ABRAM ALAS PARA A PRIMAVERA DA MÚSICA
Em abril, as flores musicais desabrocham, fazendo fluir novos sons pelos nossos ouvidos. Da pop ao rock, passando pelo indie ou pela eletrónica, eis os maiores lançamentos da temporada.
Beyoncé regressa com o segundo ato da sua trilogia, Pearl Jam não deixam a chama apagar-se e Pet Shop Boys celebram as emoções humanas – eis alguns dos grandes lançamentos desta primavera musical
costuma anunciar uma época fértil em novos discos, mas a safra deste abril parece especialmente prendada: em diversos géneros musicais, são fartas as descobertas que nos esperam nas próximas quatro semanas. Veja as mais importantes.
AS DIVAS DA POP
O aguardado sucessor de Renaissance, o disco que pôs Beyoncé no topo do mundo em 2022, já está cá fora, e promete fazer furor pelo resto do ano. Cowboy Carter é o segundo ato de uma trilogia que vê a artista explorar as raízes da música negra americana: no anterior, a música de dança, e neste o country e o gospel, espelhados nos dois primeiros singles – Texas Hold ‘Em e 16 Carriages.
Por falar no topo do mundo, Taylor Swift, a pessoa do ano 2023 para a revista Time, aproveitou a vitória nos Grammys para anunciar o lançamento de The Tortured Poets’ Department, o seu primeiro disco de originais desde Midnights (2022) – editado a 19/4, antes da sua passagem por Portugal, a 24 e 25/5, no Estádio da Luz. E não nos esqueçamos de Anitta, ícone brasileiro cuja repercussão mundial só parece crescer: subintitulado A Favela Love Story, o seu terceiro disco multilingue, Funk Generation,
de 1969
sai a 26/4, a tempo da atuação no Sudoeste, a 9 de agosto.
AS LENDAS DO ROCK
Mantendo-se admiravelmente ativo, Mark Knopfler não dá sinais de pendurar a guitarra. No novo disco, One Deep River, editado a 12/4, mantém-se no registo pelo qual é conhecido – um rock clássico encostado à linguagem do blues. De uma parceria mais antiga, a do compositor canadiano Neil Young com a banda americana Crazy Horse, que já leva 55 anos, surge mais um álbum, Fu##in’ Up, o próximo capítulo de uma das carreiras
mais importantes do rock.
De volta aos discos estão ainda os Pearl Jam, últimos resistentes do grunge americano que, após o regresso aos discos em 2020, com Gigaton, mantêm a chama acesa em Dark Matter, lançado a 19/4 – aquecimento para o seu concerto no NOS Alive, a 13/7.
OS ASTROS DO INDIE
Sempre acarinhados pelo fiel público do indie rock, os Vampire Weekend voltaram a sair da toca cinco anos depois: o seu quinto álbum, Only God Was Above Us, chega-nos a 5/4, na sequência dos singles Capricorn e Gen-X Cops.
Igualmente importantes para
No indie, Vampire Weekend recuperam uma pop de inspiração divina, Black Keys reciclam o blues rock para uma nova geração e Khruangbin estão inspirados para maravilhar
o género foram os Black Keys, que não abrandam o ritmo desde que regressaram do hiato de 2019. O seu quarto álbum desde então, Ohio Players, que dá continuidade ao revivalismo do blues rock para uma nova geração, é lançado no mesmo dia. Já St. Vincent, que parece angariar mais fãs e elogios com cada novo lançamento, apresenta-nos um álbum de “pop pós-praga” em que recruta nomes como Dave Grohl ou Cate Le Bon: All Born Screaming, cá fora a 26/4.
OS RITMOS DA ELETRÓNICA
Depois do seu maior interregno entre álbuns (apenas quatro anos), os Pet Shop Boys apresentam, a 26/4, Nonetheless, uma “celebração das emoções diversas e únicas que fazem de nós humanos”, em que cada canção é composta por “uma orquestra de eletrónica”. O single de avanço, Loneliness, confirma-o.
No âmbito da eletrónica, destacam-se ainda os Justice, porta-estandartes do house francês que, em Hyperdrama, lançado a 26/4, recrutam Tame Impala, Miguel, Thundercat e Conan Mockassin para pôr a disco e a eletrónica “a lutar uma com a outra por atenção” – apresentam-no no Primavera Sound, no Porto, a 7/6. Do Reino Unido, os Mount Kimbie viajaram para o interior da Califórnia, onde se inspiraram na “paisagem surreal do deserto” para The Sunset Violent, editado no dia 5/4, em que contam com King Krule para expandir a sua linguagem de pós-dubstep e UK garage.
OS SONS DO MUNDO
De difícil categorização, os Khruangbin continuam a colher admiradores com a sua mescla de rock do deserto, música de dança e sons orientais: A La Sala, o quinto álbum, que o trio texano apresenta no NOS Alive, a 13/7, é lançado a 5/4 – com uma faixa inspirada numa paisagem portuguesa, o Farolim de Felgueiras.
Por fim, mas não menos importante, o mundo do afro jazz pode estar perante um acontecimento memorável: Shabaka Hutchings, reconhecido como prodígio do saxofone pelo trabalho com Sons of Kemet, e The Comet Is Coming, estreia-se a solo, desta vez na flauta e no clarinete, em Perceive Its Beauty, Acknowledge Its Grace, editado a 12/4. ●
terminou o seu último grande livro, Viver para Contá-la (2002) – que concebeu como o primeiro de vários volumes de uma autobiografia, acabando por ficar-se pelo ano 1950 – Gabriel García Márquez desenterrou das suas montanhas de papéis (como havia feito, anos antes, com Doze Contos Peregrinos), duas histórias que acreditava conseguir levar a bom porto.
A primeira, provisoriamente intitulada “Ela”, acabou por se tornar Memórias das Minhas Putas Tristes (2004), controversa novela sobre um velho jornalista de 90 anos que se apaixona por uma prostituta virgem de 14, e a última obra de ficção publicada em vida de García Márquez, a dez anos da sua morte.
Na segunda, que já na altura se chamava Vemo-nos em Agosto, foi trabalhando a conta-gotas nos últimos anos de vida, à medida que dispersava rumores de que tinha deixado a escrita enquanto batalhava com problemas de saúde cada vez mais frequentes. A demência acabou por vencer a vontade de escrever, e o livro ficou por terminar:
Inacabada na altura da morte de García Márquez e deixada por ele ao esquecimento, a novela Vemo-nos em Agosto foi recuperada pelos filhos – é o seu último livro
em 1967
chegou a deixar uma versão marcada como “grande OK final” (tendo feito, apesar disso, edições posteriores), mas no último testemunho que se conhece do autor sobre o texto, lê-se: “Este livro não presta. É preciso destruí-lo.”
À desobediência dos seus filhos, Rodrigo e Gonzalo García Barcha, em conluio com o seu editor, Cristóbal Pera, podemos agradecer a existência do seu último romance, publicado quase 10 anos depois da morte de Gabo – como lhe chamavam, carinhosamente, os seus fãs. Quanto à sua apreciação do livro, ainda que se possa argumentar que não esteja ao nível das suas maiores obras, é difícil ignorar, nas suas cerca de 90 páginas, as pequenas marcas de génio que sempre caracterizaram a sua prodigiosa imaginação.
Na história de Ana Magdalena Bach, mulher de 46 anos que todos os dias 16 de agos