SÁBADO

ANOVIDADED­ASCASA ASIMPRESSA­SEM3D

As paredes fizeram-se em 20 horas, através de uma gigantesca impressora que expeliu uma pasta (depois de seca tornou-se betão). A moradia fica em Vila do Conde.

-

Aalquimia acontece pela mistura de materiais saídos da gigantesca impressora, de cinco toneladas – o equivalent­e em peso a dois SUV e a um carro ligeiro. O engenho de robótica é desmontáve­l, para ser transporta­do num contentor de camião até ao terreno onde vai nascer a casa. No local, lança por um orifício filamentos de uma pasta à base de cimento, agregados de pedra, água, areia e fibras, que depois de seca (entre cinco a oito horas) fica betão. Saem 20 cm de pasta por segundo, numa tira contínua com 5 cm de espessura e 3 cm de altura. Camada após camada, erguem-se as paredes. E ao fim de 20 horas fica feita a casa da tipologia mais corrente: T2 com 88 m2, para um agregado de três a cinco pessoas.

Já existe uma destas dimensões, protótipo, em Vilar de Pinheiro (Vila do Conde), que serve de cartão de visita da nova empresa de construção tecnológic­a do Porto, a Havelar (o nome deriva do verbo inglês “have”, ou seja, “ter”, com o substantiv­o “lar”). O preço rondará os €150.000 + IVA, porque o método de construção é 70% mais rápido e 60% mais automatiza­do do que o convencion­al. Rodrigo Vilas-Boas, sócio fundador da empresa e arquiteto do ateliê OODA, que desenhou a casa, diz à SÁBADO: “Tem conforto térmico e resistênci­a acústica. A caixa de ar das paredes rugosas, de 30 cm, é preenchida com granulado de cortiça que permite um isolamento muito eficaz.”

Para monitoriza­r a performanc­e da casa já impressa, uma equipa da Faculdade de Engenharia da Universida­de do Porto e do Instituto de Construção Sustentáve­l, instalou sete

ESTE MÉTODO DE CONSTRUÇÃO É 70% MAIS RÁPIDO E 60% MAIS AUTOMATIZA­DO DO QUE O CONVENCION­AL

sensores na casa. Recolhendo, assim, dados para melhorar ou manter parâmetros.

Três pessoas para construir

h A falta de mão de obra deixa de ser um problema. No caso da impressão em 3D, só são necessário­s três a cinco profission­ais (arquitetos ou engenheiro­s das áreas de informátic­a, mecânica, robótica e civil), consoante o tipo de casa: um deles trabalha no software, que dita à impressora como expelir a massa de betão das paredes; outro supervisio­na a qualidade da impressão; e o terceiro controla a qualidade do material de construção, calibrando as quantidade­s dos componente­s da mistura. As canalizaçõ­es para a água e eletricida­de são instaladas nos tetos e pavimentos, atravessan­do os ocos das paredes impressas. Mais duas ou três semanas bastam para montar a cozinha, WC pré-fabricadas, e está feito.

Antes de entrar para o mercado, a casa-modelo tem recebido visitas de investidor­es e fornecedor­es de materiais, que ficam “entusiasma­dos”, garante Rodrigo Vilas-Boas. Perspetiva a construção em larga escala, a pensar na classe média, no povoamento de zonas do interior e no tempo. “É necessário atuar de forma urgente,

para solucionar a crise da habitação. O tempo também tem a ver com a longevidad­e e a qualidade das casas que queremos entregar.” Neste capítulo, entra a parte da “democratiz­ação da arquitetur­a”, diz, porque permite personaliz­ar as construçõe­s, distinguin­do-se das casas modulares feitas em série.

Arquitetos conceituad­os como Álvaro Siza Vieira, Manuel Aires Mateus, Glória Cabral, Francis Kére e Kengo Kuma já estão a trabalhar nos projetos, através de parcerias com a empresa (conforme anunciado no site, havelar.com, lançado no passado dia 11). O japonês Kengo Kuma (da Universida­de de Tóquio) propõe o conceito de habitação evolutiva. “É uma comunidade que tem as tipologias normais, de um ou dois quartos, e pode ir crescendo à medida que o tempo passa, ou pode adaptar-se a novas realidades de necessidad­e habitacion­al”, prossegue Rodrigo Vilas-Boas. Por exemplo, ao T2 pode acrescenta­r-se uma divisão através da impressão 3D. Ou fazer-se mais um piso, projeto da própria empresa, porque a estrutura do telhado está pensada para tal (é sobredimen­sionada), se houver necessidad­e de ampliação.

Pontos a melhorar

h Contudo, há pontos que precisam de ser trabalhado­s como a limitação em altura. A impressora permite imprimir até três pisos (nove metros), numa área de 144 m2. Para fazer um edifício será necessária a colaboraçã­o “com as universida­des e com a empresa que fornece a impressora (Cobod), que formam estudantes de robótica, materiais, arquitetur­a, software, etc.”, explica o especialis­ta.

E se ao betão é reconhecid­a a resistênci­a e flexibilid­ade para os arquitetos criarem, por outro lado ainda emite pegada carbónica. Por isso, a empresa tem procurado a receita para o betão com uma pegada carbónica de baixo impacto, através da parceria com as universida­des e a marca Weber Saint-Gobain. Até lá, aposta nos materiais próximos dos locais de construção. “Conseguimo­s encontrar fornecedor­es locais para nos darem materiais para imprimirmo­s”, diz.

Empresa concorrent­e

h Em Torres Vedras, a Litehaus (junção das palavras “leve” e “casa” em alemão) promete construir casas 20% a 30% mais baratas por impressão 3D conjugada com a tecnologia por módulos. As paredes fazem-se por 3D (45 m2 em 15 horas) e o restante por construção modular de fabrico em Braga. De Valência chegam os painéis de parede em cimento. “Em breve começaremo­s a primeira casa e seguiremos o plano anual”, adianta à SÁBADO o empresário Thibault Launay, à frente da empresa.

Planeia fazer 13 casas naquela zona, depois 100 por ano nos arredores de Lisboa. Habitações estas que, segundo ele, cabem na categoria de “luxo acessível”, demorando oito a 15 meses a construir. Começam nos €150.000 e podem ir até 1 milhão. Da coleção de 12 modelos (disponívei­s no site litehaus.co) constam nomes de estrelas como a Vega: um T4 de um piso e linhas direitas. A matéria-prima é cimento com menos emissões de carbono, de forma a não piorar outra crise: a ambiental.

 ?? ?? h
Os espaços estão otimizados e destinam-se a um agregado familiar de três a cinco pessoas
h Os espaços estão otimizados e destinam-se a um agregado familiar de três a cinco pessoas
 ?? ?? h
Criaram-se curvas nas paredes para testar o desempenho e as limitações da impressora 3D
h Criaram-se curvas nas paredes para testar o desempenho e as limitações da impressora 3D
 ?? ??
 ?? ?? j
A casa-protótipo foi desenhada pelo ateliê de arquitetur­a OODA, tem um piso e linhas contemporâ­neas
j A casa-protótipo foi desenhada pelo ateliê de arquitetur­a OODA, tem um piso e linhas contemporâ­neas
 ?? ?? j
A casa tem conforto térmico e resistênci­a acústica, garante Rodrigo Vilas-Boas
j A casa tem conforto térmico e resistênci­a acústica, garante Rodrigo Vilas-Boas

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal