Escreve esta semana na TV Guia A EMPATIA
Aexperiência recente e totalmente inesperada que foi (e ainda é) esta pandemia fez-me acreditar que a empatia entre as pessoas iria aumentar, que iria resgatar em cada um de nós o que há de mais humano, no melhor dos sentidos: a entreajuda e a solidariedade. E, a certa altura, senti que isso seria mesmo possível, no meio do caos, da incerteza, da insegurança e do medo. Com vários setores cancelados, de um dia para o outro (como foi, e é, o caso da Cultura), assistimos a um degradar da dignidade humana e à exposição de uma série de fragilidades do próprio “sistema”. Tal fez surgir uma série de movimentos solidários quase espontâneos, mas fundamentais. Entre eles, destaco a União Audiovisual, que continua a apoiar muitos profissionais do setor da Cultura e audiovisual (ainda em condições muito complicadas). O Palco 13, companhia de teatro de cascais que criou uma plataforma de ajuda, através da entrega de cabazes também a profissionais do setor da Cultura, com o trabalho voluntário dos elementos da companhia, outras vítimas do cancelamento da atividade. Vi claques de futebol, tantas vezes rotuladas como o esgoto da sociedade, a apoiar os profissionais de saúde, e outras pessoas em situação precária, de forma voluntária. E o projeto Cama Solidária tornou-se numa das maiores esperanças na humanidade, que tive nos últimos anos. Tudo começou com o Ricardo Paiágua, que se lembrou de apoiar os nossos profissionais de saúde ao colocar várias autocaravanas, perto dos hospitais, para os profissionais que estavam no combate à Covid poderem descansar, já que muitos não podiam sequer ir a casa. Conseguiu mobilizar centenas de voluntários pelo País. Arranjaram também alimentos, produtos de higiene, mensagens de apoio a todos esses profissionais. Tive a oportunidade de acompanhar de perto, de tentar ajudar, e vi o que um grupo unido de voluntários conseguiu fazer. Jovens misturados com malta mais velha, todos a remar para o mesmo lado. Estas demonstrações de empatia deram-me esperança, mas contrastam com a polarização de posições, a divisão de grupos em trincheiras, o insulto fácil pela diferença de opinião, que ganha proporções vergonhosas nas redes sociais. Já me deixei levar por essa via, mas rapidamente resgatei as minhas memórias, em que boas discussões, entre pessoas com opiniões diferentes, se tornavam enriquecedoras. Prefiro trabalhar no sentido da empatia, até para deixar um “ar” mais puro para as minhas filhas e gerações vindouras.