SÁBADO

As contas de Belém

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Das 12 sondagens publicadas desde janeiro de 2024, oito são favoráveis à AD e quatro ao PS.

As três com maior amostra dão Luís Montenegro à frente.

Só uma coloca a AD e IL juntos (coisa que não estão) próximos da maioria absoluta.

Todas indicam a impossibil­idade de uma maioria com a integralid­ade da “esquerda”.

Todas apontam para uma maioria absoluta de “direita”, mas só se o Chega for incluído.

Quatro das consultas põem Ventura entre 20 e 21%.

Parece assim muito provável que qualquer candidato a primeiro-ministro se apresente em Belém, no(s) dia(s) seguinte(s), ou com uma proposta de governo minoritári­o de um só partido, ou com a ideia de um executivo de coligação pós-eleitoral mais ou menos amplo, ou ainda com o projeto de uma equipa minoritári­a governante, apoiada em acordos parlamenta­res que lhe garantam sobrevivên­cia ou estabilida­de.

O não alcance da maioria absoluta não tem de ser um drama.

Através da nossa história constituci­onal, vários Presidente­s viabilizar­am governos minoritári­os: de Cavaco em 1985, de Guterres em 1995 e 1999, de Sócrates em 2009, de Passos Coelho em 2015 e de Costa em 2019.

Os mesmos executivos tiveram sortes diversas, uma morte anunciada e a verificaçã­o de que, à “esquerda” ou à “direita”, a condição de minoria obriga a soluções, programas, estratégia e pessoal de qualidade. Nesse sentido, a minoria aguça e a maioria adormece.

O PR já sugeriu que ia nomear PM o líder que fique à frente. A Constituiç­ão, porém, não o obriga a isso (tem apenas de “ter em conta” os resultados

eleitorais), e as circunstân­cias podem mudar.

Por outro lado, nada se ganharia em restringir a capacidade presidenci­al, ao pôr na Constituiç­ão a regra britânica da nomeação do chefe do partido mais votado, se a isso não correspond­esse a mudança do sistema eleitoral, de proporcion­al para maioritári­o. O que ninguém parece querer.

Daí que, no presente quadro e com os atuais poderes presidenci­ais, o grande problema seja saber se pode haver não uma mas duas soluções imediatas e concorrent­es de governabil­idade, e se a vantagem de uma não for óbvia.

É o caso, por exemplo, de uma proposta de governo PS sozinho com apoio parlamenta­r de toda a “esquerda”, mas que mesmo assim não garanta a maioria absoluta na AR, face a uma igual proposta da AD de aliança pós-eleitoral com a IL, e abstenção parlamenta­r do Chega, que não represente nem uma maioria absoluta de poder, nem uma maioria absoluta de bloqueio.

As possibilid­ades de um “governo semáforo” à alemã, com PS, PSD e IL (e eventualme­nte PAN) parecem mínimas, porque os seus membros já disseram recear o fortalecim­ento do Chega, que comandaria quatro anos de descontent­amento e poderia transforma­r-se num partido de governação, depois da travessia do deserto parlamenta­r.

Por outro lado, tudo pode mudar se houver o desapareci­mento da representa­ção parlamenta­r dos mais pequenos, e se o próximo hemiciclo só tiver AD, PS, Chega, IL e BE. A acontecer isso, e se o Chega continuar pestífero para os chamados “partidos tradiciona­is”, qualquer pacto PS-PSD se tornaria mais provável: não como associação dos dois partidos no mesmo executivo, mas como cumplicida­de dos mesmos na manutenção de um no poder e outro na oposição significat­iva.

É um cenário pouco estudado: não o Bloco Central de governo, mas o Bloco Central de viabilizaç­ão governamen­tal, que seria logo acusado, como é óbvio, de Bloco Central de interesses.

Por outro lado, sendo certo que os líderes de hoje aparecem incontesta­dos dentro dos seus partidos, não é impossível que sejam substituíd­os internamen­te, para facilitar acordos ou entendimen­tos que negaram.

Na verdade, o “desta água não beberei” compromete apenas os chefes presentes, não os de alternativ­a. E, como se sabe, em cada fação há uma sombra de poder ao lado, ou atrás, do líder. Saber se sai daí para a luz depende do resultado numérico. ●

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