TV Guia

“Sempre fui INSEGURA”

A Idade Não Me Define. Este foi o título que Helena Isabel decidiu dar ao seu primeiro livro, que acaba de lançar através da Manuscrito. À TV Guia, apesar da timidez, fala de amor, de política e da relação com o filho, Agir

- Helena Isabel uma das melhores actrizes portuguesa­s I FOTOS LILIANA PEREIRA TEXTO JOÃO BÉNARD GARCIA

Na apresentaç­ão do seu livro, revelou queé tímida e insegura. Explique-nos comoé que é possível? Sou, disfarço é muito bem. Tímida, sempre fui, mas arranjei mecanismos para ultrapassa­ratimidez. Também sempre fui uma pessoa insegura, hoje menos do que no passado. Uma das coisas boas que a idade me trouxe foi sentir mais confiança em mime não ter a preocupaçã­o de querer agradara toda a gente.

Mas, com o avançar da idade, a vida e as experiênci­as, consegue explicar as razões dessa timidez?

A timidez já percepcion­ei que é uma questão de feitio. Sou aparenteme­nte extroverti­da, mas sou uma pessoa reservada em relação aos meus pensamento­s, sentimento­s, em relação à minha vida interior. Faço amizades com facilidade, mas, no que diz respeito a abrir-me, se calhar, é mais complicado. E em relação à inseguranç­a?

Quando somos jovens, temos uma enorme necessidad­e de aprovação, quer pessoal, quer profission­almente ... medo de não sermos capazes.

Mais ainda entrando numa profissão que à época não era bem vista. Claro, claro. Costumo dizer, pelo que observo, que a tim ide zé um adas caracterís­ticas dos actores.

Conhece muitos?

Sim, conheço. E acho que representa­r é uma forma de vencer a timidez. O fazer de outras pessoas ajuda muito a vencer a timidez. É uma personagem, não somos nós. Isso ajuda a vencer medos e a saltar barreiras, como a da timidez. Uma espécie de terapia.

Sim, para pessoas mais reservadas ou tímidas... para ultrapassa­r problemas pessoais.

Não foi o seu caso. Aconteceu naturalmen­te.

Aconteceu. Não era uma pessoa com grandes problemas. Foi uma paixão porque os meus pais sem preme levaram a ver teatro desde jovem e comecei, de repente, a querer estar do outro lado.

E o seu pai chegou a ser sócio numa companhia do Vasco Morgado. Foi. E de repente comecei a querer estar em cima do palco e não me satisfazia ficar só na plateia.

Na altura, era uma jovem com algum jeito ou queria e empenhava-se a sério para ser actriz? Não, tinha mesmo vontade de ser actriz. Lembro-me de que a minha mãe me dizia em pequena que eu era apalhaça lá de casa.

Vejam só, a tímida e reservada era apalhaça lá de casa.

[Risos] É verdade, em casa era outra pessoa. Passava o tempo afazer imitaçõesd­os cantores da época, fazia pequenos teatros lá em casaco mos amigos e como meu primo. Sempre tive um temperamen­to artístico, muito ligado às artes. Comecei por fazer ballet e depois o teatro foi uma decisão pessoal. Queria ter uma profissão ligada às artes. E teve a felicidade de ter uns pais que a apoiaram incondicio­nalmente. Também.

Escreve no livro que era gordinha em criança e adolescent­e. Se calhar uma das causas para ser mais reservada e insegura... Mas olhe que não tinha muita consciênci­a disso nessa altura.

Ainda não havia a pressão da magreza que há hoje, nem o bullying na escola. Não, não havia essa pressão para ter as medidas certas, que tem tudo menos serem certas, mas lembro-mede que, quando me estreei no teatro, as pessoas me diziam :“Ai, que pena, tem uma cara tão bonita, que pena estar tão gordi-

nha.” Acho que foi mesmo aí que tomei consciênci­a de que, se calhar, devia emagrecer unsq ui linhos. Eu não era obesa, de forma nenhuma. Era cheiinha.

E de repente perdeu 15 quilos.

E fiquei um palito. Mas não nos podemos esquecer de que, naquela época, o meu ídolo na moda era a Twiggy [a supermodel­o britânica Lesley Lawson]. O meu e de toda a juventude daquela época.

Quando começou a sua carreira, tinha objectivos concretos ou mesmo a noção para onde ia ou onde poderia chegar, quer no teatro, quer na televisão? O meu único objectivo quando me estreei no teatro era só ode ser actriz. Não queria ser conhecida, não queria aparecerem revistas, só queria representa­r. Era um bocadinho diferente do sonho dos artistas adolescent­es que aparecem hoje em dia–querem quase todos aparecerna televisão e serem conhecidos. O que me movia era ser actriz e representa­r. Depois, ao longo dos anos, com o aparecimen­to das novela sedas publicaçõe­s sobre televisão, e pelo facto de os actor esse terem tornado famosos, a notoriedad­e veio por acréscimo, não foi nada que tivesse procurado.

Sentiu-se alguma vez injustiçad­a por ser capa de revista? Houve algumas capas que me deixaram magoada. Mas também não me posso queixar muito porque nunca expus a minha vida, e fui sempre poupada. Sei que quanto mais expusermos a nossa vida mais somo salvo de notícias. Sempre fui reservada, mas não escapei de ter duas capas a explorar a minha vida privada.

AMILITÂNCI­A NO PCP

Quando se divorciou em 1999, de Paulo de Carvalho, fez capa de revista?

Não, nessa altura, não. Eu e o Paulo conseguimo­s resguardar esse facto da nossa vida privada. Só um ano depois é que se soube. É a prova de que, quando

as pessoas não querem efectivame­nte aparecer, não aparecem.

Em 1974, é apanhada de supetão pela Revolução. Já estava no teatro. Esteve na base da fundação do Teatro Ádóque. Sente que foi usada numa estratégia de propaganda político-cultural ligada à esquerda? Não fui em onda política nenhuma. Militou no PCP? Sim, chegueiami­litar no Partido Comunista, mas foi tudoporque­erauma descoberta para mim. Vivia num País onde eu achava que havia imensas injustiças sociais, ainda hoje há, e foi o resultado lógico. Já era artista antes do 25 de Abril, as coisas já eram faladas, debatidas, sentíamos a censura, embora ainda não tivesse uma consciênci­a política apurada, mas estava atenta. Ficava muito revoltada quando um texto de teatro era censurado porque achava que todas as coisasdevi­am ser ditas e devia haver liberdade. A seguira o 25 de Abril, to meias dores revolucion­árias, como qualquer jovem da época.

Hoje, é uma mulher de esquerda? Sim, com valores sociais de esquerda, porque as injustiças continuam a existir. Vêem-se grandes disparidad­es de ordenados e de fortunas. Não sou contra a iniciativa privada e defendo uma sociedade mais justa e com mais oportunida­des para todos. Acima de tudo, é tudo uma questão de oportunida­des. Quem for bom, aproveita-as.

Entre 1974 e 1983, ano em que se casou, foi muito namoradeir­a?

Sim, fui alguma coisa [risos]. Não gosto muito de falar no meu passado. Mas amou muito e foi muito amada? Sim, acho que sim. Não consigo fazer esse balanço. Vivo o dia de hoje e não sou agarrada ao passado. Talvez seja esse o segredo para me sentir jovial.

“TENHO A CERTEZA DE QUE SEREI AVÓ”

Assim que se abre o seu livro, a primeira coisa que se lê é a dedicatóri­a: ‘Aos meus futuros netos’…

Sou aquariana. Os aquarianos estão sempre a ver mais à frente.

Tem um grande desejo de ser avó? Não é um desejo assim tão grande. Tenho quase a certeza de que os vou ter e por isso quero deixar-lhes uma recordação. O primeiro não está já encomendad­o? Não, ainda não. Mas falo nos meus netos porque não sei se terei tempo para lhes contar o meu percurso e aqui loque vivi. Deixo no livro um testemunho para eles conhecerem a avó. O Bernardo[ o cantor Agir] é filho único e percebe-se que têm uma paixão mútua. Comoéa vossa relação?

É de grande cumplicida­de, mas ao mesmo tempo de grande independên­cia. Adoramo-nos, sabemos que gostamos muito um do outro, mas respeitamo­s muito avida individual de cada um.

Não sou o tipo de mãe que está sempre a telefonar ou a aparecer, e ele também não. Podemos estar três dias sem nos falarmos,mas sabemos que estamos lá um para o outro.

Imagino que apoie a carreira do Bernardo enquanto Agir.

Sim, e estou muito orgulhosa do que tem feito até aqui.

Custa-lhe ver cada tatuagem que ele fez e cada piercing ou furo novo? Ao princípio custava-me. Não gosto de tatuagens, embora tenha uma rosa tatuada na omoplata desde os 40 anos. Não tenho nada contra as tatuagens. Hoje em dia, até acho piada, agora não é precisos eremt antas. Aceito,éa maneira de e lese manifestar como artista, não tenho nada contra.

Alguma vez lhe disse: “Bernardo, são muitas!’?

Como boa mãe, tentei avisá-lo. Sobretudo quando ele começou a fazê-las e aquilo começou a tomar um rumo que, para mim, era demais e disse-lhe: “Ó Bernardo, se calhar vaiste arrepender” e ele disse-mequedaqui aunsanosha­verá muitos velhos tatuados. Desisti e passei a respeitar a sua individual­idade. Era adulto quando começou a fazer tatuagens, não foiumacois­ade criança. ●

“Lembro-me de que, quando me estreei no teatro, as pessoas me diziam: ‘Tem uma cara tão bonita, que pena estar tão gordinha’”

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“A seguir ao 25 de Abril, senti as dores revolucion­árias. Sou uma mulher com valores de esquerda”, diz.

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