Amor com acidez
Por detrás desta mancha enorme de crimes as mulheres são as principais vítimas e os filhos menores. Se este número gira em volta dos 30 mil casos, por que não se fala disto?
Os números da criminalidade, referentes a 2023, foram conhecidos esta semana e não enganam – a violência doméstica continua a liderar, com larga folga, os restantes crimes registados. Cerca de trinta mil participações. Se tivermos em linha de conta de que este crime, por múltiplos motivos, tem tendência a ficar escondido nas cifras negras (crimes ocorridos mas não denunciados), que nele se integram vinte por cento dos homicídios ocorridos no País; se quisermos supor que por detrás desta mancha enorme de crimes as mulheres são as principais vítimas e os filhos menores, que testemunham a brutalidade, alarga o número de vítimas, se este número de crimes que ano após ano giram em volta dos trinta mil casos, por que não se fala disto? Acabamos de viver a mais prolongada campanha eleitoral da nossa democracia, com debates a metro, com discussões a eito, com verdadeiras rixas verbais, qual a razão do silêncio para que a violência doméstica esteja fora da agenda política? Quantos mais cadáveres são necessários para que este tema preocupe a classe política?
Uma sugestão a Luís Montenegro, agora que se prepara para apresentar o seu programa de governo à Assembleia da República. Que mobilize o ministério da Educação, o ministério da Segurança Social, o ministério da Administração Interna e o da Justiça para formarem uma equipa interdisciplinar que, de uma vez por todas, provoque uma das reformas essenciais da nossa vida comunitária com a procura de uma fórmula que faça regredir este flagelo nacional. Que use a aprendizagem da cidadania, da igualdade de género para que as nossas crianças, desde cedo, saibam usufruir, com dignidade, os seus direitos humanos, que utilize a informação da segurança social para identificar os grupos de risco, que recorra à segurança interna para descobrir uma geografia de risco e, finalmente, com toda esta informação possa refletir sobre os destinos da justiça sobre o melhor tratamento judiciário para fazer regredir este inferno. É uma batalha difícil, porém é daquelas que vale a pena viver em nome da paz social, da decência social, reforçando a cultura humanista que este país subdesenvolvido necessita como de pão para a boca.
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É uma batalha que vale a pena viver em nome da paz social