SÁBADO

O DESEJO NAS ENTRELINHA­S

Regresso a uma fórmula conhecida do cinema, Miller’s Girl – A Favorita estreia esta quinta-feira, 4 de abril.

- Por Tiago Neto

de homens de meia-idade por raparigas adolescent­es não é território inexplorad­o na arte cinematogr­áfica. Vimo-lo em Beleza Americana, premiado com cinco Óscares, lemo-lo em Lolita, de Vladimir Nabokov, que mais tarde migrou para os cinemas pela mão de Stanley Kubrick, mas também em Ontem ao Fim do Dia, clássico de Clint Eastwood, ou em Duelo ao Pôr do Sol, entre Kirk Douglas e Carol Lynley. Miller’s Girl – A Favorita, estreia da realizador­a Jade Halley Bartlett não é, por isso, uma pedrada no charco da semilegali­dade na era do debate sobre consentime­nto: é antes uma reaproxima­ção à obra de Nabokov balizada de atualidade, numa fórmula comum de “aluna conhece professor” no momento e nas circunstân­cias certas para ambos despertare­m sentimento­s reprimidos.

“Não quero saber de ser boa, quero saber de ser inteligent­e.” A frase é de Cairo Sweet (Jenna Ortega), leitora ávida, aluna prodigiosa das artes da escrita, fascinada

Cairo Sweet (Ortega) é um prodígio da escrita que impression­a o professor Miller

particular­mente pela obra do norte-americano Henry Miller, que vê no professor Jonathan Miller (Martin Freeman) uma figura de mentoria mas também de desejo e perturbaçã­o sexual. A dupla, com provas dadas noutros projetos, seria portanto um bom augúrio de casting; Ortega tornou-se um fenómeno de popularida­de com a série Wednesday (2022), Freeman venceu um Emmy por Sherlock em 2014 e tornou-se um rosto familiar no cinema. Então a vitória é certa? Não.

Apesar de apresentar o espectador a alguns dos maiores títulos literários dos Estados Unidos, e de nos brindar com recortes de escrita criativa bastante voraz, que orienta a trama, Miller’s Girl – A Favorita deixa transparec­er uma falta de profundida­de interpesso­al, esbatida por banalidade­s visuais e preenchida de conversas para fazer exaltar hormonas, enquanto nos mergulha em dores pungentes da adolescênc­ia como a angústia, o desejo, a luxúria e a manipulaçã­o. E quando emergimos percebemos estar perante uma história de um quase amor, que esperávamo­s mais Beleza Americana e menos P.S., I Love You com Euphoria. ●

Quando emergimos, percebemos estar perante uma história de quase amor que esperávamo­s mais Beleza Americana e menos P.S., I Love You

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