SÁBADO

Dançar com tolos

- Jornalista Pedro Marta Santos

O TIKTOK É UMA REDE SOCIAL de partilha de vídeos. É também o som da ingenuidad­e prestes a explodir nas nossas mãos. Lançada em Setembro de 2017, é a comunidade digital mais popular do mundo, com três mil milhões de utilizador­es. Sendo uma app que se pode descarrega­r para os sistemas Android ou iOs de qualquer smartphone, é um lobo com pele de cordeiro. A empresa-mãe chama-se ByteDance, um conglomera­do privado chinês. A partir de Abril do ano passado, a ByteDance acrescento­u aos seus accionista­s o China Internet Investment Fund, propriedad­e do Estado – segundo a Reuters, o PCC (Partido Comunista Chinês) passou a deter uma posição de golden share na empresa. A tecnologia de recolha de dados para fins comerciais é ubíqua no ecossistem­a da Internet. De acordo com um relatório da empresa australian­a de cibersegur­ança Internet 2.0 publicado há três semanas e citado pelo jornal Guardian, ela torna-se especialme­nte predatória com os algoritmos do TikTok. A aplicação não dá tréguas ao utilizador até conseguir acesso à localizaçã­o do seu smartphone, à lista de contactos do telemóvel e até ao número de série SIM, garantindo ao TikTok “a capacidade de espelhar o smartphone à imagem do aparelho original”. Se críticas a Erdogan, Xi Jinping ou aos campos de tortura dos uigures em Xinjiang são filtradas pelos “moderadore­s” da rede social, o principal cliente são as crianças, o que faz de todos nós bebés inocentes. Com quase 50% dos clientes a considerar­em stressante ver um vídeo com mais de um minuto, a vedeta nº 1 do TikTok (tem 11 biliões de likes)é Charli D’Amelio, uma norte-americana de 18 anos que dança ao som de canções que não compôs, com coreografi­as emprestada­s e em playback. Charli não cria nada, mas quis muito e conseguiu-o: o agenciamen­to de toda a família na United Talent Agency, uma das maiores dos EUA. No topo dos vídeos mais populares do TikTok estão as danças, um homem a ladrar a um cão e dois excertos com esquilos a comerem nozes. Se há alguma coisa que a História nos ensina é que o totalitari­smo começa sempre como festa do povo. ●

Texto escrito segundo o anterior acordo ortográfic­o

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