NO PAÍS EMERSO
Nas eleições legislativas de janeiro de 2022 foram eleitas 85 mulheres (37%) – menos duas do que nas legislativas de 2019, em que também não se cumpriu o mínimo de 40% de mulheres no parlamento. Nas Assembleias regionais – Madeira (2019) e Açores (2020) – a eleição de mulheres deputadas não chegou, sequer, a 30%
Nada sobre nós, sem nós
ANDRÉ VENTURA, Rui Rocha, Luís Montenegro, Pedro Nuno Santos, Rui Tavares, Mariana Mortágua e Paulo Raimundo. As mulheres representam (mais de) metade da população portuguesa, mas apenas 1/7 dos líderes dos partidos políticos com representação parlamentar que vão a eleições em março de 2024. Não há nada que justifique ou legitime esta sub-representação.
A Lei da Paridade, alterada pela última vez em 2019, definiu uma quota mínima de 440% de mulheres e homens nnas listas para a Assembleia dde República, para o Parlammento Europeu e para as AAutarquias Locais.
No entanto, nas últimas eeleições legislativas de janneiro de 2022, foram eleitas
885 mulheres (37%) – menos dduas mulheres do que nas leggislativas de 2019, em que ttambém não se cumpriu o mmínimo de 40% de mullheres no parlamento.
NNas Assembleias regionnais – Madeira (2019) e AAçores (2020) – a eleição dde mulheres deputadas nnão chegou, sequer, a 30%. PPor outras palavras, nem os mínimos cumprimos.
O Parlamento Europeu é o único órgão que salva, minimamente, a honra do convento, com a eleição de 43% de mulheres deputadas em 2019. Com eleições europeias em junho de 2024, é fundamental chegar mais perto da meta da paridade.
A falta de representação das mulheres portuguesas na política nacional e autárquica – onde o cenário é particularmente negro, com apenas 9% de mulheres presidentes de câmaras municipais – revela um atraso preocupante na igualdade de género em Portugal. Especialmente tendo em consideração que segundo dados de 2017, as mulheres portuguesas participam mais em eleições do que os homens, com a taxa de abstenção entre o sexo feminino a situar-se em média nos 23,7% contra os 28% entre o sexo masculino. Ou seja, as mulheres participam mais passivamente – enquanto eleitoras –, mas são a minoria na participação ativa, enquanto titulares de cargos políticos.
A política, enquanto espaço de debate, de tomada de decisões, de exposição pública, não é ainda um espaço natural das mulheres portuguesas. Se não existe um impedimento legal à sua participação, existindo até um incentivo, devemos então deduzir que são as mulheres portuguesas que, por razões inatas, não têm interesse em ser eleitas para órgãos políticos? Nem pensar. Com a crescente qualificação académica das mulheres no último século, está demonstrado que a tendência é as mulheres mais qualificadas e competentes irem substituindo os homens menos qualificados e competentes nesses cargos de poder e decisão. Por outras palavras, a seleção não é totalmente orientada por critério objetivos, contando sempre os preconceitos de quem seleciona.
Não podemos ignorar os últimos séculos (se não milénios) de repressão intelectual das mulheres e da sua exclusão de lugares de poder. Essa força de exclusão impediu gerações de mulheres de desenvolverem as competências necessárias para participar politicamente e construiu uma ideia de feminilidade como estando longe desses palcos. Bela, recata e do lar. Nunca assertiva, persistente e cabeça de lista. Um viés tão grande não se muda em poucas décadas. Acredito que muita gente ainda não compreenda, exatamente a utilidade das quotas de género ou sequer o mérito do ideal de atingir a paridade entre homens e mulheres entre os eleitos democraticamente. Se é verdade que não é útil a procura da absoluta paridade de género em todas as atividades humanas, não podemos aplicar a mesma tolerância à política. A política, enquanto atividade em que se discutem as ideias e se tomam as decisões que orientam a nossa vida em sociedade, não pode dispensar a paridade de género: não se pode reger a vida de metade da população sem o seu contributo e participação. ●