SÁBADO

Uma vitória judicial que vale por mil

- Advogada

VIVEMOS uma semana histórica no que respeita ao ativismo climático perante os tribunais. Pela primeira vez, o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos reconheceu, esta terça-feira, que um Estado – a Suíça – violou os direitos fundamenta­is de cidadãs do seu país ao não tomar as devidas medidas para combater as alterações climáticas.

Os problemas das alterações­ações cli-climáticas provocadas pela açãoação hu-humana são conhecidos e sãoão múlti-múltiplas as suas frentes de combateomb­ate – científica­s, demonstran­do objetiva-objetivame­nte os perigos e riscoss para as pessoas, para o planeta e para a biodiversi­dade; le-gislativas, por via da adoçãoo de medidas ao nível nacio-nal e europeu com vista a reverter o curso seguido até aqui; ativistas – por via de manifestaç­ões e ações de sensibiliz­ação, entre outras.

O acesso à justiça, por via dos tribunais, pode e deve ser uma forma de ativismo, na medida em que se verifique uma violação dos direitos dos cidadãos e os tribunais sejam capazes de corrigir ou diminuir, minima-mamente, as consequênc­ias des-dessa mesma violação. Quandoo está em causa uma violação de direitosre­itos que diz respeito a um problemaa estrutu-estrutural da sociedade, cuja relevância extravasa a justiça do caso concreto e pode ter impacto em muitas outras pessoas, podemos falar de litigância estratégic­a.

A litigância estratégic­a concretiza-se num processo judicial que, para além da vitória dos seus autores, visa (1) contribuir para a conscienci­alização da sociedade civil para o problema que ali é tratado, (2) criar um precedente que possa ser usado em tribunal em casos futuros e semelhante­s, avançando a jurisprudê­ncia que reconheça determinad­o direito e (3) criar um risco de litigância que dissuada outros potenciais violadores daquele direito de adotarem uma conduta potencialm­ente punível.

Quando falamos de litigância estratégic­a na área das alterações climáticas, há desafios particular­es que precisam de ser enquadrado­s. Desde logo, a circunstân­cia de ser um problema novo, com dinâmicas novas – por exemplo, ser pouco evidente quem é o responsáve­l pelos danos sofridos e ser difuso o nexo casual entre a ação e o dano – que o Direito vigente ainda não absorveu.

Ora, aqui chegados, podemos desde já identifica­r duas formas de abordar um eventual processo judicial desta natureza: quem arrisca muito, iniciando processos com fragilidad­es processuai­s e substantiv­as, focado sobretudo no benefício (1), isto é, no impacto mediático da sua iniciativa processual; e quem prefere não arriscar tanto e avançar só mediante a existência de um processo sólido, tanto processual como substantiv­amente, procurando a vitória judicial e a obtenção dos benefícios (1), (2) e (3).

Esta terça-feira, o TEDH decidiu sobre três processos de natureza climática. Dois, arriscaram mais e avançaram para tribunal com identifica­das fragilidad­es processuai­s – os que perderam por esses mesmos motivos. Entre eles, estava o processo em que seis jovens portuguese­s, representa­dos por advogados ingleses, processava­m 32 países por inação climática. Outro, tinha mais solidez – o que ganhou.

O único processo vitorioso da semana pertence e um conjunto de mais de 2.000 mulheres idosas suíças, em parte representa­das por uma associação sem fins lucrativos. Estas senhoras processara­m, em primeira instância, o Estado suíço junto dos tribunais nacionais po ri nação de políticas de combate te às alterações alter climáticas e infelizmen­te mente perderam.pe Estaéu ma condiçãodi­ção essessenci­al para recorrera o TETEDH – esgotar todas as viavias internas de recurso, algalgo que os seis jovens portuguese­s optaram por não fazer. As idosas queixaram-se, assim, ao TEDH, que lhes deu razão.

Esta decisão é um marcoco importante,im na medida em que determina que a inação dos Estados a combater eficazment­e as alterações climáticas pode violar os direitos fundamenta­is dos cidadãos. AgorAgora, pode ser citada em inúmeros outros processos pelo mundo fora e o percurso até lá ser replicado noutras jurisdiçõe­s, forçando os Estados a adotaremta­rem medmedidas mais ambiciosas, capazespaz­es de pprotegere­m os cidadãos e o planeta. EsEstá só a começar. ●

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