O POETA DE PORTUGAL
Esta é uma boa semana para falar da indiferença com que o Estado português tem encarado o quinto centenário do nascimento de Luís Vaz de Camões, o grande poeta da epopeia dos descobrimentos, uma das maiores figuras da literatura portuguesa e um dos grandes poetas da tradição ocidental. O vento de reescrita da História que varre muitos bens pensantes leva-os a querer ignorar Camões. Boa altura portanto para ler o que sobre Camões escreveu uma das maiores figuras intelectuais do Portugal do século XX, insuspeito de ser simpatizante do regime anterior. Jorge de Sena fez vários ensaios sobre o poeta, agora reunidos num livro intitulado “O Pensamento de Camões”. O Camões que Jorge de Sena nos oferece é um Camões oposto ao das leituras dos políticos. O que Jorge de Sena faz, como se tivesse previsto o que iria acontecer em 2024, é resgatar Camões da actual perseguição ideológica, para mostrar aos leitores um poeta de uma grande erudição, “o maior poeta em português”. No livro “O Pensamento de Camões”, que recupera quatro textos de Sena, ele afirma que a lírica camoniana “transcende em muito o âmbito nacional de um destino histórico não cumprido do seu mais alto sentido, para ser, na verdade, um aviso e um apelo que se dirige a toda a Humanidade”. Jorge de Sena ensina-nos que Camões “deve ser lido nas entrelinhas e como um nosso contemporâneo” e mostra-nos um Camões acima da pequenez de orgulhos nacionalistas e piedade cristã. Um Camões que nos fala “como só grandes poetas falam, acerca de angústias, esperanças e desesperos muito parecidos com os de hoje”. Edição Guerra & Paz, com o apoio da Fundação Calouste Gulbenkian.