CALDO AVINAGRADO
Não sei nada daquilo que se passou com Cristiano Ronaldo, há nove anos, numa qualquer noite de Las Vegas. Não sei nada sobre a senhora que lhe aponta o dedo. Não sei nada sobre o candidato do PT à presidência do Brasil. Nada sei sobre o outro, apontado a dedo como fascista. Não sei nada sobre Tancos, tal é a confusão gerada pelas posturas ditas oficiais. Não sei se André Ventura é a tão temida extrema-direita que está a chegar. Não sei se não é.
Sei aquilo que leio e vejo. Sobretudo nas redes sociais. Abunda a fé. A razão, esse primado da inteligência humana, está submersa por uma autêntica onda teológica de crenças, dogmas, superstições que explodem em ódios, ressabiamentos, despeitos, revelando gente sem esperança, sem outra coisa que não seja a necessidade de acreditar num dos lados onde se aconchegue, medroso de tantas verdades mentirosas. As redes sociais não são más porque nelas lemos, e vemos, palavras ordinárias, frases ainda mais reles, porque o insulto tem rédea solta. Pelo contrário. São uma poderosa fonte de liberdade. De expressão livre do pensar. Aquilo que de verdadeiramente mau ali se encontra é a devolução da imagem do país que somos, da gente que somos. Mais parece o tempo medieval, augurando vinganças, possuídos pelo medo, tribalizando emoções, encarquilhando-se em iras e pesporrências, sem vigilância crítica, sem respeito pela dignidade humana, comandados pela ideia de culpa.
Apontei os três psicodramas que dominavam as discussões, no dia em que me dediquei a apreciar os assuntos dominantes no caudal de notícias. No que respeita a Ronaldo, está assente. O nosso maior herói está inocente. É mais uma vítima que, terminada a corrente proposta pela D. Dolores Aveiro, acabará em canonização. No que respeita a Bolsonaro, a culpa é do povo estúpido que o vai eleger. Ou dito de outro modo, por um povo inculto que não compreende os grandes e nobres ideais dos seus opositores. No que respeita a André Ventura, a culpa é do próprio porque diz coisas e reclama um partido que proponha coisas que os outros não propõem. Não sei nada. E recordo Antero de Quental e a sua célebre Conferência do Casino, 150 anos depois. Temos ainda tanto caminho para andar, Santo Deus! ●