E se fosse consigo?
O programa aproveita a lógica dos apanhados para provocar situações-limite. O sucesso é inegável, mas apresentá-lo como produto de informação é errado
Oprograma coloca logo uma condicional inexistente: e se fosse consigo? O que aconteceria, qual a sua reacção, se fosse consigo? Mas o problema, caro espectador anónimo, é que não é consigo. Só passa a ser consigo por causa do programa, que, desta forma, constrói uma realidade, diferente e alternativa, para que seja consigo, e, depois, se baseia nessa realidade irreal, por assim dizer, para tirar conclusões das situações criadas e das imagens recolhidas. No jornalismo, é lícito, em muitos casos, reportar uma realidade que só se pode captar através de tecnologia não visível. Um exemplo é o recurso a gravações com câmara oculta. ESe Fosse Consigo? faz uma coisa bem diferente. Na lógica dos apanhados, cria um agente provocador, e reporta uma realidade que apenas existe devido à sua acção. Apresentar isto como um produto de informação, e repeti-lo, inclusivamente, no canal que promete “informação e nada mais” (refirome à SIC Notícias) é estabelecer uma espécie de pacto com o Diabo, pouco habitual em Carnaxide, e com consequências imprevisíveis. É claro: as audiências correspondem. Na estreia desta série, E Se Fosse Consigo? ficou à frente das novelas Paixão e Ouro Verde. No fundo, estamos perante uma boa ideia e um bom conteúdo, mas que, simplesmente, não é de informação. Reconhecer que Conceição Lino e este programa fazem parte do entretenimento do canal seria uma forma mais transparente de integrar o formato na tradição e no ADN da SIC, que tem uma incompatibilidade histórica com formatos híbridos entre programação e informação.