A SAÚDE DA POPULAÇÃO É UMA FONTE DE RIQUEZA
No futuro a necessidade de financiamento vai aumentar no futuro, tanto pela inovação terapêutica, cada vez mais sofisticada e personalizada, como pela inovação tecnológica que irá revolucionar a prestação dos cuidados de saúde.
Ana García-Cebrian é desde junho de 2017 a directora-geral em Portugal da Sanofi, empresa onde está desde 2014. Licenciada em Economia pela Universidade Carlos III em Madrid, fez um mestrado em Economia da Saúde em York e foi na Inglaterra que, durante 13 anos, fez a sua carreira em empresas como a MSD e a Eli Lilly. Chegara a Portugal em janeiro de 2016 como general manager da Sanofi Genzyme, a unidade de negócios da Sanofi para a esclerose múltipla, doenças raras, oncologia e imunologia.
O que é que o SNS (Sistema Nacional de Saúde) tem de bom e em que é que poderia melhorar?
Quando cheguei a Portugal vi que o SNS apresenta excelentes indicadores. É um facto que o estado de saúde da população portuguesa melhorou consideravelmente ao longo da última década, tendo a esperança média de vida aumentado 4,5 anos desde o ano 2000, ao mesmo tempo que registamos uma taxa de mortalidade evitável inferior à média europeia. Se tivermos em consideração que os gastos em saúde per capita ficaram 30% abaixo desta média, estes são realmente resultados muito positivos. Destaco ainda o Programa Nacional de Vacinação português, um dos mais completos e com uma maior cobertura vacinal, sendo uma referência na política de prevenção a nível europeu, apesar de o investimento em prevenção ser de apenas 1% do budget da saúde em comparação com 3% da média europeia. No entanto, na auto-avaliação do seu estado de saúde, os portugueses mostram-se pouco optimistas, talvez porque estes indicadores não sejam suficientes para medir na totalidade a eficácia e qualidade do sistema, dado que não recolhem outras medidas que reflictam a qualidade do serviço, a garantia de equidade e a resposta do sistema. Não podemos só avaliar a longevidade da população, mas também de que forma vive, qual a sua qualidade de vida, se está mais activa e saudável, etc.
Quais são os principais desafios futuros do SNS e como é que o mesmo se está a preparar para os enfrentar?
Os principais desafios do SNS para o futuro não se limitam a este mas a toda a conjuntura económica, demográfica e social do país. O envelhecimento da população e a cronicidade de muitas patologias, associados a um crescimento económico modesto, colocam-nos sérios desafios quanto à sustentabilidade de um sistema universal e tendencialmente gratuito, que queremos certamente preservar. Portugal é um dos países com maior percentagem do sector privado na saúde e onde a contribuição out of pocket é de 28%, uma das mais elevadas da Europa. Assim, o actual dilema de priorizar os produtos e serviços que são oferecidos aos doentes irá certamente agravar-se, pondo em questão qual é o sistema de saúde que queremos para o futuro e a melhor forma de o financiar.
Um dos problemas crónicos do SNS é o seu subfinanciamento. Como é que se poderia resolver e porque é tão difícil de fazer?
O SNS tem como base a universalidade e gratuitidade no acesso à saúde. Porém, os desafios económicos e sociais mencionados, que irão certamente manter-se, têm promovido um subfinanciamento deste sector por parte do Estado. Existe ainda um factor inerente a este sistema que é a garantia do acesso à inovação, em grande parte responsável pelo aumento da esperança média de vida e pela melhoria da saúde da população. Assim, assumimos que a necessidade de financiamento irá aumentar no futuro, quer ao nível da inovação terapêutica, cada vez mais sofisticada e personalizada, quer ao nível da inovação tecnológica que irá revolucionar a prestação dos cuidados de saúde.
Se a saúde da população continuar a ser encarada como um custo e não como fonte de riqueza e um dos motores essenciais para o desenvolvimento económico e social do país, estes factores irão agravar a actual situação de subfinanciamento. Provavelmente exigirá o desenvolvimento de modelos de financiamento alternativos e a redefinição do papel dos vários interlocutores do sector que terão que estar alinhados numa estratégia nacional de longo prazo.