Um ícone de nome Frida
Quando a minha filha mais nova tinha dois anos, mascarei-a com uma bandolete de flores na cabeça, sobrancelhas carregadas e unidas ao meio, bâton vermelho e lenço étnico pelas costas. Apesar dos caracóis louros que nem tentei disfarçar, todos os que olhavam para ela identificavam de imediato na criança a figura inconfundível de Frida Kahlo.
Frida tornou-se maior do que a sua arte e a sua obra: entrou para o leque restrito dos pintores reconhecidos em todo o mundo, a par de Dalí ou de Picasso, com uma imagem tão forte como os seus quadros. As razões pelas quais uma artista mexicana se impôs num mundo das artes ainda dominado por homens e se tornou um ícone são várias. E, como sempre, não são alheias à sua extraordinária história de vida. Não foi apenas o talento que a catapultou para este estatuto, foi sobretudo a sua personalidade irreverente e corajosa.
Teve poliomielite em criança e, em adolescente, foi vítima de um grave acidente de autocarro que lhe perfurou o abdómen e o útero, causou graves problemas de coluna e lhe esmagou um pé. Passou meses em camas de hospital, teve de reaprender a andar. A dor marcou pois a sua vida desde cedo e acompanhou-a até ao fim como condição inseparável. Há quem faça disso um fardo condicionante, Frida trabalhou-a como tema, ao abordar o sofrimento, o corpo humano, a vida e a morte, a saúde mental, a identidade. Recusou sempre o epíteto de surrealista, porque dizia que nunca pintava sonhos, apenas a sua realidade. Sofrida e excêntrica.
As questões de género estiveram nela presentes avant la lettre. Era bissexual, praticava boxe, fazia concursos de tequila e tanto se apresentava com vestidos ultrafemininos como com roupa de homem e um bigode que não depilava. Provocadora, não se deixava condicionar por convenções sociais e jogava com a identidade a bel-prazer. A sua forma de estar inspirou várias minorias. Desde logo, tornou-se símbolo tanto do feminismo como da diversidade sexual, mas também de empoderamento das pessoas com deficiência e das culturas indígenas.
Nesta edição, traçamos um perfil de uma vida curta mas intensa, que mergulha em todas estas características de uma personalidade multifacetada. Uma leitura nada menos do que intensa.
BIOGRAFIA FRIDA KAHLO