SÁBADO

SERÁ ISTO MODA OU APENAS LIXO?

A casa de alta-costura Balenciaga vive para chocar. Depois de uns ténis rasgados e sujos, agora uma pulseira que parece um rolo de fita adesiva custa 2.700 euros.

- Por Vanda Marques

Um saco do lixo, com atilhos vermelhos em cima, para fechar bem ou então o incontorná­vel saco azul do IKEA podem ser considerad­os carteiras de luxo como uma Chanel? E se lhe juntarmos o nome de uma marca de alta-costura? A Balenciaga adora testar os limites do que é ou não moda. A lista de peças irreverent­es é grande: uma carteira para senhoras que é igual a um pacote de batatas fritas como mala, uma saia que mais não é do que uma toalha de banho enrolada à cintura a fazer de saia. Os preços que acompanham estes produtos têm sempre vários zeros. A vontade de chocar e de chamar à atenção é tal forma que já venderam uns ténis completame­nte sujos e rasgados. Na altura, as críticas não faltaram para acusar o diretor criativo da marca, Demna, de estar a brincar com a pobreza e a glamorizar os sem-abrigo com uns ténis destruídos a custarem 1.500 euros. Carlos, especialis­ta em marcas, compreende as críticas. “Acho que quando uma marca entra em temas frágeis da sociedade, como é o caso da pobreza, e os usa para se promover é um caminho muito pouco nobre”, diz. E acrescenta: “Uma marca constrói-se com alicerces sólidos. E há um limite muito ténue entre o luxo e a luxúria. Ter um tigre é luxo ou luxúria? Procurar a diferencia­ção causando tanto choque pode ser um exemplo de como se está a passar das marcas.”

Mas sobre as polémicas, o diretor criativo da marca, Demna, disse ao site WWD: “Não poderia perder a oportunida­de para fazer a mala lixo mais cara do mundo, porque quem é que não adora um escândalo da moda?”

A nova peça-choque da casa, criada em Espanha, é uma pulseira igual a um rolo de fita adesiva transparen­te. Pelo valor de 2.700 euros pode-se comprar a pulseira, que entretanto esgotou. A peça foi apresentad­a na Semana da Moda de Paris que aconteceu este mês. Durante o desfile, a modelo, que usava um vestido azul com fita por cima, vinha acompanhad­a da pulseira outono/inverno 2024. Não há joias, metal ou pedras

preciosas – apenas se vê o plástico. Depois do desfile vários influencer­s puderam ver as peças de perto e uma delas fotografou a pulseira-choque e publicou nas redes sociais. O resto foi ver a Internet a pegar fogo com a polémica.

Quando é longe demais?

Mas não será que desta vez foi longe demais? “Essas peças não são feitas para vender. São sobretudo declaraçõe­s de personalid­ade da marca, mas nem sempre acrescenta­m valor à própria marca”, diz à SÁBADO Carlos Coelho, presidente da Ivity Brand Corp, consultora internacio­nal de criação, inovação e gestão de marcas. “Vivemos uma época em que as marcas precisam de chamar a atenção como nunca antes”, destaca.

A consultora e professora especialis­ta no mercado de luxo, Helena Amaral Neto, reforça esta ideia e defende que hoje o “maior luxo é a atenção”. E vai mais longe: “É uma forma de defender um ideal e uma posição, por exemplo, poderá ser uma forma de chamar a atenção para a sustentabi­lidade, para reci

“ESSAS PEÇAS NÃO SÃO FEITAS PARA VENDER. SÃO DECLARAÇÕE­S DE PERSONALID­ADE DA MARCA”

clar peças. Estes produtos podem ser maneiras de comunicar valores da marca de forma provocador­a.” Helena Amaral Neto diz que a obrigação da marca de luxo é manter o seu ADN e no caso da Balenciaga é a irreverênc­ia.

Mas pagar milhares de euros por peças de plástico condiz com a ideia da qualidade de luxo? “A qualidade faz parte do luxo, mas refere-se também à longevidad­e e durabilida­de dos materiais, à confeção e à peça”, diz a professora e consultora.

Até hoje, o estilista georgiano da Balenciaga Demna Gvasalia só pediu desculpa uma única vez. O maior escândalo foi quando usou numa publicidad­e uma criança com um urso de peluche com roupa sadomaso e um copo de vinho, mas dessa vez, Demna Gvasalia pediu desculpa. “É desapropri­ado ter crianças a promover objetos que nada têm a ver com eles”, disse em 2022. ●

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