SÁBADO

Fingir orgasmos

- Jornalista Pedro Marta Santos Texto escrito segundo o anterior acordo ortográfic­o

COMO DIZ NICK CARRAWAY em O Grande Gatsby de F. Scott Fitzgerald, o Verão é especial porque todos os seus sinais transmitem a ideia de que a vida pode começar de novo. Em When Harry Met Sally – Um Amor Inevitável, estreado a 17 de Julho de 1989, Harry Burns (Billy Crystal) e Sally Albright (Meg Ryan) estão ambos a começar de novo após relacionam­entos longos que deram para o torto. O filme é ingrato porque acaba bem, o que o classifica como maldito aos olhos cínicos do século XXI, e porque integra a categoria das comédias românticas, um dos mais detestados dos géneros cinematogr­áficos. Há muita gente que jura jamais o ter visto, embora reconheça quase todas as sequências (os homens têm mais vergonha de o admitir). Em Nora Ephron: a Biography, lançado a 7 de Junho, Kristin Marguerite Doidge desvenda a génese do filme, incluído a cena do falso orgasmo de Sally na Katz’s Delicatess­en. Nora, a guionista, respirava tanto Manhattan como Woody Allen e tinha um humor cáustico próximo do de Dorothy Parker. O projeto formou-se ao longo de vários jantares de Nora com o director, Rob Reiner (Conta Comigo) a partir de Outubro de 1984, e a mania irritante de Sally pedir à parte os molhos e acompanham­entos vem dela – dois anos depois do êxito do filme, uma hospedeira de bordo, ao vê-la pedir “o pão ligeiramen­te queimado e a maionese à parte”, perguntou-lhe “a senhora já viu When Harry Met Sally? Mas nada surpreende­u mais Rob do que a sentença à mesa de um encontro de trabalho: “todas as mulheres fingem orgasmos”. “Não comigo!”, proclamou Rob (quem nunca?). Ela reiterou, Rob pediu para que as funcionári­as do estúdio que encontrou entrassem na sala: uma a uma, todas admitiram já o ter feito.

Rob decidiu que a cena deveria passar-se num local de embaraço público como um restaurant­e. Ao fim de vários takes, Billy Crystal sugeriu que uma comensal da mesa ao lado (interpreta­da pela mãe de Rob, Estelle Reiner) deveria exclamar como punchline a uma empregada: “Traga-me o que ela está a comer”. Assim se selou um one-liner antológico, digno de Billy Wilder. Nos testes antes da estreia, as mulheres gargalhara­m altíssimo. De novo, os homens ficaram silencioso­s. Uma das mulheres a rir-se, agora numa première de gala em Londres, foi a princesa Diana. Sentada ao lado de Billy Crystal, sussurrou-lhe que “não me rio mais alto porque estão todos a olhar para mim”. Mais tarde, pediu que a longa-metragem fosse projetada em Buckingham para que ela e as amigas se pudessem divertir à vontade. É a força imortal dos orgasmos falsos. ●

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