O voto em BOLSONARO
Olhar o Brasil com olhos europeus descaminha sempre para a explicação fácil e para interpretações que têm mais a ver com as nossas preocupações do que com a concreta realidade brasileira. Vejo e leio o beatério nacional, peitos empanturrados de lições democráticas, a dissertar sobre a bestialidade de Bolsonaro, sobre a bondade de Haddad, e percebe-se que se lhe escapa a essência do problema.
Estava no Brasil quando Lula ganhou pela primeira vez a presidência da república. Assisti a dois comícios de PT, aliás, as duas únicas vezes que vi o velho sindicalista prometendo duas coisas que eram, na altura, essenciais: combater a corrupção e afrontar, de vez, a pobreza. A corrupção que era, e continua a ser, parte do sangue do poder. Seja ele qual for. Do ministro ao polícia, do funcionário ao administrador. Lula teve vitórias sobre a pobreza. Não ganhou a guerra mas libertou alguns milhões dos limites da sobrevivência. Porém, o PT caiu no natural rio corrupto que determina a marcha do poder brasileiro. O mesmo rio onde vai acabar Bolsonaro. A revolta contra o PT nasce aí. O farol de esperança que se deixou prostituir. Porém, não é este o cerne do problema brasileiro. Basta consultar o Atlas da Violência. Nos últimos 11 anos, foram assassinadas no Brasil 553 mil pessoas. Em 2016, foram assassinadas 62 mil. No conjunto da última década, foram assassinados 324 967 jovens com idades compreendidas entre os 15 e os 29 anos. Isto é, sete vezes mais mortos do que soldados americanos no Vietname, numa guerra que durou cerca de 20 anos. O índice de mortalidade violenta no Brasil é 30 vezes superior à média dos homicídios no espaço europeu e o mais de meio milhão de vítimas ultrapassa, em número de mortos, aqueles que na Síria combatem em guerra aberta.
É neste contexto de violência excessiva, brutal, que Bolsonaro viu o alicerce para a sua campanha. Responder ao medo com palavras de ordem e armas na mão. Com frases tão assertivas como “prefiro ter as prisões cheias de bandidos do que cemitérios cheios de vítimas.” Este é o segredo da vitória de um homem menor, de um político medíocre contra as ignorantes elites brasileiras. E já agora contra as portuguesas. ●