A OBSESSÃO COM O TEMPO
Àà espera de um táxi – assim estávamos nós, de novo, sempre uma e outra vez, a mesma história, o mesmo encontro. Em terra de ninguém em termos de assuntos, com todos os temas urgentes esgotados, dei por mim a fazer o que não esperava nem de uma inimiga: comentei o tempo.
Estava, de verdade, um caloralor imprevisto (mas, admito ago-ora, nada justificava aquele co-comentário, que a minha amigaga poderia até ter considerado ofensivo, ao fim de tantos anos). De manhã, dizia-lhe eu, o céu prometera até chuva, vento e aquela sensação tér-rmica “ainda bem que trouxee casaco”. De olhar perdido, ela concordava ao mesmo tempopo que estranhava. “Não te transformaste nessa pessoa, pois não?”, perguntou-me, de repente, como se tivesse acordado daquele estado zen, metade retiro espiritual metade jardim de pedras japonês.
Eu não sabia a que tipo de pessoa a minha amiga se referia, mas pelo franzido da testa e pelo lábio arqueado era fácil adivinhar que ela não seria fã da pessoa. “Claro que não”, respondi-lhe, em grande parte para a apaziguar, uma vez que, por esta altura, ainda só imaginava a que se referia.
Ela tinha uma teoria e eu, animada por ser testemunha da História a ser feita, tinha
ELA TINHA UMA TEORIA E EU, TESTEMUNHA DA HISTÓRIA A SER FEITA, TINHA TODA A ATENÇÃO ORIENTADA NO SENTIDO DE A DESCOBRIR.
toda a minha atenção orientada no sentido de a descobrir. As pessoas, dizia ela, andavam obcecadas com o tempo – e a culpa era dos telemóveis. Para a minha amiga, era claro: já ninguém saía à rua no escuro. O velho hábito de olhar para o céu para perceber o que vestir, num claríssimo flirt com todo o tipo de caos, tinha desaparecido.
As pessoas querem controlar tudo, até o tempo – e com as aplicações que lhes dizem a que horas começa a chover e a que horas e em que direção o vento sopra, convencem-se de que são deuses da meteorologia. “E sabes que é que isso lhes serve?”, perguntou-me. “De nada?”, arrisquei eu. “De nada”, disse ela, antes de dizer uma frasef qualquer sobrebre alteraçõesalteraçõ climáticas que eu já não oouvi por estar boquiabertaquiaberta a ver a chuva, sol e o arco-íris que de repente se apresentavapresentava perante os nossossos olhos sesem aviso nem apelo,lo, mas bonbonito e confuso como um ddia nos Açores. ●