SÁBADO

ONDE É QUE PERTENCES HOJE?

Onde, a quê e a quem pertencemo­s hoje? Dia 15 de março, no Rivoli, no Porto, Raquel Jorge quer abrir espaço para explorar a questão da pertença, para que também nos passamos encontrar na diferença.

- Por Tiago Neto

a imagem. A imagem que se entrelaça com o som e forma um poema aos olhos, capaz de nos provocar e assim dar início a uma viagem interior. A paisagem de Belonging, trabalho de Raquel André com colaboraçã­o de Bernardo de Almeida, Gisela Casimiro, Francisco Fidalgo, Herlander e Wilma Moutinho, começa como um mapeamento de memórias na busca pela pertença. Recordaçõe­s por vezes frenéticas, sempre comoventes e nítidas.

O espetáculo, que pode ser visto dias 15 e 16 de março no Teatro Municipal do Porto – Campo Alegre, assemelha-se a uma viagem. Dá-nos o privilégio de pertencer a uma catarse coletiva, sobre a qual somos convidados a refletir e, quiçá, da qual acabamos por fazer parte, mesmo que a geografia do que ouvimos do palco nos encaminhe a paragens tão distantes como o México, a Guiné-Bissau, a Alemanha ou o Brasil.

“A ideia era fazer um espetáculo em que iria encontrar pessoas com quem partilho ADN. Entretanto surgiram as perguntas: ‘A quê, a quem, onde é que tu sentes que pertences?’ Comecei a perceber que seria interessan­te complexifi­car estas perguntas e decidi que incluiríam­os pessoas que tivessem experiênci­as de vida diferentes”, diz a performer, criadora artística e colecionad­ora de histórias, que noutros trabalhos já nos levou a refletir sobre temáticas como a intimidade ou a condição de espectador.

Em palco quebra-se o silêncio. Pela frente temos Aliu Baio, natural da Guiné-Bissau, encarregad­o de musicar Belonging por meio da bateria, acelerando e suavizando o desenho sonoro. Aos 9 anos embarcou rumo a Lisboa, trazendo consigo memórias das cores e paisagens africanas, que, mesmo perdendo a visão, manteve vivas nos sonhos. Regressou à casa que o viu nascer, e à família que o viu crescer, por meio da peça que agora o transporta a repensar a sua pertença. “Quando ouves as outras histórias, encontras muitos pontos de ligação”, diz-nos Aliu Baio. “Estando em palco, lido de uma forma muito íntima com cada história que vem, até porque tenho de lhes dar textura e isso requer escutá-las atentament­e, quase fazer parte delas, para as poder respeitar.”

São histórias, as que ouvimos, que exploram a identidade, a genética, a superação e a força, Belonging quer dar-nos a hipótese de ouvir mas também de questionar. Um diagnóstic­o, diz Raquel André, “é sempre um diagnóstic­o quando pões pessoas a falar sobre as suas vidas e dás voz a isso: histórias de pessoas reais, que não estão escritas”. O lugar do outro está mesmo ali, em cima do palco. ●

“É sempre um diagnóstic­o quando pões pessoas a falar sobre as suas vidas e dás voz a isso” diz a encenadora, performer e artista Raquel André

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A peça leva-nos a pensar sobre a mutabilida­de da ideia de pertença, e como esta pode ser ténue
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Aliu Baio, que acompanha toda a peça com música ao vivo, é invisual desde os 9 anos

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