PORQUEHÁ CADA VEZ MENOS MEL?
Um dos culpados é o clima. A questão nem é a seca, é preciso chover nas alturas certas e haver humidade nas flores para produzirem néctar.
Éum raciocínio fácil de perceber: as abelhas alimentam-se do néctar que existe nas flores. Também recolhem o pólen dessas mesmas flores para polinizar outras e garantir a reprodução das plantas. Mas, se começam a existir menos flores, elas terão menos disponibilidade de alimento e, consequentemente, produzirão menos mel. Na verdade, esta é apenas uma parte do problema. A quebra na produção de mel está a acontecer à escala global e as razões para o declínio só agora começam a conhecer-se. Um estudo recente conduzido pela Pennsylvania State University, e publicado na revista científica Environmental Research, analisou os fatores que afetam o crescimento de flores nas diversas regiões e a correlação com a produção de mel. A investigação, que considerou dados dos últimos 50 anos, encontrou três fatores que explicam, nomeadamente: o uso de herbicidas, a agricultura intensiva e as alterações climáticas (já lá iremos).
O problema não é novo. Gabriela Quinlan, que liderou o estudo, explica que a inspiração para a investigação surgiu ao fim de vários anos a ouvir os desabafos de apicultores em conferências. Todos diziam o mesmo: “Já não se produz mel como antigamente.” A relação entre a produção e as condições climáticas começou a ganhar força ainda nos anos 90. Hoje, a dimensão das quebras não é desprezível. Segundo dados do governo americano, na última década, cada colónia de abelhas tem produzido menos cerca de 226 gramas por ano. Em Portugal, a situação não é melhor: estima-se que o ano passado a diminuição na produção de mel tenha rondado os 60%.
Segundo o estudo americano, as condições climáticas assim como a produtividade dos solos são fatores cruciais para a produção de mel. Avançam mesmo que as regiões, independentemente do clima, conseguem uma maior produção quando os seus solos são férteis. Contudo, a percetível instabilidade climatérica também tem a sua quota-parte de responsabilidade. “A produção está muito dependente do tempo. Não está a ficar só mais quente e húmido, há cada vez mais eventos extremos impossíveis de prever”, diz a responsável do estudo à estação britânica BBC. “Conseguimos gerir a terra em termos da redução de pesticidas, mas a longo prazo teremos de pensar no que poderemos plantar com estas condições climáticas em constante mudança”, acrescenta.
Não sobra pasto para as abelhas
Ao nível nacional, a realidade é um pouco diferente, alerta António Hermenegildo, presidente da Sociedade dos Apicultores de Portugal. A diminuição na produção de mel e do número de colónias de abelhas tem a ver sobretudo com três fatores – e apenas um é coincidente com a realidade americana. O primeiro é a dificuldade de controlo de um parasita chamado Varroa, “que mata enxames e as colónias”, explica o apicultor amador Artur Madeira.
Uma outra razão são os incêndios, e nomeadamente, as estratégias de prevenção que têm sido adotadas. “Exorbitou-se a história da limpeza dos terrenos, fica tudo cortado, não sobra pasto para as abelhas”, diz António Hermenegildo. Por último, as variações climáticas também são apontadas. “É preciso que chova nas alturas certas e as flores têm de ter humidade para produzirem néctar para as abelhas as polinizarem”, diz o responsável.
Para o especialista, a praga da vespa asiática não “interfere propriamente com a produção de mel”, mas com a sobrevivência dos enxames (ver caixa). ●
“EXORBITOU-SE NA LIMPEZA DOS TERRENOS, NÃO SOBRA PASTO PARA AS ABELHAS”, DIZ ANTÓNIO HERMENEGILDO