A DOR DO ESQUECIMENTO
Assim é o ciclo da vida: somos cuidados e temos alguém que zela pela nossa saúde durante uma parte da nossa existência. Mas há casos em que, a determinada altura, os papéis invertem-se. Estas são as histórias dramáticas de quatro estrelas queridas do público
Em outubro do ano passado, tornou-se público o débil estado de saúde do pai de Tony Carreira, que foi internado para uma cirurgia a um tumor e da qual resultaram algumas complicações que o levaram a ficar quase um mês hospitalizado. Nessa altura, além de temer pela vida do progenitor, viu-se a braços com outro problema: a mãe, de 82 anos. Maria Pereira Mateus sofre de demência e, segundo nos conta uma fonte próxima da família, já não reconhece alguns familiares, entre eles o cantor. “Ela da parte física até está bem. O pior é mesmo a cabeça. Já não conhece ninguém, coitada; o marido, sim, que é o seu grande apoio, mas os filhos, às vezes não se lembra bem quem é quem. E os netos igual. Sabe que são pessoas que lhe são queridas, apenas”, conta. Uma vez que Albano Antunes, de 86 anos, é, desde que a situação da mulher se deteriorou, quem tem cuidado dela, Tony ficou extremamente preocupado quando o pai teve de ser internado. “Foram dias complicados para a família. Apesar de a senhora estar muito bem entregue, e ter os cuidados dos filhos, o marido é que trata de tudo”, acrescenta a nossa fonte. Muito ligado aos progenitores, principalmente depois de ele próprio ter sido pai, Tony sofre em silêncio com o envelhecimento deles, apesar de se dar como feliz por ainda ter ambos vivos. “Custa-lhe muito lidar com as perdas. O Tony, apesar de tentar não mostrar, é um homem muito sensível. E ver a mãe debilitada transtorna-o.” Afinal de contas, aquela mulher que o criou e que tanto lhe ensinou é agora quem precisa de cuidados. O “cantor dos sonhos” nunca falou abertamente sobre este drama, mais um a juntar ao sofrimento que lhe assola a alma devido à morte prematura da filha, Sara, em dezembro de 2020.
Numa entrevista intimista concedida a Daniel Oliveira no estúdio do programa das tardes da SIC, a apresentadora falou, entre outras coisas, no papel de cuidadora da mãe, Áurea Pinheiro, que sofreu um AVC severo em 2019. “A minha mãe, hoje, tem uma condição muito frágil e tenho de estar com ela o máximo de tempo que posso e depois vir para aqui [SIC]. Às vezes, fico um bocadinho ‘apertada’ cá dentro. Tenho de me ir embora e percebo que ela gostava que eu ficasse mais tempo”, confessou. Segundo a apresentadora, os papéis de mãe e filha foram invertidos. “Sou cuidadora da minha mãe, sou responsável por ela, que é uma situação que a vida nos deve preparar. Mas quando chega é sempre muito difícil. Ela agora é minha filha e eu sou a mãe dela, é ao contrário. Não que na balança da nossa relação isso se sinta dessa forma. A minha mãe é uma senhora e tinha dado um belo general num exército qualquer. Percebo que ela queria mais tempo comigo e não temos”, confidenciou em seguida. “Tem 85 anos e marcou-me muito ao longo da vida. Mas agora isto de ser eu a tomar conta dela é muito estranho. Ela tomava sempre conta de mim. Era autoritária, muito disciplinadora. Hoje sou que, às vezes, tenho de ser disciplinadora e um bocadinho autoritária. Custa-me muito, não é aquilo que nós achamos que vai ser”, disse ainda. Na última edição dos prémios As Mulheres Mais Influentes de Portugal, Júlia Pinheiro referiu ainda: “A minha mãe deixa-me um legado imenso de liberdade. Foi empresária a vida toda. Ensinou-me que, de forma nenhuma se pode depender de ninguém a não ser de nós próprios, temos de encontrar o nosso trabalho, o nosso caminho. Foi muito disciplinadora a vida toda. Ainda hoje é uma inspiração para mim, sendo que hoje eu sou a mãe e ela é a filha”.
Sabendo bem aquilo que Sílvia Alberto tem passado devido ao estado de saúde da mãe, Júlia Pinheiro recebeu-a no seu programa da SIC, para dar a conhecer ao público o lado mais íntimo da apresentadora da RTP. Sílvia, que tem dois filhos, Pedro, de 5 anos, e Emília, de 2, é cuidadora da mãe, juntamente com a sua irmã, há mais de 15 anos. “A razão pela qual o Pedro tem uma irmã – que se chama Emília em homenagem à minha mãe – é justamente porque prezo muito ter uma irmã, nos bons momentos e nos mais difíceis em que só ela é que me compreende. Tem sido um braço muito importante. Quando uma de nós vai abaixo e se fragiliza, a outra está lá para levantar”, contou. “Tinha 25 anos, ainda estava na faculdade, quando a minha mãe foi diagnosticada com Alzheimer. Foi um diagnóstico muito penoso para nós. Faltou-nos muito, na altura, saber o que fazer, como atuar bem”, acrescentou ainda. “As fases são difíceis de aceitar. Há pessoas que convivem com Alzheimer galopante e perdem os seus entes queridos num curto espaço de tempo. E há quem, como nós, que tivemos a possibilidade de dar e, claro, auxiliar, a minha mãe durante dez anos muito felizes com ligeiras alterações de memória. Houve qualidade de vida durante esse período. Posso dizer que fizemos o melhor que podíamos como filhas. Estamos agora numa fase mais difícil, nos últimos cinco anos houve uma degradação substancial, a covid-19 não ajudou nada.”
Padecendo de Alzheimer profundo, Maria Pestana de Adalgisa Alencastre Telo já não conhece a filha, Alexandra. Com a mãe a viver consigo, a atriz tornou-se a sua cuidadora e explica como é este seu novo e tão importante papel: “É bonito, é triste, às vezes é muito compensador, mas durmo de consciência bastante tranquila por tê-la ao pé de mim, e vai ser assim enquanto tiver força. Ela chama-me mãe muitas vezes, portanto, acho que na cabeça dela o papel também se inverteu. Sou, de facto, uma cuidadora, mas a minha mãe é um amor. Não conheço ninguém que não tenha gostado dela ao longo da vida”. Apesar das dificuldades, Alexandra Lencastre consegue conciliar a carreira com este cuidado que presta à mãe. “Faço-o tal como se gere ter filhos e trabalhar ao mesmo tempo: com sensatez, às vezes com algum distanciamento e com o nosso coração, obviamente. Tem de haver muita emoção e dedicação, temos de nos anular muitas vezes, como fazemos pelos nossos filhos. E quando uma pessoa está tão fragilizada com uma doença assim, perde o contacto com a realidade, perde prazeres e qualidade de vida. Às vezes pequenos prazeres, como desenhar, pintar, mexer. Ela tem uma idade mental para aí de 3 anos”, revela a diva das novelas, partilhando todos os pormenores sobre a fragilidade da mãe sempre com enorme ternura. “O nome Alexandra Lencastre diz-lhe qualquer coisa. Sabe, por exemplo, o nome dos pais, faço-a escrever o nome dela e os nossos nomes. E como sempre foi um doce de pessoa, é um doce de doente. Não é rabugenta, não é exigente, torna tudo mais fácil e mais querido”, diz, acrescentando: “Temos de amar os nossos até ao fim”.