Mafiosos apanhados pelas redes sociais
Ciccio estava no hospital em Lisboa, Giovanni e Antonino viviam no Bombarral, Francesco escondia-se em Portimão. Foram todos apanhados pela Polícia Judiciária.
Éo mais recente caso de um mafioso italiano perseguido pelas autoridades e apanhado em Portugal. A 29 de março, Francesco Pelle – nome de guerra Ciccio Paquistanês – foi detido pela Unidade Nacional de Contraterrorismo da Polícia Judiciária. Estava internado no Hospital de São José, em Lisboa, a receber tratamento para a Covid-19. A detenção foi uma operação coordenada com a Interpol, que tinha perdido o rasto deste italiano de 44 anos em 2019. Ciccio estava na lista dos 30 criminosos mais procurados pela polícia italiana desde 2007, apontado como um dos líderes da Ndrangheta, organização criminosa da região da Calábria.
Em 2005, Pelle ficou paraplégico depois de ter sido atingido a tiro na coluna quando segurava o filho, recém-nascido. Prometeu vingança e serviu-a no dia de Natal do ano seguinte, matando a mulher do principal rival. A guerra entre famílias já fez mais de 10 mortos, entre eles seis do clã de Ciccio, assassinados a tiro num ajuste de contas numa pizzaria de Duisburgo, na Alemanha. Esta não é a estreia do mafioso em detenções num hospital. Já em 2008, tinha sido apanhado por agentes da autoridade disfarçados de médicos. Aconteceu no hospital italiano de Pavia, onde Ciccio fazia fisioterapia.
Não é a primeira vez que um mafioso referenciado é apanhado em Portugal. Em 2016, em Portimão, Francesco di Marte foi detido pela PJ. Era procurado pela prática dos crimes de associação criminosa e tráfico de estupefacientes em Itália, mas também carregava a suspeita de triplo homicídio em Génova, no ano de 1994. À época da detenção no Algarve, Francesco tinha 52 anos, vivia escondido há cerca de um ano com a mulher brasileira e apresentou documentação falsa às autoridades portuguesas. Também fazia parte da célebre Ndrangheta.
A aldeia do Carvalhal, no Bombarral, foi cenário de outra captura de um mafioso em fuga. Aconteceu em outubro de 2010, com a operação Máfia do Oeste, desencadeada pela PJ de Leiria após quatro meses de investigação. Foram detidas sete pessoas entre os 25 e os 50 anos, de várias nacionalidades, presumíveis autoras de crimes de associa
ROCCO MORABITO ESCAPOU DA PRISÃO PELO TELHADO. E ASSALTOU UMA CASA DURANTE A FUGA
ção criminosa, branqueamento de capitais e burla qualificada. Entre elas, estava Giovanni Lore, italiano com um mandado de detenção europeu pendente. Acusação: ligações à máfia, desta vez siciliana. A operação fez eco em Itália, mas também em Espanha. É que Lore tinha, alegadamente, negócios de pescado e marisco em Vigo, na Galiza. E estaria acompanhado por mais três nacionais transalpinos – Vicente, Daniel Camarata e Antonino Pepe. O grupo era suspeito de tráfico de droga e armas em grande escala e extorsão. Deram nas vistas pelo estilo de vida requintado que levavam em Espanha, mas também em Portugal, nomeadamente na vivenda que alugaram na pequena freguesia do Bombarral.
Portugal não é o único destino onde os mafiosos italianos se escondem. No fim de março de 2021, a notícia da detenção de Marc Feren Claudi Biart na República Dominicana, em fuga desde 2014, marcou pelo insólito. O homem de 53 anos, procurado por tráfico de cocaína para os Países Baixos, foi apanhado graças ao YouTube. Marc Biart é um apaixonado pela gastronomia e partilhava diversas receitas, sempre com o cuidado de tapar a cara, mas acabou por ser descoberto pelas tatuagens.
Em 2016, outra captura famosa, mas no Uruguai. Rocco Morabito
A MÁFIA DO OESTE TINHA LIGAÇÕES À GALIZA E AO NEGÓCIO DA PESCA E DO MARISCO
andava a monte há 23 anos, suspeito de associação criminosa e tráfico de droga entre a América do Sul e a Europa. Tinha 50 anos e foi detido na zona turística de Punta del Este, no Uruguai. Fazia-se passar por Francisco Capelleto, brasileiro, profissional da compra e venda de empresas e da indústria da soja. Acabou preso quando foi inscrever a filha numa escola local com o verdadeiro nome de família – Morabito. Ficou dois anos a aguardar extradição para Itália, onde iria cumprir uma pena de 30 anos de prisão, mas evadiu-se antes, com três outros reclusos.
Tramado pela roupa lavada
Em novembro de 2007, depois de 25 anos de fuga à polícia italiana, Salvatore Lo Piccolo, chefe histórico da Cosa Nostra, com 79 anos, foi preso na companhia do filho, Sandro, também ele procurado pelas autoridades. Salvatore foi acusado de homicídio e associação mafiosa, tendo sido condenado a prisão perpétua. Tinha um cadastro onde também constavam tráfico de cocaína, compra de terrenos, extorsão e relações privilegiadas com outro poderoso da região – Bernardo Provenzano, o Fantasma de Corleone, que andou 42 anos fugido à justiça. Foi apanhado em 2006, escondido numa fazenda quando recebia um pacote de roupa lavada enviado pela mulher. Rendeu-se sem oferecer resistência, admitindo ser ele o homem mais procurado de Itália. Dirigia a Cosa Nostra desde 1993 e fora já condenado (à revelia) a seis penas de prisão perpétua por diversos crimes, como assassinatos. W