SÁBADO

Eleanor Coppola (1936-2024)

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Realizador­a, escritora e documentar­ista, mulher de Francis Ford Coppola e mãe de Sofia, viveu para o cinema e para a família. Ganhou um Emmy com um documentár­io sobre as gravações de Apocalypse Now

ODementia 13 é um filme de terror obscuro de 1963, uma produção norte-americana de baixo custo com um peso extraordin­ário na história do cinema. Não pelos atores que nela entraram ou pelo impacto na cultura popular, mas sim pela dupla que ali se formou: de um lado, o estreante realizador e argumentis­ta Francis Ford Coppola; do outro, a diretora de arte assistente Eleanor Jessie Neil. Conheceram-se durante a rodagem, em 1962, apaixonara­m-se, casaram em fevereiro de 1963 e ficaram juntos durante mais de 60 anos, até à morte de Eleanor – Coppola, de nome de casada – no passado dia 12. O casal teve três filhos, Gian-Carlo, Roman e Sofia, que também fazem parte desta história real que bem poderia ser um filme.

Eleanor nasceu em Los Angeles em 1936, filha de Clifford Neil, cartoonist­a político do jornal Los Angeles Examiner, e Delphine Lougheed, doméstica. Com a morte do pai (quando Eleanor tinha 10 anos), tanto ela como os dois irmãos acabaram por ser criados apenas pela mãe em Sunset Beach, na Califórnia. Foi por lá que estudou até se licenciar pela Universida­de da Califórnia em Los Angeles (UCLA) em Design.

Na terra dos filmes e dos sonhos, como era este estado norte-americano durante as décadas de 50 e 60, Eleanor foi crescendo em termos profission­ais.

Os documentár­ios eram – e foram – o seu grande ponto de interesse. Tornou-se realizador­a, videógrafa e argumentis­ta e passou a seguir Francis durante as gravações. Foi dessa forma que, em 1976, começou a documentar os bastidores e o dia a dia das filmagens de Apocalypse Now, o filme que veio a consagrar Coppola no Festival de Cinema de Cannes (venceu a Palma de Ouro) e no mundo, oito nomeações para os Óscares (ganhou dois) e quatro para os Globos de

Ouro (venceu três). Durante o ano passado nas Filipinas para se chegar a um dos melhores filmes de sempre sobre guerra (e o Vietname em particular), Eleanor conseguiu juntar dezenas de horas de filmagens sobre os dramas, as falhas no orçamento, a loucura dos atores, do marido, as agruras do clima, abusos de droga, problemas de saúde e tudo o que se possa imaginar numa produção caótica no meio da selva. O resultado foi Hearts of Darkness: A Filmmaker’s Apocalypse, realizado em parceria com George Hickenloop­er e Fax Bahr e lançado em 1991 no Festival de Cannes, em França. Hoje, este documentár­io distinguid­o com o Emmy de “Outstandin­g Individual Achievemen­t”, está disponível em várias plataforma­s (como o YouTube) e continua ser uma obra de referência, mostrando o outro lado de

EM 1976 COMEÇOU A DOCUMENTAR OS BASTIDORES E O DIA A DIA DAS FILMAGENS DE APOCALYPSE NOW

uma grande produção que, a qualquer momento, poderia ter terminado em tragédia: Antes disso (em 1979), já o material recolhido por Eleanor tinha dado origem ao livro Notes on the Making of Apocalypse Now.

Ao longo da sua vida, Eleanor Coppola estreou-se ainda como realizador­a (a solo) da comédia romântica Paris Can Wait, com Diane Lane, em 2016, e dirigiu ainda (em 2020) Love is Love is Love. Como escritora, lançou também Notes on a Life, autobiogra­fia sobre as dificuldad­es de criar três filhos nos locais escolhidos pelo marido para fazer filmes, às quais acrescento­u as histórias que levaram à participaç­ão de Sofia Coppola em O Padrinho Parte 3, a morte de Gian-Carlo, o filho mais velho, ou o nascimento da neta Gia poucos meses depois. Eleanor voltou ainda a documentar as filmagens, por exemplo, de Marie Antoinette, realizado pela filha em 2005 e 2006, antes de se dedicar à vida familiar e da produção de vinho no Vale de Napa, na Califórnia. Foi na região vinícola de Rutherford, no mesmo estado, que veio a morrer, aos 87 anos, na semana passada, rodeada pela família e por amigos. ●

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LUIS GRAÑENA

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