Sobre a luta popular
Nas etapas finais de revisão da Lei de Programação Militar, é preciso informar o povo das necessidades e dramas nesta área.
A defesa da soberania (a luta popular) tem componentes políticos civis, mas não pode passar sem a peça essencial, as forças armadas, sobretudo no que toca a equipamento.
Em tempo de guerra não se limpam armas, mesmo que elas existam. E com novo material colocam-se os habituais problemas “invisíveis”: adaptação, treino e qualidade do pessoal.
Olaf Scholz declarou a necessidade de defesa aérea das cidades europeias, onde se concentram mais civis. No nosso caso, a capacidade terra-ar moderna é exígua ou nula. Faltam completamente sistemas de curto, médio e longo alcance. Existem só os Stinger (versões desatualizadas) de curtíssimo raio de ação, dado que os Chaparral estão há muito obsoletos, e as peças antiaéreas são um último recurso. Outros países, a começar pela Espanha, adaptaram-se rapidamente às novas realidades, sobretudo na proteção contra avião, helicóptero, míssil e drone. Portugal compensa esta lacuna com os F-16 armados de mísseis AMRAAM, que podem ter eficácia até 170 km, na versão D, e como recurso frágil os Sea Sparrow da Marinha. Esta área de base terrestre é urgente, e só estão previstas entregas de novos sistemas em 2024.
O problema das reservas de paz e guerra é também dramático. Falamos de combustível, munições, armas, peças, veículos e equipamentos, sem os quais não há operações sustentadas, sobretudo se precisarmos de, mesmo temporariamente, lutar
sozinhos, ou ao lado de outros com recursos contados.
Portugal é sempre obviamente declarado como nação marítima, com larga zona de busca e salvamento, necessidade de proteger os recursos da ZEE, as duas costas e as aproximações a elas. Mas há hoje dificuldades em colocar na prontidão permanente pelo menos seis ou sete meios navais combatentes, sejam submarinos, fragatas ou NPOs convenientemente militarizados.
A blindagem adicional e armas com sistemas de controlo remoto são neHá cessidades absolutas das viaturas Pandur, que transportam as nossas forças em operações. Apesar de planeados, os programas avançam lentamente, estão incompletos ou parados.
A capacidade antissubmarina, sobretudo nos modernizados helicópteros da Marinha, precisa de novos sonares. Os meios da FAP, através dos P-3 CUP, ajudam, mas a Armada tem urgentemente de ser apoiada, dado que a ameaça é maior.
A atribuição de blindados ao corpo de fuzileiros, tradicionalmente um dos mais numerosos e competentes da Europa, nunca se realizou. Na Força Aérea, os helicópteros de busca e salvamento em combate existem, mas não estão equipados para uma das missões mais necessárias e arriscadas do catálogo.
A nossa contribuição para a NATO e a capacidade expedicionária são limitadíssimas. Na cooperação militar com a CPLP (ex-CTM, agora CDD) há formas de progredir e aproveitar sinergias lusófonas, mas necessitam da concretização rápida das ideias operacionais. Por fim, quadros orgânicos: o fator humano, quantitativo, das unidades. Uma coisa é o prescrito, outra é o existente. E o existente é, em muitos casos, catastrófico.
Na parte positiva, temos a reintrodução do Curso de Operações Irregulares no CTOE de Lamego, que enquadra as populações na resistência à invasão, sabotagem, infiltração e outros riscos. Também a integração das novas armas ligeiras tem corrido bem, face aos recursos disponíveis, o que altera substancialmente a capacidade do combatente individual. E se a capacidade antidrone não existe praticamente, avançamos bastante na utilização de UAV de campo de batalha, e ainda nalguns domínios da guerra eletrónica e cibersegurança.
Progredimos também na questão da unidade de comando e operações conjuntas, que permitam acabar com redundâncias e usar melhor os meios escassos, humanos e materiais.
Por outras palavras: estamos mal. A luta popular não é possível sem instrumentos. ●