Napalm (3.ª e última parte): os relatórios vindos do terreno
Os comandantes militares em Angola, Moçambique e na Guiné enviaram por escrito o inventário das bombas incendiárias usadas em cada um dos cenários
É num contexto de progressivo isolamento internacional do Estado português, e por certo em preparação da resposta a dar às Nações Unidas, que, em 29/12/1972, a DG dos Negócios Políticos do MNE dirigiu um ofício ao gabinete do ministro da Defesa Nacional, contendo a documentação da ONU e o texto do relatório destinado a “informar indivíduos e governos acerca dos efeitos do napalm e outras armas incendiárias e de outros aspetos dos seus possíveis usos”. Nada mais se afirmava neste ofício do MNE, recebido a 8 de janeiro de 1973 e distribuído ao Secretariado-Geral da Defesa Nacional (SGDN).
Dois meses depois, a 8 de março de 1973, um ofício classificado de “Muito Secreto” e da autoria de Francisco da Costa Gomes (ainda que não assinado), dirigido aos comandantes-chefes das Forças Armadas da Guiné, de Angola e de Moçambique, é particularmente ilustrativo. Sob a epígrafe “Napalm e Outras Armas Incendiárias”, nesse ofício a Direção-Geral dos Negócios Políticos do Ministério dos Negócios Estrangeiros solicitava ao SGDN que a habilitasse, “com os elementos que tiver por mais convenientes, para poder elaborar os comentários que [o MNE] terá de apresentar [à ONU]”. E acrescentava-se: “Deverá esse comando-chefe informar se nesse TO [teatro de operações]: a) São empregues napalm ou quaisquer outras armas incendiárias; b) Em caso afirmativo, quais os tipos e circunstâncias em que são utilizadas.”
O comandante-chefe das Forças Armadas de Moçambique, Kaúlza de Arriaga, em 4 de abril de 1973, informou que, desde 1968 até fins de fevereiro de 1973, tinham sido lançados por meios aéreos na 3ª Região Aérea bombas de napalm de 80 kg/100 litros e de 300 kg/350 litros e granadas INC. M/64 (as quais, advertia-se, poderiam ser lançadas por meios terrestres e aéreos).
Os valores totais apontavam para 2.840 bombas de 80 kg, 820 bombas de 300 kg e 1.742 granadas INC. M/64. Estas últimas só começaram a ser usadas em 1970, com valores que registam uma evolução do seguinte tipo: 892 bombas em 1970, 280 bombas em 1971 e 480 bombas em 1972. Este ano regista um acréscimo muito significativo do uso de armamento desta natureza, porquanto também quanto a bombas a evolução vai nesse sentido. Assim, há um uso intenso de bombas de 80 kg no período inicial (889 em 1968 e 764 em 1969), assiste-se a um decréscimo muito sensível no período 1970-1971 (com 290 e 357 bombas, respetivamente), seguindo-se um aumento em 1972: 514 bombas. Quanto às bombas de maior potência (300
“AS REFE-RIDAS MUNIÇÕES TÊM SIDO UTILIZADAS CONTRA BASES E ACAMPAMENTOS DE GUERRILHEIROS”, RELATAVA KAÚLZA DE ARRIAGA SOBRE MOÇAMBIQUE
SPÍNOLA SOBRE O NAPALM: “AS VANTAGENS DE NATUREZA OPERACIONAL SUPERAM LARGAMENTE OS EVENTUAIS INCONVENIENTES DE ORDEM POLÍTICA”
O COMANDANTE NA GUINÉ DESCREVIA O USO DE NAPALM: “É DE GRANDE EFEITO PSICOLÓGICO; A TÉCNICA DE LARGADA É FÁCIL E A PRECISÃO É BOA; É DE UTILIZAÇÃO ECONÓMICA”
kg), a evolução é similar: 126 bombas em 1968, 100 em 1969, nenhuma em 1970, 312 em 1971 e 282 em 1972.
O relatório, sucinto, terminava dizendo: “As referidas munições têm sido utilizadas contra bases e acampamentos de guerrilheiros.”
De Angola, tardavam a reagir. O SGDN envia, em 23 de abril de 1973, uma mensagem solicitando uma resposta, que será emitida dois dias depois – precisamente um ano antes da revolução de 25 de Abril de 1974. O relatório enviado a Lisboa, assinado pelo general Joaquim da Luz Cunha, não especifica o volume de armamento utilizado ao longo dos anos, limitando-se a afirmar:
“1. Tem sido feito uso muito restrito de NAPALM, na medida em que este tipo de munição é muito pouco eficaz contra os objetos existentes no TO de ANGOLA.
2. Por se tratar do único tipo de bombas cujo lançamento não tem limitações de caráter meteorológico, o seu emprego tem sido praticamente reservado às situações em que, por carência de ‘tetos’, se torna proibitivo o uso de outras bombas.”
O juízo de Spínola
h Da Guiné, António de Spínola respondia, em 17 de março de 1973:
“1. No TO da GUINÉ é utilizado armamento aéreo com NAPALM e fósforo dos seguintes tipos:
– Bomba incendiária 300 kg/350 L – Bomba incendiária 80 kg/100 L – Granada incendiária M/64
2. Este armamento é utilizado pela Força Aérea, em especial durante a época seca: com vista à destruição pelo fogo de acampamentos camuflados, In ou suspeitos; contra locais ocupados ou de presença provável de forças In.
Em qualquer dos casos, procede-se sempre ao estudo e referenciação dos prováveis objetivos, a fim de se evitar na medida do possível que as populações sejam afetadas pelo emprego deste armamento aéreo.
3. A título complementar, esclarece-se que o citado armamento tem as seguintes vantagens operacionais: durante a época seca é o armamento mais eficiente para a destruição de acampamentos; atua contra pessoal abrigado em valas a descoberto, o que não acontece com as bombas explosivas; é de grande efeito psicológico; a técnica de largada é fácil e a precisão é boa; é de utilização económica.
4. O consumo médio anual no TO da GUINÉ é o seguinte:
Bombas incendiárias 300 kg/350L………. 501
Bombas incendiárias 80 kg/100L ………… 864
Granadas incendiárias
M/64 ……………… 3.280
5. Julga-se que as vantagens de natureza operacional superam largamente os eventuais inconvenientes de ordem política.”
Esta última frase, subscrita por António de Spínola, é particularmente elucidativa, já que envolve um juízo – político – sobre o uso do napalm: “Julga-se que as vantagens de natureza operacional superam largamente os eventuais inconvenientes de ordem política.”
Como se vê, admitindo que a “média anual” a que se refere Spínola abrange o período 1968-1972, a Guiné parece ter sido o teatro de operações em que o napalm foi utilizado com mais intensidade.
Comparando com Moçambique, aqui foi usada uma média anual de 164 bombas de 300 kg entre 1968 e 1972, sendo essa média de 501 bombas na Guiné. Quanto a bombas de 80 kg, a média foi de 864 na Guiné e 563 em Moçambique. Quanto a granadas incendiárias M/64, a média é de 152 em Moçambique e 3.280 na Guiné, uma diferença de grandes proporções. Note-se que, em Moçambique, não foram usadas granadas incendiárias em 1968 e 1969 (porventura, por não estarem disponíveis), e não foram usadas bom- Q
Q bas de 300 kg no ano de 1970.
O relatório de Ferreira da Cunha procede a uma contabilização do consumo médio mensal de bombas incendiárias, de 1968 até finais de fevereiro de 1973. As diferenças são significativas: 42 bombas de 300 kg na Guiné para 14 em Moçambique; 72 bombas de 100 kg na Guiné para 47 em Moçambique; e, enfim, 273 granadas incendiárias M/64 na Guiné para 29 em Moçambique. É nestas últimas que a disparidade se torna mais evidente: 273 granadas incendiárias/mês na Guiné para 29 em Moçambique, o que, em termos de média anual, dá valores de 3.280 (Guiné) e 152 (Moçambique).
Do ponto de vista de evolução temporal só dispomos de números discriminados para o território de Moçambique, os quais apontam para um uso intenso de bombas de 80 kg em 1968 e 1969, a que se segue uma quebra significativa em 1970, tendo-se registado um aumento em 1971 e, em especial, em 1972 (ainda que sem regresso aos valores de 1968 e 1969). Já quanto a bombas de 300 kg, há uma evolução sensível tendente a incrementar o seu uso: 126 bombas em 1968,100 em 1969 e 312 em 1971 e 282 em 1972. Quanto a granadas incendiárias, há um uso muito intenso em 1970 (982 granadas), a que se segue uma quebra muito significativa em 1971 (280 granadas) e um aumento em 1972, com 480 granadas.
Com base nos elementos fornecidos pelos comandantes-chefes de Angola, Moçambique e da Guiné, o tenente-coronel José Luís Ferreira da Cunha elaborou no SGDN, em 9 de maio de 1973, um relatório de nove páginas, no qual – e o ponto é de extrema relevância – Francisco da Costa Gomes exarou o seguinte despacho, datado de 18 de abril de 1973: “Concordo. Transfira-se para a 2ª Rep., digo 2ª Direção.”
E, efetivamente, a 2ª Direção do SGDN envia, com data de 26 de maio de 1973, o relatório final ao diretor-geral dos Negócios Políticos do Ministério dos Negócios Estrangeiros.
Nesse documento, procede-se a uma defesa do uso de napalm, considerando-se que a tentativa de proibição dessas armas se inscrevia numa estratégia de luta contra o Ocidente (“não é difícil concluir-se que a proibição ou estigmatização do napalm e outros meios incendiários é importante na luta contra o Ocidente”). Sintomaticamente, impugnava-se a imparcialidade do grupo de peritos designados pela ONU: “Para quem, ingenuamente, tenha dúvidas da conclusão (6) a origem dos membros do ‘EXPERT GROUP’ parece esclarecedora: Nigéria, Roménia, Checoslováquia, Suécia, Rússia, Peru e México.” Falava-se ainda de uma “campanha da ONU contra os meios incendiários” e dizia-se mesmo que, “em guerra, todas as armas são para matar e ferir e, em relação às vítimas, pouco interessa discutir o nível de crueldade da arma que as atingiu”. Sustentava-se, assim, que, mais do que proibir o uso destas armas, se deveria discipliná-lo, com o seguinte argumento: “Utilizar napalm ou uma arma nuclear tática sobre um posto militar parece mais tolerável do que apunhalar ou fuzilar homens, mulheres ou crianças não empenhadas na luta, do que colocar uma bomba, uma mina ou uma armadilha ou qualquer arma capaz de criar vítimas indiscriminadas.”
De seguida, Ferreira da Cunha analisa a utilização de napalm nos três teatros de guerra, notando-se discrepâncias relativamente às informações veiculadas pelos comandantes-chefes. Assim, por exemplo:
– O relatório do SGDN afirma que em Angola existia uma “utilização interdita do napalm, na medida em que é pouco eficaz…”. Ora, a informação de Joaquim da Luz da Cunha não alude a qualquer interdição, mas tão-só a um uso “muito restrito”, ditado por (in)eficácia operacional;
– O relatório do SGDN sustenta que, na Guiné, havia “ordens rigorosas para a redução ao mínimo” da utilização de napalm. Ora, a informação de António de Spínola não refere a existência de quaisquer instruções desse tipo; o que se afirma, isso sim, é que a utilização era precedida do “estudo e referenciação dos prováveis objetivos”, com vista a minimizar, “na medida do possível”, danos colaterais sobre as populações;
– O relatório do SGDN sustenta que em Moçambique se procedia a uma “utilização muito parcimoniosa em condições idênticas ao TO de Angola”. Ora, a referência a uma uti
EM MÉDIA, FORAM USADAS 3.280 GRANADAS INCENDIÁRIAS POR ANO NA GUINÉ E 152 EM MOÇAMBIQUE
COSTA GOMES EXAROU COM “CON-CORDO” O RELATÓRIO FERREIRA DA CUNHA SOBRE O USO DE NAPALM NA GUERRA COLONIAL 56
O USO DE NAPALM PELA FORÇA AÉREA ERA OBJETO DE ESTRITA DISCIPLINA E SÓ COM AUTORIZAÇÃO DO CHEFE DE ESTADO-MAIOR
COSTA GOMES ACOMPANHOU DE MUITO PERTO A QUESTÃO DO USO DE NAPALM. MAS, A SEGUIR AO 25 DE ABRIL, AFIRMOU DESCONHECÊ-LO
lização parcimoniosa de napalm
não consta da informação transmitida por Kaúlza de Arriaga. O que se afirma, tão-só, é que “as referidas munições têm sido utilizadas contra bases e acampamentos de guerrilheiros”. Muito menos se poderia dizer que as condições de utilização de napalm eram idênticas em Angola e Moçambique. De facto, enquanto Luz Cunha falava de um “uso muito restrito” de napalm,
Kaúlza de Arriaga não emite qualquer apreciação de tipo quantitativo sobre o recurso àquele armamento. Mais: se se afirma que o uso de napalm era “interdito” (sic) em Angola não se poderia dizer, depois, que idêntica regra vigorava em Moçambique, tanto mais que a seguir se apresentam as estatísticas das bombas e granadas incendiárias utilizadas neste território: uma média mensal de 14 bombas de 300 kg, 47 de 80 kg e 29 granadas incendiárias M/64.
Trata-se, em todo o caso, de uma argumentação compreensível num contexto em que as Forças Armadas procuravam assegurar o uso de napalm e justificá-lo no plano interno, junto do poder político e de outros departamentos do Estado (v.g., o Ministério dos Negócios Estrangeiros), e, reflexamente, no plano externo. Mais do que isso: o SGDN não nega a existência e utilização de bombas napalm nem sequer escamoteia os números que lhe foram fornecidos pelos comandantes-chefes.
Conclusões e contradições
h O que até agora se sabe, perante a documentação existente, é que:
a) A Força Aérea portuguesa dispunha de armamento napalm em África desde, pelo menos, fevereiro de 1961, ou seja, numa fase anterior ao eclodir dos conflitos ultramarinos;
b) Pelo menos nessa fase, a utilização de napalm por meios aéreos era objeto de uma estrita disciplina, só sendo autorizada mediante intervenção do Chefe do Estado-Maior da Força Aérea; em 1970, o Exército adquiriu armamento de napalm a uma firma portuguesa;
c) É possível aventar a hipótese segundo a qual, com o decorrer do conflito, e até por necessidades de natureza operacional e exigências imediatas de ação/reação, o uso de napalm ter deixado de estar condicionado à autorização do Chefe do Estado-Maior da Força Aérea, tendo sido transferido para os comandantes-chefes;
d) Mesmo que a autorização para o uso de napalm não estivesse dependente dos comandantes-chefes, sendo delegadas em entidades de nível inferior, aqueles possuíam conhecimento de tal uso – pelo menos, tinham possibilidade de a posteriori determinar as condições e até as quantidades em que o napalm era utilizado nos territórios sob seu comando direto;
e) Assim, Kaúlza de Arriaga (Moçambique), Joaquim da Luz Cunha (Angola) e António de Spínola (Guiné) subscreveram informações que revelam conhecimento da utilização de napalm nos territórios sob seu comando;
f) Por sua vez, Francisco da Costa Gomes acompanhou de muito perto a questão do uso de napalm. É ele que, em março de 1973, determina Q
Q aos diversos comandantes-chefes que o informem sobre o uso desse armamento; é ele que exara um despacho de concordância na informação de caráter geral – mas com indicação dos números exatos de armamento utilizado – elaborada por Ferreira da Cunha; é ele, enfim, que, em maio de 1974, manifesta concordância com o plano, apresentado por Carlos Fabião, para transferir para Cabo Verde parte substancial do arsenal de napalm existente na Guiné;
g) O conhecimento sobre o uso deste tipo de armas é extensível, naturalmente, ao secretário adjunto da Defesa Nacional, general José Augusto da Costa Almeida, ao tenente-coronel José Luís Ferreira da Cunha e, enfim, aos diplomatas que, no Ministério dos Negócios Estrangeiros, receberam e tiveram de gerir este processo.
Estas questões adquirem relevância porquanto o uso de napalm por parte das Forças Armadas portuguesas na guerra colonial suscitou controvérsia após o 25 de Abril de 1974. Entrevistado por Manuela Cruzeiro, Costa Gomes afirmou desconhecer o uso de napalm na Guiné (“na Guiné, não sei”, disse). Ora, Costa Gomes teve conhecimento da utilização destas armas não só antes como depois do 25 de Abril: antes, ao determinar a Spínola (e aos outros comandantes-chefes, de Angola e de Moçambique) que o informasse sobre as condições em que era utilizado o napalm, ao receber o relatório de Spínola, ao exarar um despacho de concordância com a informação de Ferreira da Cunha, etc.; e, depois do 25 de Abril, ao concordar com o plano de Carlos Fabião para transferir para Cabo Verde o arsenal existente na Guiné.
Quanto a António de Spínola, numa entrevista concedida a Peter Hannes Lehman, da revista alemã Stern, reconheceu o uso de armas químicas na Guiné, “para limpar o mato de ambos os lados das estradas, para evitar emboscadas. Ninguém podia ou iria indicar qual o seu país de origem”. Simplesmente, o relatório que Spínola envia a Lisboa, com data de 17 de março de 1973, revela um uso muito mais extenso e com objetivos muito mais amplos do que o da limpeza das matas para evitar emboscadas. De facto, o napalm era usado, no dizer do próprio Spínola, “com vista à destruição pelo fogo de acampamentos camuflados, In ou suspeitos” e, por outro lado, “contra locais ocupados ou de presença provável de forças In”.
António de Spínola mostra-se, aliás, um ardente defensor do uso de napalm, enaltecendo as suas vantagens operacionais: “Durante a época seca é o armamento mais eficiente para a destruição de acampamentos”, “atua contra pessoal abrigado em valas a descoberto, o que não acontece com as bombas explosivas”, “é de grande efeito psicológico”, “a técnica de largada é fácil e a precisão é boa”, “é de utilização económica”. De todos os comandantes-chefes, Spínola é, aliás, o que mais abertamente defende a utilização de napalm, concluindo o seu relatório dizendo: “Julga-se que as vantagens de natureza operacional superam largamente os eventuais inconvenientes de ordem política.”
É difícil apurar o que o poder político efetivamente sabia de tudo isto. Em certos casos, parecia saber muito pouco, quase nada, sendo mantido na completa ignorância do que sucedia no terreno.
Numa reportagem sobre o uso de napalm saída em 1994 no jornal Expresso, o jornalista Frederico Carvalho publicou um depoimento de Baltazar Rebelo de Sousa, antigo ministro do Ultramar de Marcello Caetano, que recorda uma viagem a Moçambique: “Em Tete, houve chefes militares que me pediram autorização para bombardear, com napalm, uma zona onde estava um comando terrorista a metralhar. Acharam que era a única solução. Recusei-me a isso. Disse-lhes que atacassem o posto a pé.”
Ora, a documentação publicada demonstra uma utilização corrente de napalm em Moçambique, com uma média mensal de lançamento de 14 bombas de 300 kg e de 47 bombas de 80 kg (a que acresciam 29 granadas incendiárias M/64).
O papel do poder político
h No terreno das hipóteses, o que podemos avançar é que, no início da guerra, a questão do uso de napalm e outras armas congéneres pode ter ficado circunscrita ao presidente do Conselho, ao titular da pasta da Defesa e às chefias militares. A partir de finais da década de 1960, coincidindo com a ascensão de Marcello Caetano ao poder, a intervenção cada vez mais incisiva das Nações Unidas sobre a matéria, ora motivada pela guerra do Vietname, ora pelo isolamento crescente de Portugal na cena internacional, implicou que outras instâncias, com destaque para os Negócios Estrangeiros, passassem a estar envolvidas neste dossiê escaldante, que continuaria a fumegar – e a queimar – mesmo após o 25 de Abril.
Em maio de 1974, Costa Gomes autoriza a transferência para Cabo Verde do napalm existente na Guiné. Se por lá ficou ou se veio para Portugal, é coisa que se ignora. Sabe-se apenas que, muitos anos depois, o Zé da Várzea comprou em Lisboa vários invólucros de bombas e levou-as para as extremas da sua propriedade. Talvez ainda por lá estejam, em terras de Santa Comba. W
É DIFÍCIL APURAR O QUE O PODER POLÍTICO EFETIVAMENTE SABIA DE TUDO ISTO
BALTAZAR REBELO DE SOUSA CONTOU QUE LHE PEDIRAM PARA BOMBARDEAR UM ACAMPAMENTO