SÁBADO

Sandra Milo (1933-2024)

Musa de Fellini, estrela de cinema em Itália, foi alvo de uma histórica partida de mau gosto em direto na televisão e teve uma vida recheada de amores proibidos

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Janeiro de 1990. Sandra Milo está a apresentar o programa de televisão O Amor é uma Coisa Maravilhos­a na estação estatal Rai Due. Um espectador telefona e pergunta-lhe, em direto, o que está ali a fazer, se não sabe que o seu filho, Ciro, deu entrada no hospital de San Giovanni em estado grave, depois de um acidente de automóvel. Sandra entra em choque e abandona o estúdio a chorar, gritando bem alto e diversas vezes o nome do filho. Era partida de mau gosto e ficou para a história da televisão e da cultura popular italiana. O nome Ciro, repetido à exaustão e em agonia, tornou-se motivo de piada e até de campanha publicitár­ia.

Sandra nasceu na Tunísia em 1933, com o nome de Salvatrice Elena Greco. Bem cedo, a sua figura atraiu os olhares masculinos. Em 1948, aos 15 anos, casou com o marquês Cesare Rodighiero, mas a união durou apenas 21 dias. Concentrad­a na representa­ção, aos 22 anos, contraceno­u com Alberto Sordi em Lo Scapolo e, quatro anos depois, foi dirigida por Roberto Rossellini em Il generale Della Rovere. Interpreta­va uma trabalhado­ra do sexo, ao lado de Vittorio De Sica. Deu tanto nas vistas que os convites dos realizador­es não pararam de chegar, mas também o produtor do filme, Moris Ergas, não lhe ficou indiferent­e. Acabaram por casar e ter uma filha, Deborah, o que a levou a fazer uma pausa na carreira.

Antonio Pietrangel­i ainda a recrutou para Adua e le Compagne e Fantasmi a Roma, mas foi em 1962 que tudo mudou. Nesse ano, Federico Fellini iniciou as filmagens daquela que é considerad­a a obra-prima do ator e realizador italiano (viveu entre 1920 e 1993) – o filme

8½ . “Sandrocchi­a”, como Fellini de forma carinhosa a tratava, teve um papel de destaque (Carla, a sensual amante de Guido) no filme que venceu o Óscar para Melhor Filme Estrangeir­o em 1963. Seguiu-se em 1965 Julieta dos Espíritos, que lhe valeu o prémio Nastro d’Argento para Melhor Atriz Secundária.

Sandra Milo retirou-se da representa­ção em 1968, regressand­o apenas em 1979, com personagen­s mais maduras e menos apostadas no aspeto físico. Durante esses anos de pausa, dedicou-se à apresentaç­ão de programas de

DEU TANTO NAS VISTAS QUE OS CONVITES DOS REALIZADOR­ES NÃO PARARAM DE CHEGAR

televisão e à vida de casada, pela segunda vez, com Ottavio de Lollis, de quem teve mais dois filhos, Ciro (o tal) e Azzurra. Terá sido precisamen­te durante o casamento com Ottavio que Sandra se envolveu com o amor da sua vida (palavras da própria): Bettino Craxi, líder do Partido Socialista Italiano. Não foi a única traição registada, já que assumiu também uma relação extraconju­gal durante 17 anos com Federico Fellini.

Nos anos 90, tornou-se uma das apresentad­oras mais reconhecid­as em Itália, liderando projetos como

A Ilha dos Famosos e diversos programas da tarde. Conhecida por ser uma mulher direta e sem filtros, Sandra Milo confessou numa entrevista, em 2007, que tinha ajudado a mãe nos últimos momentos de vida – “As pessoas devem morrer com dignidade.” Sandra Milo, Sandrocchi­a ou simplesmen­te Salvatrice, morreu a 29 de janeiro, na sua casa, em Roma. Estava rodeada pela família e pelos dois cães, Jim e Lady. Tinha 90 anos. ●

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LUIS GRAÑENA

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