Sofia Ribeiro
Forte. Confiante. Sem preconceitos. Como sabe, a atriz portuguesa tem uma história de vida intensa, pelo que é a mulher perfeita para liderar este nosso movimento ‘Ame o seu corpo’.
A fase difícil por que Sofia Ribeiro passou recentemente fêla mudar a forma como lida com o corpo e com a imagem. A atriz fala-nos de amor próprio e de como as mulheres se devem apoiar mutuamente...
Como é que te defines enquanto mulher?
Sou uma mulher que procura, cada vez, mais viver de forma descomplicada tudo o que esta vida me propõe. Tirei peso de mim, das minhas costas. Não gasto energia, nem tempo com coisas que de alguma forma possam contaminar a minha energia e, consequentemente, a minha vida. Acho que me passei a focar mais no essencial e menos no superficial. Mas é meio estranho falarmos de nós. Do que somos ou como nos sentimos! Mas respondendo-te: acho que as características que melhor me definem são talvez a confiança e determinação. Confiança em mim, nos meus princípios, nas minhas capacidades e no meu valor enquanto pessoa e profissional. Sou determinada para, independentemente das circunstâncias, não baixar os braços e ir à luta! Desde muito nova que sou teimosa, o que nem sempre é bom, mas felizmente isso, associado à intuição, tem-me valido muito neste meu caminho. Se meto uma coisa na cabeça só desisto dela se me provarem que estou errada, pois de outra forma sigo focada.
E essas tuas características surgiram ou mudaram depois do cancro?
Não, mas acho que se aprimorou. Hoje acredito mais que querer é meio caminho para poder. Naturalmente, há um sem-fim de coisas que não dependem de nós e que, infelizmente, muitas vezes não conseguimos controlar. Ainda assim, acredito que a maior parte do trabalho é feito por nós. Entendo que a forma como estamos na vida e olhamos para ela e para o que nos rodeia pode, sim, ditar o nosso percurso.
Pegando neste tema da tua doença, em que momento é que soubeste que, por mais apoio e amigos à tua volta, eras tu e apenas tu que tinhas de encontrar forças para superar o cancro?
Não concordo que és tu e apenas tu. É óbvio que tu és o motor. E, se não puxas por ele, não há como, vai mesmo tudo a baixo. Mas acredito de coração que, qualquer que seja a situação limite, será sempre mais leve, menos dolorosa vivê-la junto dos que amamos. Porque, por mais forças que tenhamos ninguém é de ferro! Ninguém é um super-homem ou super-mulher. Há, de facto, muitos momentos em que as nossas forças parecem perder-se. E eu não consigo imaginar o que será não ter alguém ao lado que nos dá a mão e nos puxa para cima. Por isso, sim, a força está em nós, sempre! E em tudo o que faz de nós o que somos.
O que é que mais se aprende ao passar por uma doença como essa?
Eu só posso falar por mim. Cada pessoa é uma pessoa diferente e, consequentemente, age e reage de forma distinta numa mesma circunstância. Ainda não sei dizer na totalidade e ao certo o que mudou em mim e o que aprendi com esta situação em particular. Seria bom, mas não é tão linear. ainda estou a tentar perceber, descobrir e sinceramente acredito que assim será enquanto por cá andar. Há momentos em que identificamos umas coisas, noutros outras. Costumo dizer que ainda estou a conhecer esta nova versão de mim mesma. Mas talvez a maior aprendizagem até aqui, a que mais salta à vista, seja a vontade imensa que tenho de viver. O respeito e a gratidão que tenho hoje pela vida, por mim, pelas pessoas e coisas que me rodeiam, pelos que amo. Tudo tomou uma proporção que, por mais sensíveis que sejamos, só quando passamos por uma situação limite se consegue compreender com maior exatidão.
Hoje, quando te olhas ao espelho nua, que Sofia vês?
Sempre fui muito magra. Desde menina que sempre tive dificuldades em engordar. Fui gozada em miúda por ser a Olívia Palito da escola. Cheguei a vestir duas calças de cada vez para parecer mais gordinha. Depois cresces e és gozada ou atacada porque estás mais gorda ou com celulite. E depois vem a vida ensinar-te que, mais importante que a imagem que os outros têm de ti, é a forma como nos sentimos bem na nossa pele. E é assim que me sinto hoje. Eu hoje olho para mim e sinto-me muito bem e feliz com o que vejo. Porque mais do que ver o meu corpo, penso em tudo o que ele já resistiu para chegar aqui e não há como não me sentir a maior gata. Desculpa! (risos)
Por certo que passaste por mudanças inesperadas na tua imagem. Sofia, alguma vez deixaste de amar o teu corpo?
Já deixei de me amar a mim e, consequentemente, ao meu corpo. Já permiti que me roubassem o amor próprio sem me aperceber que o estava a fazer. Mas, felizmente, a tempo percebi que ninguém tem o direito de nos fazer sentir menores.
Mas mudaste muito antes, durante e após a doença? Frontalmente, isso mexeu muito contigo?
Claro que sim. Não há como não. Tudo mudou e o meu corpo também. Acordares a dado momento cinzenta, inchada e sem um único pelo na cara abana qualquer pessoa. Olhar ao espelho e não me reconhecer, a roupa não me dervir, os pés não entrarem no calçado... De um dia para o outro tudo muda. É um processo duro. Mas o foco não era o meu aspeto, era a minha saúde ou o recuperar dela. Por isso, aceitei. E tenho a certeza de que aceitação para mim foi a base para a minha liberdade. Ainda hoje faço medicação,
“Porque mais do que ver o meu corpo, penso em tudo o que ele já resistiu para chegar aqui”
sei que dificilmente o meu corpo voltará a ser como era, mas a verdade é que nem procuro isso! Hoje sinto-me verdadeiramente mais bonita que nunca. As minhas balizas mudaram, deixaram de ser os padrões dos outros e passaram a ser os meus. Falaste-me que perdeste 7 kg, mas não me apercebi quando e o que te fez mudar. O que aconteceu? Não aconteceu nada de mais, apenas terminei as gravações da Herdeira e, com mais tempo livre, recuperei as minhas rotinas de treino com a ajuda do meu PT Igor Sanchez, juntamente com a Karine da Kestetica e da Céu da clínica dr. Biscaia Fraga, onde alternadamente vou fazendo massagens drenantes, que no meu caso são fundamentais porque a medicação faz-me reter muitos líquidos. Isto associado a uma alimentação mais cuidada. Hoje vivo em busca de uma melhor qualidade de vida e, consequentemente, da minha saúde. O que, naturalmente, acaba por se refletir na minha imagem. E isso passa, por exemplo, por dormir bem. O nosso corpo regenera enquanto dormirmos e tendemos a não dar o devido valor a isso. Também não podemos esperar que a nossa saúde seja sólida a comer e beber tudo o que há de disparates. Não há como. Mais tarde ou mais cedo acabamos por pagar a conta. Isso é certo. Os estudos estão aí para comprovar! Bem como não podemos querer ver resultados no nosso corpo/imagem quando mantemos hábitos alimentares errados e rotinas sedentárias. Hoje sei, por indicação médica e por consciência própria, que preciso de praticar atividade física e comer de forma saudável para me tentar manter o mais longe possível de sustos muito pouco desejáveis. Ainda bem que falas disso porque, atualmente, toda a indústria global tende a lançar parâmetros de influências de beleza ou padrões ideais a seguir. Já foi tempo das mulheres (modelos) super magras, depois as medidas
Hoje sei, por indicação médica e por consciência própria, que preciso de fazer exercício e comer de forma saudável para me afastar de mais sustos
certas (86-90-86), de seguida as fit girls e, hoje em dia, fala-se em corpos reais… O que achas de tudo isto? Acho que a beleza é muito mais do que uma imagem. A beleza interior que consequentemente transborda para o exterior, a meu ver, essa sim é a mais bonita! Passa por não seguirmos padrões ou ideias preconcebidas. Essas são, para mim, as mulheres reais. Ser bonito passa primeiro pela aceitação do que somos. E só assim conseguiremos lidar sem que isso nos faça mossa, com os dedos apontados por uma sociedade tantas vezes fútil e de valores invertidos. Por que tenho eu que ter vergonha de me mostrar como sou? Hoje, mais do que nunca, todos os dias entram pelas nossas casas, redes sociais e afins... Definições de beleza demasiado severas para o comum dos mortais. Fazem-nos acreditar na perfeição, seja lá o que isso for. Usam-se filtros, roupas, maquilhagem, fazem-se mil e uma dietas disfarçadas de detox. Sem muitas vezes se saber exatamente para o que serve ou quais as suas consequências e benefícios. Vale tudo para ter o corpo perfeito? Na minha opinião, não. E o que é isto de ter um corpo perfeito? Discutível, não?
Para mim, a perfeição é ter saúde. A perfeição está em eu olhar-me ao espelho e sentir-me feliz com o que vejo. Independentemente de ter celulite, estrias, cicatrizes, acne,
50 kg ou 80 kg. Aceitarmos não quer dizer que não possamos fazer por melhorar todos os dias. Pelo contrário! Aceitarmos-nos, mesmo que queiramos melhorar, deve ser feito por nós e não porque nos foi imposto por esta sociedade. Sim, na minha opinião, é certo que a mulher se aceite como é e com as suas “imperfeições”. Já não é certo quando se tenta usar esta corrente que se vê pelas redes sociais para se ter liberdade para tudo. Mesmo concordando que cada pessoa sabe de si, parece-me que uma mulher obesa não pode ter um corpo real, pois é tudo menos um corpo saudável. O que te parece? A meu ver não. A maioria das pessoas não tem vida, nem tempo para passar horas e horas a fim num ginásio. Portanto sim, os corpos reais são os corpos de quem tem vidas também elas reais! De quem acorda com o tempo contado para chegar ao trabalho e depois ainda tem que ir buscar os miúdos, fazer o jantar e dar-lhes banho e por aí fora. Isto para dizer que sim, é possível no meio dos nossos dias loucos encontrar alternativas que nos permitam cuidar de nós e da nossa saúde. Já não há desculpa nos dias que correm para não se praticar atividade física, se assim o quisermos, mas não venham dizer-nos que conseguem ter um corpo mega sarado com três horas de ginásio por semana, porque não é verdade. Os tais corpos perfeitos, que volto a dizer que para mim de perfeitos têm pouco, exigem horas e horas de ginásio por semana, às vezes dois treinos diários e uma dieta super rígida. E isso é altamente discutível quando falamos de saúde. Desculpem, mas não acho que ser saudável seja isto. São opções de vida! Respeitáveis, mas não acho que nada que seja extremista seja um exemplo de saúde. Tanto para um lado quanto para o outro. Não há milagres para nada. Ou pelo menos eu não acredito que haja. Não podemos esperar ter uma saúde impecável e um corpo porreiro cuidando mal de nós. Mas acredito que o sucesso de quase tudo está no equilíbrio. E é isso que procuro para mim. É que fico feliz de olhar à volta e ver que é para aí que caminhamos. Mas não me digas que, ao longo da tua carreira, nunca sentiste pressão para seguires esses tais padrões de estética ideal? Eu acredito que a maneira como vemos as coisas dita a forma como nos colocamos perante elas. Isto para dizer que ainda que exista essa ideia de beleza - que existe -, eu não me vejo como uma miúda bonita. Como tal, não me deixo levar por pressões. Acredito em mim e no meu valor. Como sabes, este projeto ‘Ame o seu corpo’, que te desafiei a liderar nesta edição faz parte de uma mensagem internacional que todas as Women’s Health do mundo fizeram. Cada país fez, inclusive, um questionário a centenas de mulheres. No caso português, existem alguns resultados que gostava que comentasses: 19% das portuguesas inquiridas dizem não sentir-se bem nuas e que isso lhes afeta a autoestima. Basta dizer-lhes que são mulheres reais ou tens algum conselho? Não há nenhum conselho milagroso que possa partilhar, a não ser aquilo em que acredito. Não há nada que derrube uma mulher confiante e em paz consigo. Não há nada que nos tire o brilho! Venha quem vier e o que vier. Mas não achas que este tipo de decisões deviam servir ainda mais para unir as mulheres por uma mesma conceção de como se veem e como devem respeitar as imperfeições que cada uma tem? As mulheres devem unir-se mais, ponto. Apregoamos muito esta coisa do girl power, do juntas somos mais fortes, mas a verdade é que, na maior partes das vezes, somos nós as mulheres a criticar e a atacar outras mulheres. A união, a meu ver, não deve ser uma bandeira que é giro defender porque está na moda. Ou porque é porreiro dizer que se é feminista. Ser feminista é defender oportunidades e direitos iguais. E se aos homens não lhes é exigido o mesmo que a nós mulheres então sim, devemos unir-nos para despertar consciências nesse sentido.
No meio dos nossos dias loucos, é possível encontrar alternativas que permitam cuidar de nós e da nossa saúde