OS RÓTULOS DA COMIDA APOR VEZES ENGANAM
A escala de letras e cores (Nutri-Score) pretende simplificar a leitura dos alimentos embalados, mas há pizzas à frente de iogurtes e azeite. Como se explicam as incoerências?
Já deve ter reparado nas barras com letras que aparecem em alguns alimentos. A Nutri-Score (NS) funciona como uma ferramenta informativa, o bê-á-bá na leitura da composição dos alimentos embalados. Ou seja, simplifica a escolha dos consumidores, através de uma escala de letras (de A a E) e cores (do verde ao vermelho negativo), em complemento aos rótulos dos ingredientes. Implementada em França em 2017, tem tido a adesão de países da Europa, incluindo Portugal (cuja aplicação nos produtos é voluntária).
Contudo, se esta era uma garantia de qualidade nos produtos, como é que umas minipizzas congeladas podem ter nota máxima? Foi nas idas ao supermercado que a nutricionista Joana Moura ficou perplexa ao deparar-se com estas situações. Além das minipizzas congeladas, viu cereais de pequeno-almoço açucarados e refeições pré-feitas com a melhor classificação, A, assinalada a verde pela escala nutricional NS; e outros produtos mais saudáveis (por exemplo, iogurtes gregos ou azeite) com piores avaliações pelas letras C (amarelo) e D (cor de laranja). Reparou ainda que as margarinas eram avaliadas com C e D, ficando “erradamente” à frente das manteigas (E), diz à SÁBADO.
Joana Moura tem alertado para estas incongruências na sua página do Instagram (Jocooking), para que não se pense que os alimentos ultraprocessados são mais saudáveis do que os naturais. “É um erro.”
A médio prazo, as más escolhas têm um custo para a saúde, algo que preocupa a especialista: “Um dos maiores problemas nutricionais é o
“A ESCALA CENTRA-SE MUITO MAIS NO VALOR CALÓRICO DOS ALIMENTOS”, DIZ A MÉDICA NUTRICIONISTA PAULA RAVASCO
crescendo de doenças metabólicas, como a diabetes tipo 2. Há um elevado consumo de alimentos artificiais com inúmeros conservantes e que na sua constituição contêm açúcares, farinhas hidrolisadas e refinadas ou gorduras inflamatórias.”
Então o que significa?
Um estudo do Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge alertou para estas incoerências. Da análise, publicada em 2021, concluiu que 87% dos produtos mais bem classificados pela NS, com as letras A e B (verde), tinham teores de açúcar e sal que excediam os valores de referência da Estratégia Integrada para a Promoção da Alimentação Saudável (EIPAS). “A escala centra-se muito mais no valor calórico dos alimentos. O azeite tem uma classificação de ‘C’ porque é altamente calórico”, explica a médica nutricionista Paula Ravasco. Ficam fora da avaliação “as vitaminas, os minerais e os aditivos que acentuam os paladares doces e salgados”, diz.
Crianças e jovens podem ser mais suscetíveis aos sabores intensos de alimentos processados com açúcar, adoçantes, gorduras hidrogenadas, etc. “São substâncias muito inflamatórias para o organismo. Não é só por engordarem, não são boas para a nossa saúde, pois não favorecem o bom funcionamento digestivo, alteram o microbioma intestinal, são mais alergénicas, não alimentam as bactérias boas do intestino e as pessoas têm uma saúde gastrointestinal pior”, avisa a médica de Medicina Geral e Familiar Filipa Mafra Gallo. Deixa um último conselho: “É muito importante saber ler os rótulos!” ●