OS NOVOS HERÓIS NACIONAIS
E, de repente, os pivôs dos jornais televisivos tornaram-se os novos heróis nacionais. Com uma pandemia fora de controlo e o medo instalado entre as populações, os jornalistas/apresentadores dos principais noticiários das estações humanizaram a relação com o espectador, tornando-se a mais íntima, como que de “mão dada”. O jornalismo de proximidade tomou conta dos blocos de informação de horário nobre e transformou os rostos destes espaços em “alguém lá de casa”. O jornalismo deu lugar, grosso modo, ao infotainment. E não vem daí mal ao mundo. Pelo contrário, pelo menos para já e com as devidas proporções. Senão vejamos: se é um prazer o espetador, lá em casa, encontrar diaramente um comunicador
(vamos chamar assim, neste caso, ao jornalista/pivô) que ele conhece perfeitamente, que sente que está
“no mesmo barco da pandemia”, e receber um boa noite em jeito de mensagem de esperança, depois ouvir todas informações do que se passa em Portugal e – dependendo de canal para canal – mais ou menos no mundo, e no final, receber um “até amanhã” mais uma vez com uma mensagem poética de esperança, há que perceber onde e como começa e acaba a intimidade e a proximidade para dar lugar àquilo que interessa no caso: a informação crua. Em momentos de crise não é fácil fazer esta distinção. Estamos a lidar com o plano dos afetos, da necessidade de conforto – mesmo que seja de alguém que se conhece e é nosso íntimo apenas por entrar em casa, todos os dias, pelo ecrã. Estamos a falar do estranho que se torna família e que, à partida, traz mais informação do que aquela de que dispomos. Infotainment (informação e entretenimento, num termo anglo-saxónico) pode ser uma benesse
– assim seja transmitida e compreendida como tal. Sim, a informação pode ser feitas de afetos, de mimo, de “estamos juntos nisto”, desde que não perca a isenção. Desde que não troque a objetividade pela mão na cabeça ou pelo espalhar da teoria do caos.
Se os limites forem respeitados, se toda a gente souber “ao que está ali” e como a realidade é divulgada de forma verdadeira, então valem todas as poesias no final dos noticiários, vale até a lágrima no olho e o apelo a que a população cumpra as regras. São “truques” que só pode trazer bons resultados. Mas que isso não se confunda com populismo.
Senão, estragámos isto tudo.