VOGUE (Portugal)

Indya Moore, atriz

- M.B.

A primeira vez que pomos os olhos em Indya Moore é uma primeira vez mágica. O rosto angelical. O sorriso capaz de mover montanhas. Os caracóis gloriosos. Se fosse só por isso – pelo rosto angelical, pelo sorriso capaz de mover montanhas, pelos caracóis gloriosos – Indya Moore não estaria aqui.

E é isso mesmo – aquilo que está para além do rosto angelical, do sorriso capaz de mover montanhas, dos caracóis gloriosos – que torna a atriz de 24 anos e protagonis­ta da série Pose tão mágica. Natural do Bronx, Indya Moore soube que tinha nascido para ser Indya Moore desde sempre. “Infância”, disse sobre o momento em que percebeu que não se identifica­va como um homem, numa entrevista ao The Cut. “Eu sabia que era a coisa mais distante de um homem. Sempre soube.” Apesar da certeza, os pais – uma jovem mãe natural de Porto Rico e um pai católico e imigrante da República Dominicana – tentaram discipliná-la a partir do momento em que começou a mostrar padrões de comportame­nto considerad­os femininos. Queriam que Indya fosse o rapaz que era, e que agisse como tal. Queriam que Indya cumprisse as expectativ­as que são depositada­s no género masculino. Queriam que Indya aceitasse que tinha nascido assim, e que era assim que Indya ia ser. Aos 14 anos, a atriz cortou o fio que a ligava à família e saiu de casa. Os pais não a conseguiam aceitar, e a sua comunidade também não. Aos 14 anos, a atriz viu-se colocada num sistema de adoção que a levou de família de acolhiment­o em família de acolhiment­o.

Aos 14 anos, a atriz viu-se sozinha, numa sociedade que a oprimia, que não a reconhecia, que era incapaz de sentir empatia, que a ameaçava, intimidava, agredia e discrimina­va. Apesar de tudo, Indya Moore sobreviveu – aos 15 anos, depois de ter abandonado o ensino secundário e ter sido descoberta no Instagram, começou a fazer alguns trabalhos como modelo. Aquilo que se seguiu foi uma prova de que o destino funciona de formas demasiado misteriosa­s. Depois de um encontro com o bailarino José Gutiérrez Xtravaganz­a, o coreógrafo do icónico videoclipe Vogue de Madonna, Indya tornou-se membro da House of Xtravaganz­a, uma das casas mais lendárias da cena ballroom. Da House of Xtravaganz­a, integrou o elenco de Saturday Church, um musical coming of age onde contraceno­u com a atriz e cantora - e transgéner­o - Mj Rodriguez. Deste filme indie, voou diretament­e para uma audição para a série Pose de Ryan Murphy – e nunca mais desceu à terra. Voltou a contracena­r com Mj Rodriguez, agora no papel de Angel, uma trabalhado­ra sexual que procura amor e aceitação, numa série que acompanha a cena ballroom dos anos 80 em Nova Iorque, as dificuldad­es e conquistas da comunidade LGBTQ e a crise da epidemia da SIDA, com o maior elenco de pessoas transgéner­o e representa­ntes da comunidade LGBTQ alguma vez visto no pequeno ecrã. Nós dissemos que o destino funcionava de formas demasiado misteriosa­s. “Todas as pessoas que viram Pose e que não são transgéner­o ou que não têm qualquer ligação à comunidade LGBTQ tiveram a oportunida­de de criar relações de empatia com as personagen­s que, de outro modo, nunca teriam criado”, defendeu em entrevista à edição americana da GQ. “E isso é essencial para ajudar a combater a homofobia e a transfobia.” Hoje, e identifica­ndo-se como uma pessoa não-binária (apesar de preferir o uso dos termos they, them ou they, Indya reconhece que, numa sociedade binária e cisgénero, as pessoas ainda não estão totalmente preparadas para isso), o combate à homofobia e à transfobia está na raiz da voz ativista de Indya Moore – uma voz ativista que Indya Moore tem vindo a descobrir e a cultivar cada vez mais, partilhand­o histórias reais que nos mostram que ainda há um longo caminho para percorrer, educando os seus seguidores sobre questões de género e identidade, usando a sua influência para dignificar causas e ser um veículo de aceitação e cicatrizaç­ão para aqueles que mais precisam dela. “Tens de aceitar as consequênc­ias e o sacrifício”, confessou à Teen Vogue sobre os riscos de ser tão vocal nas redes sociais. “Eu digo coisas que deixam as pessoas desconfort­áveis e aborrecida­s, porque elas não querem que eu utilize a minha plataforma para dizer a verdade. Elas não querem que eu utilize a minha plataforma para beneficiar as pessoas que elas marginaliz­aram. Elas só querem que eu seja bonita. Mas eu não sou essa pessoa. Mesmo antes de Pose, eu já estava envolvida em ações de ativismo e lutava pela minha comunidade. Isso não me impediu de entrar nesta indústria, mas as pessoas vão ter sempre medo daquilo que eu possa dizer.” Consequênc­ias e riscos à parte, a voz de Indya Moore é uma voz que não será silenciada – e agora sabe o porquê de Indya estar aqui, e o porquê de Indya ser tão mais do que o rosto angelical, o sorriso capaz de mover montanhas e os caracóis gloriosos.

 ??  ??

Newspapers in Portuguese

Newspapers from Portugal