SABER OLHAR
Cruzo-me, bastantes vezes, com vários tipos de pessoas que, invariavelmente, se revelam como um tipo, ou género, de espectadora ou espectador. O enamoramento pelo ser humano que à minha frente se apresenta, passa inevitavelmente por aquilo que anda a ver, a ler, a ouvir ou aquilo que revela gostar ou ser fã. Será um sintoma, talvez, semelhante ao de Woody Allen quando revela, na sua biografia, que em criança e adolescente odiava ler. Ler era um tormento, até ao dia em que percebeu que a leitura lhe dava melhores e mais certeiras armas na altura de conhecer uma mulher por quem se sentia atraído. No final, tudo se resume a um dos pilares mais vezes esquecido da nossa sociedade: a educação: que espectadores, que leitores, que melómanos, que amantes do teatro, do cinema, da pintura, da música estamos a plantar, cuidar, ou ver crescer nas nossas escolas? Serão as escolas de hoje (tão ultrapassadas como as de há 20 anos, na sua ideia de enclausurar crianças em salas para saberem de cor um texto, ou a tabuada) as mais certas para fazer nascer os artistas de que precisamos, e os seus admiradores devotos? Saiba a leitora, ou o leitor, que vive num País que conta com um plano nacional de leitura, lecionado nessas mesmas escolas, que tem parentes iguais noutras artes, como o plano nacional de cinema que, infelizmente, raramente se vê ser passado para as alunas e alunos, a não ser, talvez, por algum professor que seja mais “fora da caixa”. Que triste caixa esta onde reina a norma. Poderá ser impressão minha, mas as visitas de estudo das escolas, limitam-se 90 por cento das vezes a museus convencionais, e não a espectáculos de teatro, concertos ou mesmo idas em grupo ao cinema, para que se fomente a discussão crítica sobre um produto artístico. Espantamo-nos pois que nos famigerados rankings, que de maneira vampiresca pairam sobre as decisões educativas neste e noutros países, haja depois pouco apreço pela leitura, pela música, pela arte. “Ajuda-me a olhar!”, escrevia Eduardo Galeano, no conto do menino que, perante o assombro do mar, olhado pela primeira vez, se agarrava ao pai, pedindo-lhe sôfrego que acalmasse os olhos cheios de magia. Saibamos aprender a olhar.