sapo custou quase 6 milhões de euros – €5.829.887 – à PT Comunicações.
Voltemos à Smartdev, a compradora do edifício Sapo, e à complexa rede de ligações integrada por esta empresa sediada na Zona Franca da Madeira (ZFM). São os dados depositados na Conservatória do Registo Comercial e Cartório Notarial Privativos da ZFM que fornecem as primeiras pistas deste circuito, pois identificam aqueles que foram os dois primeiros sócios igualitários da Smartdev, ambos com moradas na cidade de Braga: Abel Barbosa e o economista Álvaro Gil Loureiro.
Segundo o site britânico Opencorporates, que é um banco de dados mundial que recolhe e organiza milhões de registos de Q
Q empresas (foi uma das fontes de informação dos jornalistas do caso dos Panamá Papers), Gil Loureiro é também, desde 2019, o titular da Mind Partners, uma empresa alegadamente centrada em marketing e consultoria de comunicação sediada na República Dominicana. Mas o empresário tem tido, sobretudo, negócios constituídos na região de Braga. Uns duraram muito pouco tempo e quase não tiveram resultados operacionais, como sucedeu com as empresas Jean-Paul Lorent e a Transcend Level. A primeira, ficou aberta um ano, a segunda, dois. Já outros correram bem melhor. No fim do ano passado, Gil Loureiro era também um dos acionistas e gerente da construtora Gomes & Novais Internacional, Lda., estando a maior parte do capital social da empresa nas mãos de outras duas construtoras, a Vintagepanóplia, com sede na ZFM e gerida por André Coutada, e a sociedade anónima Vaguinfus, igualmente constituída em Braga,
Precisamente as duas empresas que representam o centro de poder no complexo circuito empresarial que adquiriu o edifício Sapo (e fez outros três negócios imobiliários com a Altice Portugal, bem como a venda de uma moradia ao próprio CEO, Alexandre Fonseca). São também estas duas empresas que estarão ligadas ao empresário Hernâni Vaz Antunes, a familiares e a sócios – Hernâni é amigo e visto como uma espécie de braço direito português de Armando Pereira, um dos três donos do grupo Altice.
Comecemos pela Vaguinfus, que tem sido gerida por José da Silva Pinto, um dos homens de confiança de Hernâni Antunes. Mais: a Vaguinfus tem participações acionistas maioritárias ou relevantes em outras empresas sediadas em Braga e relativamente recentes, como a empreiteira Dunas de Contrastes, a Glaciervariable Communications e a mediadora de seguros Guardian Calculus, também geridas por Silva Pinto e José Maria Vieira (igualmente ligado aos negócios com a Altice como veremos adiante).
Uma outra empresa controlada pela Vaguinfus (e pela Vintagepanóplia)
A GLOBAL GOLD, COM SEDE NO DUBAI, É A DONA DAS EMPRESAS POR TRÁS DOS NEGÓCIOS COM A ALTICE
é a Edge Technology, aberta desde 2016 na Zona Franca da Madeira, e que em 2019 teve resultados líquidos de cerca de 25 milhões de euros (as vendas e as prestações de serviços foram de 63 milhões). A Vaguinfus tem 42,5% da Edge, a Vintagepanóplia outros 42,5% e o terceiro maior sócio é a filha de Hernâni Antunes, a antiga jogadora de futebol do Braga, Melissa Antunes – tem 14% em nome individual. Para finalizar: a Vaguinfus é detida em 90% pela Global Gold International Commercial Broker, uma sociedade offshore do Dubai, nos Emirados Árabes Unidos.
Mas a ligação a Portugal desta Global Gold faz-se também por via da Zona Franca da Madeira, porque é igualmente a principal acionista (90%) da Vintagepanólia, uma sociedade relativamente recente (constituída em 2016) que começou por ter um capital social de 5 mil euros (agora já está nos 500 mil) e soma resultados consideráveis – em 2017, teve lucros de cerca de 2,3 milhões de euros, em 2019, foram perto de 26,4 milhões de euros.
As ligações de Hernâni Antunes
Apesar de o registo dos beneficiários ativos da Global Gold identificar um cidadão natural dos Emirados, Meteb Alnasri, são várias as ligações que indiciam que Hernâni Antunes, 58 anos, participa, direta ou indiretamente, neste circuito financeiro e de empresas que liga Braga, a ZFM e o Dubai. Conhecido no meio empresarial como “o comissionista”, Hernâni está ligado a muitos negócios, sobretudo na área do imobiliário, e a inúmeras empresas que já lhe deram seguramente muito dinheiro, apesar de vários revezes e até insolvências à mistura. Ex-emigrante no Canadá, para onde foi antes dos 18 anos sem os dois irmãos e a irmã, Hernâni regressou a Portugal já depois dos 30 anos para se tornar empresário de máquinas de diversão e de videojogos. Natural de Pedralva, uma pequena freguesia do concelho de Braga, foi ali que recuperou com a mulher, Marie Carmen (estão casados em regime de comunhão de adquiridos), uma quinta degradada na Travessa das Eiras. É a sua casa de campo, onde produz vinho e faz patuscadas com amigos, sócios e família – o casal e as filhas Jéssica e Melissa (nascidas no Canadá) vivem na realidade noutras casas na freguesia de Gualtar, também em Braga.
Com o passar do tempo, Hernâni lançou-se em definitivo nos negócios do comércio e do imobiliário. Consigo tem estado o gerente e administrador José Silva Pinto (Vaguinfus), visto como um homem de mão até em empresas mais antigas que acabaram inativas ou extintas, como a Pura & Cristalina, Lda., dedicada ao comércio a retalho. A empresa foi fundada em dezembro de 2007 e dissolvida oito anos depois. Outro exemplo é o da Urbinews, dedicada
à compra e venda de imóveis, constituída há 20 anos e hoje inativa: Hernâni é o presidente da administração da sociedade anónima e Silva Pinto vogal da administração.
Mas foram as relações de Hernâni a um outro emigrante minhoto, Armando Pereira (natural de Guilhofrei, concelho de Vieira do Minho), um dos quatro donos do grupo franco israelita Altice, liderado por Patrick Drahi, que o levou para outros voos logo em 2012, quando a Altice comprou a Cabovisão por 45 milhões de euros, e Hernâni foi mandatado para negociar com vários fornecedores.
Visto como uma espécie de braço-direito para Portugal de Armando Pereira, com quem esteve em várias reuniões durante as negociações para a compra da PT, Hernâni passou até a ter um gabinete para trabalhar na empresa após a aquisição da PT pela Altice aos brasileiros da Oi por 7,4 mil milhões de euros. Quando a Meo teve de (re)negociar os contratos dos direitos de transmissão de jogos de futebol com vários clubes, foi Hernâni Antunes que também apareceu mandatado pela Altice e por Armando Pereira. Aliás, nos últimos anos, Hernâni tem-se rodeado de vários sócios, amigos e até familiares com ligações a negócios relativos a patrocínios e outros direitos desportivos. Em julho de 2017, Armando Pereira resumiu assim à SÁBADO o que fazia o amigo: “Ele presta consultoria à Altice nos negócios em Portugal. Conhece toda a gente, é precioso para os negócios aqui.”
Assim, além da eventual participação no circuito de empresas relacionadas com o edifício Sapo (apesar de inúmeras tentativas até para as empresas, a SÁBADO não conseguiu contactar Hernâni Antunes), o empresário terá participado nos bastidores de outros negócios de imobiliário que faziam parte do antigo fundo de pensões da PT. Na segunda operação financeira, a Vintagepanóplia usou a Almost Future, uma sociedade instrumental da qual chegou a deter quase 90% do capital social (é atualmente cerca de 18%).
A 29 de outubro de 2019, foi Ricardo Sobral (o representante da Smartdev no negócio do edifício Sapo) que esteve num notário de Lisboa, mas dessa vez como procurador da Almost Future na compra de um prédio da Altice Portugal localizado na zona da Estefânia, em Lisboa. Segundo a SÁBADO apurou, Sobral é um empresário dono de um ginásio de Braga, que já teve negócios na área dos direitos económicos e desportivos – foi sócio minoritário em duas empresas que estão há alguns anos extintas ou sem atividade (a Mercury Player e a Kick & Play).
Como depois ocorreu no caso do edifício Sapo, o negócio da Estefânia começou cerca de um ano antes, em 2018, com a assinatura do contrato de promessa de compra e venda e uma entrada de 740 mil euros em cheque. Depois, segundo o contrato notarial consultado pela SÁBADO,a
FOI SEMPRE O MESMO O PROCURADOR DAS EMPRESAS QUE COMPRARAM OS IMÓVEIS À ALTICE PORTUGAL
Almost pagou uma segunda tranche de €2.900.060. Total do negócio: 3,7 milhões de euros. Curiosamente, e ainda segundo o contrato, o valor patrimonial do imóvel (tradicionalmente calculado por baixo pelas Finanças em relação aos preços de mercado) era de quase 4,2 milhões de euros, ou seja, de mais cerca de meio milhão de euros em relação ao que a Almost pagou à Altice Portugal.
O imóvel tem uma área de 600 metros quadrados e é composto por três caves, rés do chão e seis andares. Fica numa zona nobre da capital, na Rua D. Estefânia, nº 82 a 82C, e na Travessa de João Vaz, nº 9. Segundo o historial predial, o edifício foi adquirido em 1988 pelo INESC, Instituto de Engenharia de Sistemas e Computadores (historicamente muito ligado à Portugal Telecom), tendo sido comprado em 1995 pela PT.
Mas afinal o que é a Almost Future? É uma sociedade anónima constituída com 1 milhão de euros no dia a seguir ao Natal de 2016. Na altura, a empresa tinha como acionista principal, com 89,97% das 200 mil ações, a Vintagepanóplia. Outros 10% das ações pertenciam à Kpartner, uma promotora imobiliária muito recente sediada no Centro de Negócios de Oleiros, em Vila Verde. No entanto, a Kpartner é detida por uma SGPS também com sede na Zona Franca da Madeira, a IBG Europe, propriedade de uma holding internacional com o mesmo nome sediada em Malta. Outro dos então sócios da Almost Future, com uma participação simbólica de 0,01%, era o também presidente da administração, José Maria Vieira. O vogal da administração era André Coutada. Questionado por telefone e por escrito sobre as relações empresariais da Vintagepanóplia com Hernâni Antunes e os negócios imobiliários citados neste trabalho, Coutada assegurou que “nenhum outro nome, para além do que consta na certidão comercial, participa na Vintagepanóplia (VP), nomeadamente os nomes que me refere e/ou familiares. E posso confirmar que as relações empresariais entre estas duas empresas, VP e Almost Future, são desenvolvidas de forma absolutamente independente, seguindo cada uma o seu
Q escopo empresarial pelo que nenhuma relação existe ou existiu entre os negócios celebrados com terceiros por uma e outra, tal como as vendas por si referidas, as quais se desenrolaram exclusivamente entre as intervenientes e no seguimento do normal desenrolar do objecto social da VP”.
Certo é que a Almost Future foi mudando a sua composição acionista, o próprio nome da empresa e até a morada, que passou de um 2º andar na Av. da República para o escritório de uma entidade gestora de investimentos na Av. Fontes Pereira de Melo. Hoje, 70% das ações da Almost Future, Sicafi (o novo nome) são de Hernâni Antunes e outros 10% estão divididos igualitariamente pelas filhas Jéssica e Melissa Antunes. A Vintagepanóplia reduziu a participação no capital para 18% e José Maria Vieira, o ainda presidente do Conselho de Administração, mantém uma ação. O capital social, que chegou a ser de 1 milhão de euros, baixou para 250 mil. Já os lucros (2019) foram de cerca de 2,1 milhões de euros. A empresa tinha então um ativo de 12 milhões e um
A ALMOST FUTURE MUDOU DE NOME E HERNÂNI ANTUNES PASSOU A TER 70% DAS AÇÕES DA EMPRESA
passivo de 8,8 milhões de euros.
O quadro das movimentações financeiras e empresariais da Almost Future torna-se mais claro quando se juntam outros negócios imobiliários que a empresa fez durante este período com a Altice Portugal. Menos de dois meses após a compra do edifício na Estefânia, novamente o procurador Ricardo Sobral formalizou num notário de Lisboa a aquisição de mais um edifício com cave, rés do chão com loja e seis andares, o nº 4 (4A e 4B) da Rua Andrade Corvo.
Segundo a escritura pública de 16 de dezembro de 2019 a que a SÁBADO
também acedeu, a transação foi feita por um total de 2,1 milhões de euros. O valor foi pago através de dois cheques. O primeiro: o sinal de 490 mil euros, assinado cerca de 16 meses antes, a 27 de agosto de 2018. O segundo: um cheque também do Millennium bcp, de 1,610 milhões de euros, passado no dia da escritura do imóvel. No contrato ficou também estabelecido que não houve imobiliária como intermediária e que a Al
most Future tinha a intenção de revender o antigo prédio da PT localizado no centro no Lisboa (até hoje não se terá concretizado ).
Juntamente com a Smartdev, a Almost Future participou ainda num quarto negócio imobiliário com a Altice Portugal. A SÁBADO não conseguiu aceder ao respetivo contrato de compra e venda até ao fecho desta edição, mas consultámos a escritura da revenda do imóvel. Foi a 21 de
AS ESCRITURAS PÚBLICAS REVELAM QUE OS NEGÓCIOS IMOBILIÁRIOS FORAM FEITOS ENTRE 2018/20
dezembro de 2020 que os representantes das empresas vendedoras, José Maria Vieira e André Coutada (Almost Future) e Álvaro Gil Loureiro (Smartdev) estiveram nas instalações do notário na Rua do Salitre, em Lisboa. Nesse dia, o antigo procurador da Almost Future e Smartdev, Ricardo Sobral, também assinou o contrato de compra e venda do imóvel, mas em representação do novo comprador, uma imobiliária criada há cerca de 10 meses e também com morada em Braga, a Jacques, Real State.
Pouco dias antes deste negócio concretizado por um total de 2,9 milhões de euros, a imobiliária gerida por Olivier Jacques Duquesne teve um ligeiro aumento de capital e mudou a forma jurídica: passou de uma sociedade unipessoal
para uma sociedade por quotas. Na realidade, e segundo os registos oficiais da empresa consultados pela SÁBADO, a Smartdev passou a ter uma participação acionista de cerca de 10% na Jacques, Real State. No entanto, apesar da participação minoritária, foi a Smartdev que se comprometeu a pagar metade do valor previsto na escritura de venda do imóvel localizado nos nºs 7 e 9 da Rua da Moeda (Marquês de Pombal).
A nova casa do CEO da Altice
Ainda segundo o documento da escritura pública, estes 1,450 milhões de euros teriam de ser pagos pela Smartdev “até ao prazo de cinco dias úteis” e por transferência bancária de uma conta do Millennium bcp para outra do mesmo banco. Quanto aos outros 1,450 milhões de euros pagos no ato da escritura, isto foi feito através de um cheque do Bankinter passado pela Jacques, Real State. No dia seguinte a este negócio feito em Lisboa, Jacques Duquesne constituiu e instalou em Braga, com 3 mil euros de capital, mais uma sociedade unipessoal dedicada ao imobiliário, a Jreds Services.
Durante o período em que a Altice Portugal estava a vender vários Q
Q imóveis à Almost Future e à Smartdev (empresas controladas pela Vintagepanóplia, Vaguinfus, Hernâni Vaz Antunes, familiares e sócios), verificou-se outro negócio imobiliário. A 1 de março de 2019, no Cartório Notarial de Oeiras Lucinda Gravata, encontraram-se o gestor André Coutada, o sócio-gerente da Vintagepanóplia, e o presidente executivo da Altice Portugal, Alexandre Fonseca, e a mulher, Anabela, casados em regime de comunhão de bens adquiridos.
Nesse dia, a Vintagepanóplia vendeu ao casal Fonseca, por 1 milhão e 50 mil euros, uma moradia de luxo localizada em Barcarena, uma das freguesias de Oeiras. Segundo a escritura pública de compra e venda a que a SÁBADO acedeu, o negócio ficou acertado assim: no ato da assinatura do contrato foi feito um pagamento pelo casal de 200 mil euros através de um cheque do banco Santander; a dívida remanescente (859 mil euros) teria de ser paga “em 36 prestações mensais e sucessivas, das quais, 35 no montante de €23.611,11 e a última de €23.611,15, mediante cheque à ordem” da Vintagepanóplia. A primeira das prestações ocorreria até 30 de abril de 2019 e o total da dívida seria pago até março de 2022.
Alexandre Fonseca tem hoje 46 anos e, em 2020, o Jornal de Negócios considerou-o o 47º mais poderoso do ano (lista com 50 nomes). Licenciado pela Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa, é desde 2017 o presidente executivo da Altice Portugal. Contudo, a ligação de Fonseca à Altice começou alguns anos antes, em 2012, quando o grupo comprou a Cabovisão (hoje Nowo), a operadora onde trabalhava desde 2007 como diretor de sistemas e tecnologias de informação.
O perfil do gestor agradou a Patrick Drahi, ao sócio português Armando Pereira e ao empresário Hernâni Antunes e a subida foi rápida. Primeiro, foi promovido a Chief Technology Officer, depois passou a presidente executivo da Oni, entretanto adquirida pela Altice. Mal a multinacional fechou a compra da PT em junho de 2015, Alexandre Fonseca passou a marcar presença nas mais importantes decisões e a liderar o Altice Labs, a antiga PT Inovação, em Aveiro. Até que, no fim de 2017, com a saída de Cláudia Goya de presidente executiva da Altice Portugal, Fonseca foi o escolhido para liderar a empresa.
Pouco mais de um ano depois, o gestor avançou para a compra da moradia de Oeiras, que tem 1.512 metros quadrados de área total (220,12 metros quadrados de área coberta) e é composta por cave, rés do chão, 1º andar e logradouro, conforme indica o registo predial público do imóvel que consta na 1ª Conservatória de Braga. Antes de se mudarem para esta casa, o casal Fonseca já morava numa moradia bifamiliar (geminada), com 424,93 metros quadrados de área total (131 metros quadrados de área coberta) comprada em 2003, em S. Domingos de Rana, Cascais. Através da consulta do imóvel na conservatória do registo predial local percebe-se que o casal morou antes num 3º andar de Monte Abraão, no concelho de Sintra.
“Confirmo assim que a minha esposa e eu adquirimos em 2019 um imóvel em Oeiras, destinado a primeira habitação, na sequência da alienação da nossa anterior residência. A aquisição do imóvel, tal como consta na escritura pública e nas condições nela descritas, foi efetivamente feita à empresa Vintagepanóplia, a preço de mercado”, confirmou por escrito Alexandre Fonseca, depois de a SÁBADO lhe perguntar, também por escrito, se queria esclarecer os negócios imobiliários, o pessoal e os da Altice Portugal (ver respostas da empresa na pág. 50). Isso e as eventuais ligações a empresas detidas ou controladas por Hernâni Antunes, sócios e familiares. “Já no que concerne às questões que coloca, relativas à entidade vendedora, a terceiros ou relações entre estes, nunca foi minha prática pessoal tecer comentários sobre assuntos que me são alheios e que desconheço”, concluiu o CEO da Altice Portugal.
As amigas de Hernâni e Pereira
Nos últimos dois anos, as empresas Vintagepanóplia e a Vaguinfus fizeram também, durante as compras dos prédios em Lisboa da Altice Portugal, outros negócios imobiliários, por exemplo, com duas mulheres, as irmãs Vânia e Cristina Couto, amigas íntimas de Hernâni Antunes e Armando Pereira. Com 34 e 38 anos, Vânia e Cristina estiveram até há bem pouco tempo ligadas à Adress House, uma empresa cujo objeto social é o imobiliário, o comércio a retalho de equipamentos de telecomunicações e o design de interiores. Empresa que, em janeiro deste ano, mudou a composição acionista e a sede social para o 1º andar do nº 5 da Rua da Picaria, no centro histórico do Porto. Precisamente o edifício onde
está um dos imóveis do fundo de pensões do pessoal da PT, hoje da Altice Portugal.
A Adress House foi constituída em abril de 2018 e tem um capital social de 5 mil euros. Em 2019, a empresa fez negócios avaliados em 602 mil euros e deu lucro de 41 mil euros. As acionistas igualitárias já foram as duas irmãs, mas Vânia deixou de ser sócia-gerente e a sua participação de 50% passou para uma nova sociedade unipessoal, a Whatawonder, constituída pela irmã Cristina em novembro de 2020. Antes disso, em julho de 2020, Cristina Couto comprou um apartamento de luxo à Vintagepanóplia. Segundo os documentos públicos consultados pela SÁBADO, que constam na Conservatória do Registo Predial de Matosinhos e no Cartório Notarial de Barcelos, a Vintagepanóplia adquiriu o imóvel em novembro de 2019 devido à insolvência do anterior proprietário, que em 2008 contraiu um empréstimo de 300 mil euros ao Barclays e que acabou por não pagar.
Na escritura assinada a 28 de julho de 2020 por André Coutada e Cristina Couto, respetivamente, representantes da Vintagepanóplia e da
Adress House, consta que o pagamento acertado foi de 350 mil euros, a pagar da seguinte forma: 200 mil euros por transferência interbancária na data da assinatura do contrato e o remanescente “no prazo de um ano a contar desta data [o pagamento teria de ser feito até 28 de julho de 2021], também por transferência bancária” da conta da Adress para a da Vintagepanólia. Nos documentos ficou registado que o apartamento, o lugar de estacionamento e o compartimento de arrumos se destinava a revenda. Coutada garantiu à SÁBADO que tudo foi cumprido pela compradora “até ao momento”.
Através do Google Maps percebe-se que o imóvel de Cristina Couto, quando se segue pela Av. da Liberdade, a marginal que percorre a principal frente de praia de Leça da Palmeira, fica a cerca de 600 metros a pé do apartamento da irmã, Vânia Couto. Além da anterior ligação à Adress House, Vânia Couto foi sócia de, pelo menos, duas outras empresas familiares com sede em Fafe e ligadas à construção e compra e venda de imóveis. Mas tanto a Vânia Baptista & Couto como a Fernando Couto, Cristina e
O ACIONISTA MINORITÁRIO DA EMPRESA QUE RECOMPROU IMÓVEL DA ALTICE PAGOU METADE DO NEGÓCIO
AMIGAS ÍNTIMAS DE HERNÂNI ANTUNES E ARMANDO PEREIRA COMPRARAM TAMBÉM IMÓVEIS À VINTAGEPANÓPLIA E À VAGUINFUS
Vânia, Construção duraram poucos anos e entraram em liquidação ou em insolvência (chegaram a ter várias dívidas a fornecedores, à Autoridade Tributária e à Segurança Social).
No entanto, Vânia Couto registou na 2ª conservatória predial de Braga, em junho de 2018, um apartamento adquirido à Vaguinfus. Foi José da Silva Pinto que, na qualidade de administrador único da empresa, esteve num cartório de Braga a formalizar o contrato de compra e venda do imóvel. Segundo a escritura pública a que a SÁBADO acedeu, o negócio formal com Vânia Couto fez-se por 430 mil euros (apartamento e três lugares de estacionamento). Nos documentos ficou registado que o imóvel se destinava a habitação própria permanente e que o pagamento seria feito com uma entrada de 50 mil euros a pagar até oito dias após a data da escritura e o remanescente em 12 prestações mensais após 15 de julho de 2018. Cada uma destas prestações seria de €33.500, com exceção da última, ligeiramente inferior: €31.500. Se tudo tiver corrido como o estipulado, a Vaguinfus recebeu todo o dinheiro em julho de 2019. W