UMA CURTA À BEIRA DOS ÓSCARES
A portuguesa Um Caroço de Abacate está na shortlist para a nomeação a um Óscar. Antes de serem revelados os nomeados, dia 23, falámos com o realizador.
“DAQUI a uma semana sabemos se temos de comprar bilhetes de avião.” A conversa com Ary Zara, realizador da curta-metragem Um Caroço de Abacate, terminou desta forma. Os bilhetes são para Los Angeles, a razão: filme candidato a nomeação para Óscar de Melhor Curta. Uma brincadeira a propósito de uma resposta anterior, quando lhe perguntámos até que ponto um bom assessor de media e publicidade influen
O reconhecido e premiado ator canadiano Elliot Page contactou o realizador para elogiar o filme português: “Quando recebi o email dele, caiu-me a ficha”, conta o realizador, Ary Zara
cia este caminho, Ary conta que passa muito pela atitude, pelo tom deles e como pensam o futuro: “Quando nós formos nomeados, quando ganharmos o Óscar: é esta mentalidade que nos faz entrar [no jogo] e ter fé.”
O otimismo percebe-se. Um Caroço de Abacate tem vencido prémios e crescido mediaticamente. Conseguiu associar-se ao premiado ator canadiano Elliot Page, produtor-executivo, que viu o filme e mandou uma mensagem de apreço a Ary. Este aproveitou o momento para perguntar se o ator gostaria de se juntar à viagem: “Quando recebi o email dele, que é um sim direto, caiu-me a ficha. Foi uma dupla satisfação, o sim, e perceber que não devo ter medo de pedir ajuda.”
Um Caroço de Abacate apresenta-nos Larissa (Gaya de Medeiros), mulher trans, vista pela primeira vez a descer a Almirante Reis de bicicleta e pouco depois no Conde Redondo a ajudar as mulheres que lá trabalham: “Ela vai lá distribuir preservativos, ver se as irmãs estão bem, se está tudo ok.” Larissa não é uma trabalhadora do sexo e esta cena é um momento para haver uma discussão que Ary quer que exista: “Parece que não existe outra opção para uma mulher trans sem ser trabalhadora do sexo. Este trabalho não deve ser olhado de maneira pejorativa, mas as mulheres trans não devem ser resumidas a pessoas que só têm esse trabalho. As mulheres trans existem num espectro enorme e nem todas são trabalhadoras sexuais.”
A curta acontece à noite, “habituei-me a ver Lisboa à noite e foi confortável para mim ter um trabalho noturno. É como conheço melhor a cidade”. Depois de visitar as irmãs, Larissa entra no carro de um mirone desconhecido, Carlos (Ivo Canelas), e os dois entram num diálogo fluído – e, na generalidade, divertido, graças ao à-vontade de Gaya com a câmara – sobre aquela situação. Ary gosta “de pôr as personagens a falar, é uma coisa que me dá gozo” e é através dessa conversa que o filme expõe e vence, dizemos nós, uma série de preconceitos. Simples e eficaz. Agora é esperar por Hollywood e comprar os bilhetes de avião. ●