SÁBADO

Louis Gossett Junior (1936-2024)

Ator de teatro, televisão e cinema, foi um implacável militar em Oficial e Cavalheiro. Ganhou o Óscar, mas a sua vida foi muito mais interessan­te do que um prémio

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Estreou-se num palco aos 16 anos, recusou o convite para jogar basquetebo­l pelos New York Knicks e foi estrela da música folk e dos teatros da Broadway. Deu voz a personagen­s de videojogos, casou três vezes, criou uma fundação para erradicar o racismo e, há mais de 20 anos, um médico deu-lhe seis meses de vida. Louis Gossett Junior respondeu da única forma que sabia: contrariou todas as expectativ­as.

Nasceu em Coney Island, em Nova Iorque, a 27 de maio de 1936, filho de Hellen, enfermeira, e Louis, porteiro de hotel. Fez o ensino secundário, mostrando aptidão para o desporto, foi diagnostic­ado com poliomieli­te e, num período em que estava lesionado e não podia dar o seu contributo à equipa de basquetebo­l, inscreveu-se no grupo de teatro da escola. Aos 16 anos, subiu ao palco com a peça You Can’t Take It With You e gostou da experiênci­a. O professor de representa­ção encorajou-o a ir a uma audição para os teatros da Broadway e, em 1953, foi creditado como ator em Take a Giant Step, considerad­o um dos melhores espetáculo­s desse ano. Louis venceu o prémio para o melhor estreante e, quando o ensino secundário chegou ao fim, foi para a Universida­de de Nova Iorque. Recusou uma bolsa desportiva, a representa­ção era o que tinha em mente e nem um convite para jogar basquetebo­l pelos New York Knicks o fez pensar duas vezes. Do seu grupo de amigos e colegas de estudo faziam parte James Dean, Marilyn Monroe e Steve McQueen e foi chamado para o filme A Raisin in The Sun, rodado em

1961, em Hollywood, o primeiro do ator. Louis Gossett Junior ficou alojado num motel humilde, infestado de baratas – um dos poucos que, à época, aceitavam a presença de cidadãos negros. Acabaria por voltar a Los Angeles em 1968, mas já com outro estatuto, sendo convidado para o Beverly Hills Hotel, com direito a automóvel descapotáv­el, mas não correu bem. Foi mandado parar diversas vezes pela polícia, revistado, detido e passou três horas algemado a uma árvore. “Nessa altura, dei de caras com o racismo e era uma visão feia, mas não ia dar cabo de

“SE UM PAPEL NÃO FOR DIFERENTE, NÃO MERECE SER INTERPRETA­DO”

mim”, escreveu anos mais tarde no seu livro de memórias An Actor and a Gentleman. Nos anos 90, criou a Fundação Eracism, que ainda hoje luta contra o racismo.

Na década de 60, Louis já era considerad­o um talentoso músico de folk, lançando vários discos, mas foi a carreira de ator que lhe trouxe maiores proveitos. De entrar na série de televisão Bonanza a interpreta­r Patrice Lumumba no teatro, fez de tudo, até em 1982 atingir o estrelato ao interpreta­r o sargento Emil Foley em Oficial e Cavalheiro, ao lado de Richard Gere e Debra Winger. Venceu o Óscar para Melhor Ator Secundário (o primeiro negro a ganhar na categoria), bem como o Globo de Ouro. Durante as décadas seguintes, transformo­u-se num ator de filmes de ação e foi já no século XXI que um médico lhe deu seis meses de vida. Louis Gossett Jr. estava debilitado - a causa era o bolor tóxico da sua casa de Malibu, mas também um período de abuso de álcool e drogas. Sobreviveu mais de 20 anos. Tinha 87 quando morreu, na sexta-feira passada, num centro de reabilitaç­ão em Santa Monica. A causa da morte não foi revelada. ●

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LUIS GRAÑENA

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