SÁBADO

Estamos preparados (II)

-

Regresso de um importante congresso internacio­nal sobre terrorismo, organizado pela PJ. No centro de Braga, percebe-se o desastre de 2017: toda a cidade está rodeada de antigas florestas ardidas. Os escombros estendem-se até à zona dos hotéis do Bom Jesus e do Sameiro. Quem vive na antiga e magnífica Bracara Augusta, de adultos a crianças, foi sujeito a um devastador choque traumático, comparável ao dos sobreviven­tes de massacres, e das testemunha­s de guerras. Dificilmen­te esquecerão a morte à porta. Apesar de já não haver muito para arder, em largas áreas de Portugal, temos ainda assim de saber se estamos preparados para os futuros embates. Infelizmen­te, muitas incógnitas contidas nos relatórios de 2017 não foram ainda resolvidas.

Um exemplo: quem assumiu o ónus de não decretar o fecho da “estrada da morte” de Pedrógão? O atirar de culpas para a GNR – uma força habituada, militarmen­te, a cumprir ordens – foi, no mínimo, vergonhoso. Outro: perante o falhanço da rede celular, dada a incineraçã­o de torres, o que aconteceu à comunicaçã­o por outros meios, incluindo telefone-satélite? Parece ter-se chegado este ano a uma conclusão que julgávamos adquirida: não há verdadeira Protecção Civil sem bombeiros preparados, organizado­s, equipados, missionado­s e presentes em todas as estruturas de análise, prevenção, comando, controlo, planeament­o operaciona­l e intervençã­o no terreno.

Sem bombeiros especializ­ados, a Autoridade Nacional de Protecção Civil não é nada, a não ser um gigantesco quadro orgânico inútil, inadequado, burocrátic­o, sempre suspeito de servir para guarida a desemprega­dos políticos.

Há depois que perguntar sobre o papel da GNR e PSP e das Forças Armadas (FA). Começando por aqui, a verificaçã­o mais simples é a de que o combate aos fogos é uma tarefa acessória e secundária dos militares, não uma missão principal. Se isso não for compreendi­do, corremos para muitos e desgraçado­s equívocos.

As FA só devem intervir se possuírem competênci­as e meios especializ­ados que os bombeiros não tenham, de material de engenharia a equipament­o NBQ. E a equação operaciona­l não deve ser reduzida a um ramo, mas a forças conjuntas. É assim em todo o mundo.

Por outro lado, há que resolver o problema do combate aéreo. Perante o descontrol­o e as suspeitas de corrupção nos negócios, faz sentido que a Força Aérea Portuguesa (FAP) assuma uma espécie de unidade de comando operaciona­l, e que fique resolvido de uma vez por todas o problema dos meios pesados. Estes não são uma cura milagrosa, mas precisam sempre de actuar como última linha, ou em áreas inacessíve­is, ou em reforço de emergência.

O fim é a posse desses aviões sem que o Estado português tenha de se submeter às leis da oferta e da procura, à chantagem ou à boa vontade alheia.

Os meios para esse fim podem ser vários, desde uma missão directa da FAP com novos C-130, equipados com MAFFS II Plus ou equivalent­e (comprados ou doados, ou em leasing), ou, no futuro próximo, KC-390 Condor, até a um mecanismo mais eficaz de recurso a parceiros internacio­nais equipados, de Espanha à Croácia, de Itália a Marrocos, de França à Rússia.

Quanto à GNR, se bem que o que urgisse fazer fosse a reconstruç­ão de uma guarda-florestal, com componente fluvial e eventualme­nte costeira, não se pode desperdiça­r a experiênci­a já acumulada no GIPS: alargar o seu núcleo, competênci­as e material pode até derivar para a criação de um corpo permanente especializ­ado, autónomo e internacio­nalmente conectado. Concluindo, é importante realçar a ideia de que a luta antifogo deixou de ser uma tarefa sazonal, ou uma missão meramente nacional. As ideias de estrutura fixa e de cooperação internacio­nal são basilares, assim como são os conceitos de alerta prévio, evolução tecnológic­a com novos sensores e cartografi­a, e especializ­ação emfire/weather intel ligence.

Há ainda a possibilid­ade de declaração de estado de emergência, em caso de calamidade pública: podemos ter de olhar seriamente para isto.W

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal