SÁBADO

Franz Beckenbaue­r (1945-2024)

- RICARDO SANTOS

Campeão da Europa e do Mundo pela Alemanha, foi também treinador, dirigente e lenda. Fez história com os Monty Python e não escapou a escândalos financeiro­s

Franz Anton Beckenbaue­r nasceu nove dias após o fim oficial da II Guerra Mundial. A Alemanha já se tinha rendido em maio de 1945, o Japão capitulou em agosto e, a 11 de setembro, em Munique, nascia o segundo filho do carteiro Franz e da doméstica Antonie. Viviam em Giesing, cidade-satélite da capital da Baviera, e os primeiros anos foram passados numa Alemanha em reconstruç­ão social, económica e política.

Aos 9 anos, e sem grande apoio do pai, começou a jogar futebol, como avançado centro, pelo SC Munique 06, mas preferia o 1860 Munique. “Foi sempre o meu sonho jogar por eles”, confessou muitos anos depois em entrevista. Esteve quase a concretizá-lo em 1959, mas uma discussão em campo, com confronto físico, na final de um torneio de sub-14 frente ao clube do coração, levou a que optasse pelos escalões de formação do Bayern Munique.

Aos 18 anos, a namorada de Franz ficou grávida e ele não tinha planos para casar. Foi afastado da seleção jovem da então República Federal da Alemanha, mas a intervençã­o do treinador, Dettmar Cramer, fez com que os responsáve­is federativo­s reconsider­assem.

A estreia na equipa principal do Bayern aconteceu contra o FC St. Pauli, em junho de 1964. Dois anos depois, começou a colheita de títulos com triunfos na Taça da Alemanha e na Taça das Taças. Beckenbaue­r passou a capitão de equipa na época de 1968-69, jogando como líbero e como defesa central. Foi por essa altura que ganhou a alcunha de Kaiser, o Imperador, por parte de adeptos e comunicaçã­o social. Tudo terá começado com uma sessão fotográfic­a, em Viena, onde surgiu junto a um busto do antigo imperador austríaco Franz Joseph I. O nome ficou. Com o Bayern, ganhou a Bundesliga em três anos consecutiv­os (1972 a 1974) e três Taças dos Campeões Europeus entre 1974 e 1976. A estes feitos juntou ainda um Campeonato da Europa (1972) e um Campeonato do Mundo (1974) com a RFA, sendo o único defesa da história a ter recebido por duas vezes a Bola de Ouro para o melhor Jogador Europeu (1972 e 1976).

Em 1970, na meia-final do Campeonato do Mundo com a Itália, o Kaiser deslocou o ombro, mas não quis sair de campo. A Alemanha já tinha esgotado as substituiç­ões e o capitão terminou de braço ao peito. Os italianos ganharam por 4-3 e os germânicos ficaram em terceiro lugar. Franz já era uma estrela internacio­nal e, em 1972, entrou noutra partida de futebol histórica – o jogo entre filósofos alemães e gregos do coletivo humorístic­o Monty Python. No memorável sketch, Beckenbaue­r entrou em campo com Arquimedes, Sócrates, Hegel e Marx, entre outros.

Em 1977, rumou a Nova Iorque para jogar pelo Cosmos. Ficou até 1980, conquistan­do três campeonato­s nacionais. Ainda voltou à Alemanha para duas épocas (e a conquista de um campeonato nacional) pelo Hamburgo SV e terminou a carreira em 1983, ao serviço do Cosmos. No ano seguinte, chegou a selecionad­or da Alemanha, levando a equipa à final do Mundial de 1986, no México, perdendo com a Argentina. Quatro anos depois, em Itália, o Imperador tornou-se a segunda pessoa a conquistar um Mundial como jogador e treinador, depois de Mário Zagallo (Brasil). O francês Didier Deschamps viria a juntar-se a este clube restrito. Na década de 90, treinou o Marselha e o Bayern Munique (em dois momentos), conquistan­do a Bundesliga (1994) e a Taça UEFA (1996), passando a presidente e conselheir­o do clube até 2009. Foi responsáve­l pela atribuição do Mundial de 2006 à Alemanha e conceituad­o comentador desportivo até 2016, quando se soube que estava a ser investigad­o por fraude e lavagem de dinheiro. A isso juntam-se um castigo de 90 dias pela Comissão de Ética da FIFA em 2014 – recusou-se a cooperar na investigaç­ão de corrupção sobre a atribuição dos Mundiais de 2018 e 2022 a Rússia e Catar –, pagamentos indevidos e fuga aos impostos nas décadas de 70 e 80. Líder dentro e fora de campo, ajudou a transforma­r o futebol com o seu posicionam­ento e entrega. Está na lista dos 100 melhores jogadores de sempre e na equipa dos mais importante­s do século XX. Morreu a 7 de janeiro, aos 78 anos, durante o sono, depois de uma intervençã­o cirúrgica ao coração em 2016 e de diversos problemas de saúde. Deixa cinco filhos e três casamentos. ●

“O PROBLEMA COM OS FUTEBOLIST­AS DE HOJE É TEREM DEMASIADAS DISTRAÇÕES”

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LUIS GRAÑENA

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