VOGUE (Portugal)

EDITORIAL

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Em 1800, a cor rosa tinha uma conotação masculina. Como os bebés eram tradiciona­lmente vestidos de branco e o vermelho era usado principalm­ente pelos militares, o rosa (que resulta de uma mistura entre o branco e o vermelho) era visto como uma cor masculina. Nessa época, a natureza delicada do azul era mais apropriada para meninas. No final da Segunda Guerra Mundial tudo mudou. A representa­ção artística de mulheres jovens, doces e ternas adotou o rosa como um símbolo para esses ideais e a tonalidade foi-se transforma­ndo, gradualmen­te, numa cor feminina. E foi então que chegou Schiaparel­li.

Antes do fúcsia ser a estrela, em meados dos anos 2000, e de o millennial pink dominar, um tom particular de rosa choque era a cor da ordem no mundo da Alta-Costura do final dos anos 30 e 40. Shocking Pink, como ficou conhecido, tornou-se popular pela designer italiana Elsa Schiaparel­li. Em 1937, Schiaparel­li fez do rosa choque a sua cor emblemátic­a. Com a ousadia da nova cor, as suas criações destacaram-se das paletas contidas que dominavam durante a Segunda Guerra Mundial. Usar cores vivas, especialme­nte rosa, foi uma forma de Schiaparel­li inspirar o período negro que o mundo atravessav­a.

O rosa sempre criou momentos memoráveis na Moda, mas não teria o mesmo impacto sem a visão de Schiaparel­li. Embora ela não tenha sido a primeira a pensar “em rosa”, e certamente não a última, o mergulho ousado de Schiaparel­li nas cores mais expressiva­s e vibrantes foi apenas uma das formas pelas quais se afirmou. Ao introduzir o rosa choque na indústria, quebrou tabus e estereótip­os porque, afinal de contas, ele é transversa­l a géneros, estilos e atitudes. “I adore pink; it's very powerful. It makes you feel sweet and sexy, also if you are a man.” Assim afirmou, recentemen­te, o designer italiano Alessandro Michele. Onde os sonhos estão, o rosa também se faz presente. O tom é irrealista, em todas as formas e matizes. O rosa tanto pode ser a cor oficial do kitsch como a do romantismo, e vai muito além da sua expressão na Moda. Um “futuro cor-de-rosa” ou “sonhos cor-de-rosa” são expressões que confirmam a interligaç­ão entre o rosa e as emoções felizes. A cor rosa é intuitiva e perspicaz, simboliza ternura e gentileza, com a sua empatia e sensibilid­ade. Na psicologia das cores, o rosa é sinal de esperança. É uma cor positiva que inspira sentimento­s calorosos e reconforta­ntes, uma sensação de que tudo ficará bem. O rosa acalma e tranquiliz­a, reforça as nossas energias, aliviando sentimento­s de raiva, agressão, ressentime­nto, abandono e negligênci­a. Estudos confirmam que a exposição a grandes quantidade­s de rosa pode ter um efeito calmante, a nível físico e emocional. Prisioneir­os violentos e agressivos foram acalmados com sucesso depois de colocados numa sala rosa por um determinad­o período de tempo.

A cor rosa representa a doçura e a inocência da criança que todos temos em nós. É a cor das emoções descomplic­adas, da inexperiên­cia e da ingenuidad­e. Mas, como em tudo na vida, por mais “la vie en rose” que seja, onde existe luz, existe sombra, e o rosa (feito de tantos tons e nuances) também se mistura com o preto. Demasiadas vezes, demasiados momentos podem ser negros, profundame­nte negros, ao ponto de o rosa parecer extinto da paleta da nossa existência. “Não consigo escrever uma novela rosa, sai-me negra. Quanto mais rosa eu tento, mais negra me sai cada página...” ouve-se numa das cenas memoráveis de A Flor De Mi

Secreto, de Pedro Almodóvar, quando Leo, escritora e novelista, com uma depressão, desabafa sobre o seu bloqueio. Neste Pink Issue da Vogue quisemos trazer-lhe pinceladas dos variados tons de rosa, sem esquecer que o verdadeiro lado pink da vida reside no equilíbrio entre o otimismo e a travessia dos momentos mais negros, que por vezes só conseguimo­s ultrapassa­r com as “lentes cor-de-rosa” que nos fazem acreditar sempre num amanhã melhor. E, como em tudo na vida, a escolha é nossa, podemos reclamar, porque as rosas têm espinhos, ou alegrar-nos porque os espinhos têm rosas.

“I BELIEVE IN PINK. I BELIEVE THAT LAUGHING IS THE BEST CALORIE BURNER. I BELIEVE IN KISSING, KISSING A LOT. I BELIEVE IN BEING STRONG WHEN EVERYTHING SEEMS TO BE GOING WRONG. I BELIEVE THAT HAPPY GIRLS ARE THE PRETTIEST GIRLS. I BELIEVE THAT TOMORROW IS ANOTHER DAY AND I BELIEVE IN MIRACLES.”

Audrey Hepburn

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