O CARRO do ministro
Oacidente mortal provocado há largos meses pela viatura que conduzia o ministro Eduardo Cabrita está transformado num pedaço do anedotário nacional. A fazer fé nas últimas notícias, em que se procura provar que o inditoso trabalhador do Escoural não estava a trabalhar aquando da sua morte é daquelas hipóteses que são tão ridículas como perniciosas. Teria atravessado a autoestrada para aliviar a tripa. Logo, não estava a trabalhar. Se for este o encaminhamento do processo, só tem um significado: quem investiga procura por todos os meios ilibar o veículo que provocou a morte do homem, baseando-se na proibição que existe para peões atravessarem vias desta natureza. Tudo isto é ridículo. Em primeiro lugar, porque não era o ministro Eduardo Cabrita que conduzia a viatura. Mesmo que tivesse pedido ao motorista para seguir em marcha acelerada, não foi uma ordem ilegal. Em segundo lugar, porque o dever de cuidado, sobretudo em alta velocidade, é de quem conduz e não de quem é conduzido, incluindo a sinalização da marcha com sirene e pirilampos.
De onde se conclui que Eduardo Cabrita não precisa de defesa. Dito isto, muita gente fica perplexa com a necessidade de segredo de justiça neste caso quando se sabe que este instrumento jurídico é exceção e não regra na tramitação processual. E bem se sabe, quando é mesmo necessário, como rapidamente se torna prostituto, fazendo manchetes, os assuntos que supostamente se queriam guardar.
O que devia estar a ser discutido era a natureza do acidente. Se foi uma causa inesperada e súbita que motivou a morte do trabalhador, se houve negligência grosseira da parte do condutor que admita a possibilidade de estarmos perante um homicídio por negligência. Quando o poder judicial quer ser mais papista do que o Papa, vulgarmente não produz justiça, apenas cumplicidade e encobrimento. Esperemos que não seja esse o caso.