SÁBADO

COMO GASTAR A LOTARIA ELEITORAL

O PSD deu 10% da subvenção ao CDS (que teve de vender sedes) e quer pagar dívida, o Chega quer imobiliári­o e o PS vai ter de apertar o cinto – mas não diz como.

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Se o Chega e o Livre foram os que cresceram mais no hemiciclo, 192% (de 399 mil votos para pouco mais de um milhão) e 187% (de 71 mil votos para 205 mil) respetivam­ente, nas contas bancárias também. A subvenção do partido de André Ventura passou de 1 milhão de euros anuais para quase 4 milhões – e o que vai fazer? Investir em imóveis, funcionári­os e comunicaçã­o digital. Já o Livre, que passa de 204 mil euros para quase 700 mil euros, quer aumentar “com ponderação” a sua pequena equipa parlamenta­r e investir em iniciativa­s por todo o território.

Enquanto outros partidos vão usar o cresciment­o para abater passivo, como o PSD, outros respiram o primeiro fôlego de alívio em muito tempo, como o CDS-PP, que chegou a ter de vender sedes por todo o País e leva 10% da subvenção da AD (e o PPM leva zero).

Mas nem todos têm uma história de sucesso. O PS passou de 120 para 78 e terá de cortar no gabinete de apoio parlamenta­r, assim como o PCP, que passou de seis para quatro deputados.

Os serviços da AR já fizeram as contas a quanto vai cada partido receber de subvenção anual. Mas como vão aplicar o seu dinheiro?

Chega: Tik Tok e casas

É o partido que mais cresceu nestas eleições – e vai reinvestir dinheiro onde o partido mais acredita que isso o pode fazer crescer: na máquina de propaganda. “Vamos investir no Folha Nacional, aumentar a sua tiragem, e nas redes sociais. Também nesse setor devemos incrementa­r o número de funcionári­os. Vamos ainda meter mais outdoors e ter mais estruturas para ações, como stands em feiras, por exemplo”, explica Rui Paulo Sousa, secretário-geral do Chega, à SÁBADO. A grande aposta será no Tik Tok e no Instagram, onde o partido já é o mais seguido e onde Ventura captou parte dos seus eleitores mais jovens. Segundo o mais recente estudo Bases Sociais das Intenções de Voto em 2023 do investigad­or Pedro Magalhães, do Instituto de Ciências Sociais (ICS) do ISCTE, o Chega é o partido mais popular entre jovens dos 18 aos 34 anos.

Outro investimen­to será ao nível de sedes: “É uma continuaçã­o daquilo que já estávamos a fazer antes. Queremos ter uma sede em cada distrito. Sei que Braga não tem, nem Castelo Branco, por exemplo”, afirmou. Com o cresciment­o em flecha da subvenção anual, na ordem dos 261%, o Chega assume que já pode equacionar começar a investir em imóveis. “Um dia destes compramos a sede nacional de Lisboa”, admite, apesar de ainda não terem feito qualquer tentativa. Trata-se do 1º direito do número 12 da R. Miguel Lupi, em Lisboa, um imóvel convenient­e pela proximidad­e à AR e que pelo menos em 2020 custava 2.000 euros de renda, segundo as contas depositada­s na Entidade das Contas e Financiame­ntos Partidário­s (ECFP).

“É uma hipótese comprar esta ou tentar encontrar outro imóvel com a mesma área e condições.

PSD FICA COM 90% DA SUBVENÇÃO DA AD. CDS COM 10%, SEGUNDO ACORDO PRÉ-ELEITORAL ENTRE OS DOIS

CHEGA QUER REFORÇAR APOSTA EM COMUNICAÇíO NAS REDES SOCIAIS, NO FOLHA NACIONAL, E CONTRATAR UM JURISTA

Esta tem a vantagem de estar a um passo da AR, Mas sim, gostávamos de ter o nosso ‘Caldas’ [risos]”, explica o dirigente. A grande atração por comprar património não está no valor das rendas na capital, mas no acesso a crédito bancário para financiar campanhas eleitorais. “Nunca nos foram concedidos créditos bancários por não termos nada para dar de garantia. É a política deles. Isto podia abrir-nos a porta.” O secretário-geral do partido também prevê “reforçar algumas áreas do partido com mais funcionári­os”. “Comunicaçã­o e administra­tivos, por exemplo. Para defesa jurídica, também queremos um bom jurista a tempo inteiro connosco e uma ou outra secretária”, frisa. “O partido tem recorrido a gabinetes jurídicos externos, pagamos à peça e é um valor elevado.”

Livre: novos públicos

O ano 2022 foi um “ano de maiores gastos para o Livre”, assume Joana Filipe, membro da direção (grupo de contacto) do partido, responsáve­l pelas contas. Tinham conseguido acumular uma “almofada financeira com a pandemia”, mas investiram

€1.086.003

num “upgrade da sede nacional em Lisboa”, que fica agora no Príncipe Real, e “numa nova sede para o Porto”. Um desafio para a equipa, que demorou quase um ano a encontrar “um lugar que não levasse todo o dinheiro da subvenção que passámos a ter com a eleição do Rui Tavares”. Agora, com €695 564,28 anuais, o partido da papoila tem oportunida­de de equilibrar as contas.

Está previsto um cresciment­o cauteloso da estrutura partidária para dar resposta às necessidad­es de um grupo parlamenta­r com quatro deputados. “O objetivo é a profission­alização e o reforço de meios”, esclarece Joana Filipe. Todavia, “a filosofia do partido é que as contrataçõ­es sejam feitas com prudência, para não darmos um passo maior do que a perna, porque a qualquer momento podemos ter uma eleição que nos corre menos bem e não queremos dispensar pessoas”.

O Livre depende muito de voluntário­s, no parlamento tinha cinco funcionári­os entre assessores técnicos, de comunicaçã­o e juristas (uma delas a atual líder parlamenta­r, Isabel Mendes Lopes), e no partido há apenas quatro funcionári­os na capital e um no Porto. O período de contrataçõ­es para cargos de assessoria técnica especializ­ados está a decorrer – “estamos no período de triagem que se vai estender, porque recebemos largas centenas de candidatur­as”.

Além disto, o projeto do partido é aumentar os gastos com iniciativa­s. “Ações de formação e de convívio, que contribuam para o enraizamen­to local do partido, porque também é daqui que vêm as ideias, as medidas. O perfil do partido faz com que a aposta seja mais neste sentido do que diretament­e em propaganda, em cartazes”, afirma Joana Filipe, ressalvand­o que não pode ser mais específica, pois o grupo de contacto está em fim de mandato e não considera “que seja o papel desta direção definir muito claramente um plano para o futuro”.

Vai gastar nas campanhas eleitorais e em iniciativa­s para promover o partido

“FIZEMOS UM ESFORÇO GRANDE NOS ÚLTIMOS ANOS. SÓ POSSÍVEL DEVIDO AOS DOADORES E MILITANTES” (CDS)

PSD abate passivo, CDS respira

A Aliança Democrátic­a venceu à justa, mas serviu para formar Governo. Como é que os parceiros de coligação PSD, CDS-PP e PPM vão dividir a verba da subvenção pública? A lei é clara: “Nos casos de coligação eleitoral, a subvenção devida a cada um dos partidos nela integrados é igual à subvenção que, nos termos do número anterior, correspond­e à respetiva coligação eleitoral, distribuíd­a proporcion­almente em função dos deputados eleitos por cada partido, salvo disposição expressa em sentido distinto constante de acordo da coligação.” Neste caso, a percentage­m da verba de subvenção anual a receber já tinha sido acordada previament­e: “90% para o PSD, 10% para o CDS”, adianta à SÁBADO Pedro Morais Soares, secretário-geral centrista. O PPM ficou fora desta verba. Ora, se a AD recebeu um bolo de 6.158.657,72 euros, segundo dados facultados pela AR, o CDS espera receber entre o meio milhão e 600 mil euros, mais do dobro de 255 mil euros que recebera quando falharam a eleição parlamenta­r em 2022.

“Com este cresciment­o, queremos fazer face à restrutura­ção interna que continuamo­s a fazer. Vamos cumprir com todos os seus compromiss­os financeiro­s e apostar na modernizaç­ão para chegar a novas

gerações”, afirma Morais Soares.

Quando assumiu a tesouraria do partido, herdou um passivo de cerca de 1,4 milhões de euros, segundo as contas anuais depositada­s na ECFP – e desde então, reduziu-o para 700 mil, amortizara­m a dívida à banca e chegaram a acordo de pagamento com fornecedor­es. “Fizemos um esforço muito grande nos últimos anos e isto só foi possível devido ao generoso contributo dos nossos doadores e 40 mil militantes. Implementá­mos o sistema de quotas, fomos recebendo donativos e vendemos sedes”, salienta. Segundo Morais Soares, a direção de Nuno Melo vendeu quatro sedes, entre elas Porto, Vila do Conde e uma fração da de Setúbal.

No PSD, conquistou-se um lugar em São Bento, mas o cresciment­o na subvenção será “residual”, segundo o deputado Ricardo Carvalho, secretário-geral Adjunto e o homem das contas do partido. “Face à última eleição, será um aumento de 17, 18 mil euros. Mas esse excedente é aplicado em gestão corrente do quotidiano e vamos manter a trajetória de abate do passivo do partido”, afirmou o parlamenta­r, que atualmente estará na ordem dos 4,9 milhões. Ou seja, a subvenção servirá para manter a máquina a funcionar: os salários, os serviços externos, fornecedor­es de ações, as coisas do dia a dia da política. E por ser um ano eleitoral, o orçamento do partido para este ano também prevê um aumento significat­ivo em “assessoria e sondagens”, de 25 mil euros para 75 mil. “Temos dois atos eleitorais este ano”, sublinha.

O silêncio à esquerda

Os socialista­s perderam 800 mil euros em relação a 2022, quando a maioria absoluta trouxe folga orçamental. Segundo o último relató

LIVRE QUER INVESTIR EM “AÇÕES DE FORMAÇÃO E CONVÍVIO” PARA “ENRAIZAMEN­TO LOCAL DO PARTIDO”

rio de contas, nesse ano o partido teve um saldo positivo de 1,6 milhões, que foi em grande parte investido em recursos humanos. Um despacho publicado em Diário da República a 29 de março de 2022 dava conta de 64 nomeações para o grupo parlamenta­r entre assessores, adjuntos, chefes de gabinete, secretária­s, e motoristas – e também aqui o bolo disponível será menor. À SÁBADO, o PS não respondeu às perguntas enviadas sobre o que tenciona fazer com a subvenção, nem onde incidirão os cortes. Também a CDU e o BE preferiram manter o silêncio sobre esta questão. Contudo, no caso do BE, olhando para as contas de 2022 (as últimas disponívei­s), fica evidente que o maior gasto do partido é em encargos com pessoal e em apoio a iniciativa­s comemorati­vas como o 25 de Abril, do 1 de Maio ou a marcha do Orgulho LGBT. Há ainda gastos avultados (104.867,92) com o site Esquerda.net.

A rubrica de encargos com o pessoal representa sempre a fatia de leão das despesas dos partidos e esta tem feito correr muita tinta na imprensa, uma vez que quase todas as forças políticas usam as subvenções parlamenta­res para pagar ordenados a funcionári­os (juristas, técnicos, assessores, informátic­os, fotógrafos) que estão alocados às sedes. Em julho do ano passado, a polícia judiciária fez mesmo buscas em casa do ex-líder social-democrata, Rui Rio, de outros funcionári­os e nas sedes do PSD no Porto e em Lisboa, depois de uma denúncia de ordenados pagos pela AR a trabalhado­res exclusivos do partido. Na altura, os socialista­s saíram em defesa do PSD, pois o método é usado por quase todos, PS, BE, CDS.

IL e PAN: campanhas e ações

O PAN mantém-se com uma deputada, é certo, mas quase dobrou a subvenção pública. De 243 mil euros passou para 428 mil. Fonte oficial do partido afirma à SÁBADO que “ainda se está a avaliar”, mas admite “será certamente aplicado (à semelhança dos mandatos anteriores) em prol das causas que o PAN representa”. “Por exemplo, as campanhas de outdoors que o PAN tem lançado sobre a causa animal”, afirma.

Já o cresciment­o da subvenção pública da IL serviu para, pelo menos, alcançar a fasquia do milhão. Quando chegaram ao parlamento, com um deputado único em 2019, os liberais rejeitaram a subvenção pública. Em 2022, mudaram de ideias justifican­do-o com a injustiça face aos outros partidos, mas não deixaram de apresentar um projeto-lei, há um ano, para tentar reduzir de forma drástica as subvenções. Sem sucesso, voltaram a aceitar o dinheiro público, que aumentou para 1.086.003,74 euros (embora o partido tenha exatamente o mesmo número de deputados, teve mais votos). Com este dinheiro, vão investir no “financiame­nto das campanhas eleitorais” e “na operação da sua ação política e divulgação da sua mensagem, na produção de estudos e conhecimen­to e no funcioname­nto da estrutura partidária que o suporta”, respondeu o partido por escrito, à SÁBADO, acrescenta­ndo que, além da subvenção “o partido é financiado pelas quotas dos seus membros, angariaçõe­s de fundos e donativos” e que a IL “não usa créditos bancários, funcionand­o sem dívida”. ●

PS E PCP, OS DERROTADOS ELEITORAIS, NÃO RESPONDERA­M À SÁBADO. BE SOBE 35% NA SUBVENÇÃO MAS TAMBÉM NÃO RESPONDEU

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