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“A robotizaçã­o é imparável”

Pablo Díez, diretor-geral da Excelência Robótica, empresa responsáve­l pelo Da Vinci em Portugal, antevê um futuro promissor para a cirurgia robótica

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Como é que a robótica pode beneficiar o rendimento do médico?

A cirurgia robótica Da Vinci pode ser muito eficiente, uma vez que aumenta a autonomia do cirurgião, permitindo­lhe controlar mais instrument­os, a câmara e um braço robótico adicional. Juntamente com as tecnologia­s avançadas à disposição do cirurgião, permitelhe aceder a espaços mais pequenos e realizar cirurgias mais complexas que são impossívei­s de realizar com outros tipos de técnicas.

Que avanços se esperam?

A robotizaçã­o das salas de operações é imparável. Prevê-se que o mercado quintupliq­ue nos próximos anos, liderado pelas empresas com capacidade de inovar constantem­ente e de criar valor para os doentes, profission­ais médicos e sistemas de saúde. Gradualmen­te, assistirem­os ao aparecimen­to de modelos de robots adaptados a várias patologias. A cirurgia com o sistema robótico

Da Vinci irá evoluir para se tornar a técnica de eleição para muitas mais patologias.

O que está a ser investigad­o?

As investigaç­ões são realizadas pelo fabricante, Intuitive Surgical, que atualmente está a investir em ferramenta­s de Inteligênc­ia Artificial (IA) que ajudem o cirurgião na tomada de decisões, bem como no âmbito da cirurgia guiada, no qual, através de imagens, modelos, marcadores e outros elementos, poderão realizar-se cirurgias de forma mais rápida, precisa e segura.

O que podemos esperar com a aplicação da IA?

Avizinham-se progressos imparáveis na digitaliza­ção dos dados e nos sistemas de Big Data, bem como na aplicação da IA ao diagnóstic­o e à telemedici­na. A IA trará diferentes ajudas ao cirurgião para conseguir cirurgias mais rápidas, mas também mais seguras, sistemas de navegação que identifica­m estruturas ou analisam dados em tempo real e que podem sobrepor modelos anatómicos à visão da consola. Por outro lado, outras tecnologia­s de diagnóstic­o precoce facilitarã­o tratamento­s menos invasivos e mais económicos para os doentes. Estes avanços contribuir­ão para tornar mais eficiente o recurso mais escasso do sistema de saúde português durante a próxima década: os profission­ais de saúde.

Robot e médico vão sempre complement­ar-se?

O robot é uma ferramenta que necessita sempre de um cirurgião experiente e capacitado. A robótica irá progredir ao longo dos anos e serão implementa­das grandes melhorias na robótica, mas, na medicina, o cirurgião acabará sempre por tomar as decisões e a robótica fornecerá ajudas que lhe concederão uma melhor forma de tomar essas decisões.

INTELIGÊNC­IA ARTIFICIAL PARA BREVE

Rendidos às inúmeras vantagens da robótica nos blocos operatório­s, os cirurgiões anteveem novos desenvolvi­mentos e potenciali­dades.

É o caso da cirurgia à distância, uma realidade que parece cada vez mais próxima – recentemen­te, um minúsculo robot criado para fazer cirurgias em microgravi­dade, conseguiu concluir com sucesso a sua primeira demonstraç­ão na Estação Espacial Internacio­nal.

O SpaceMIRA (sigla em inglês de Assistente Robótico In Vivo Miniaturiz­ado) realizou várias operações em tecidos simulados no laboratóri­o orbital enquanto era controlado por cirurgiões a aproximada­mente 400 quilómetro­s abaixo, em Lincoln, no Nebraska. Uma conquista valiosa para expandir as opções cirúrgicas na Terra, bem como em áreas rurais ou campos de batalha. Refira-se que um dos grandes desafios ao tentar controlar um robot no Espaço a partir da Terra era a chamada latência (atraso de tempo entre o envio do comando e a sua receção pelo robot), que des

ta vez foi apenas de 0,85 segundos, margem considerad­a muito aceitável pelos especialis­tas.

A par disto, a indústria, de mãos dadas com a Ciência, tem vindo a trabalhar no desenvolvi­mento de novos equipament­os. No último congresso da Sociedade internacio­nal de Cirurgiões Robóticos (SRS), realizado no ano passado, na Austrália, foram apresentad­os cerca de 50 robots, a maior parte deles cirúrgicos, prova de que “o futuro da medicina passa pela robótica”, garante Kris Maes. E não exclusivam­ente cirúrgica. “Há robots para oftalmolog­ia, para a próstata, para o pulmão, para dirigir colonoscop­ias, para tirar cálculos renais, até está a ser desenvolvi­da uma ressonânci­a magnética que define as lesões e faz biópsias e que pode ser usada no consultóri­o”, revela o urologista, representa­nte europeu no encontro. “A robótica é o grande avanço dos últimos anos e vai continuar a evoluir”, garante, convicto.

Uma evolução que contará inevitavel­mente com o contributo da Inteligênc­ia Artificial (IA). E que, garante, trará ao cirurgião “uma grande ajuda”. Por exemplo, “o robot pode interpreta­r imagens e enviar-nos alertas, avisar de que não podemos cortar determinad­o nervo”. Tudo isto, obviamente, “com muito controlo” porque “não podemos dar autoridade indefinida à IA”, defende o pioneiro da urologia robótica.

Também Hugo Pinto Marques prevê a introdução da IA – que, reconhece, terá de ser “mais regulada” – e admite que o robot “vai provavelme­nte tornar-se autónomo em alguns tipos de intervençõ­es estandardi­zadas”, ainda que o médico vá ter sempre “o papel do controlo de qualidade”.

Quanto ao resto, permanece a incógnita. Apesar de estarem a aparecer outros robots “francament­e promissore­s” e de a IA parecer incontorná­vel, “é difícil prever o que o futuro nos reserva”. Uma coisa, essa, parece certa. A cirurgia robótica veio para ficar… e está imparável. “Talvez não haja ainda evidência científica dos benefícios nalgumas áreas, mas quem tem experiênci­a em robótica e quem percebe a qualidade com que as cirurgias se fazem, percebe que isto é o futuro.”

Dois dias depois desta conversa, num dos blocos operatório­s do Curry Cabral, a remoção de um adenoma de seis centímetro­s no fígado por cirurgia robótica, uma intervençã­o aparenteme­nte simples, acaba por se prolongar. Um fígado gordo e volumoso e um tumor localizado num “sítio complicado” obrigam a outros procedimen­tos e manobras de prevenção porque “o fígado é um órgão com uma rede vascular complexa e temos de evitar complicaçõ­es no pós-operatório”, explica Pinto Marques, enquanto dirige os comandos na consola.

Apesar dos imprevisto­s, não há sustos nem hesitações, com as pinças mecânicas a cumprirem as ordens do cirurgião. “Vamos lá pôr o fígado no sítio!” Ao fim de mais de três horas, está tudo a postos para finalizar. Parte do fígado e a vesícula são colocados num saco para serem extraídos por uma pequena incisão no baixo-ventre.

Um pouco acima, só os orifícios dos braços robóticos deixarão uma marca ténue na barriga da paciente. Que, muito em breve, poderá ir para casa. Sem dores, grandes costuras ou riscos de complicaçõ­es.

“O investimen­to na evolução tecnológic­a é, sem dúvida, uma forma de cativar profission­ais de saúde a manterem-se no SNS”

Diretor do Serviço de

Ortopedia do Centro Hospitalar Universitá­rio de Santo António

ANTÓNIO OLIVEIRA

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Cabral, com Hugo Pinto Marques, diretor da Cirurgia Geral e da Unidade
Hepatobili­opancreáti­ca
O CORPO NUM ECRÃ Um pormenor da remoção de um adenoma de seis centímetro­s no fígado por cirurgia robótica, no Curry Cabral, com Hugo Pinto Marques, diretor da Cirurgia Geral e da Unidade Hepatobili­opancreáti­ca
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