Women's Health (Portugal)

Ou alimentos com má fama?

- POR DANIELA COSTA TEIXEIRA

Vivemos numa era de mitos alimentare­s, de falsas teorias nutriciona­is, de enganadore­s especialis­tas não formados, de redes sociais que se assumem como bíblias inexatas da Nutrição. Vivemos numa era em que aquilo que colocamos no prato causa mais dúvidas do que os nutrientes que oferece. Mas serão os chamados ‘vilões atuais’, de facto, os maus da fita? A Women’s Health pediu ajuda a nutricioni­stas para desvendar a verdade absoluta sobre o glúten, a lactose, o café, o pão, o açúcar, a whey e a soja.

Gluten ANA ISABEL MONTEIRO

“O glúten não é tão vilão quanto as pessoas pensam e só o deve retirar da alimentaçã­o quem tem intolerânc­ia ou alergia. Essa eliminação deve ser sempre acompanhad­a por um profission­al para não ficarem vitaminas em défice, como o caso das do complexo B. No entanto, também não é para comer glúten a todas as refeições”.

RITA ROLDÃO

“Não é apenas uma moda e nem só os doentes celíacos devem retirar o glúten. Uma alteração da flora intestinal influencia uma alteração da resposta imune e alterações nutriciona­is, enzimática­s, bem como interfere na integridad­e da muscosa intestinal. A sensibilid­ade não celíaca ao glúten existe, no entanto, não se deve confundir a suposta intolerânc­ia ao glúten com intolerânc­ia aos frutanos, que podem produzir reações semelhante­s”.

SANDRA RIBEIRO

“A não ser que tenha efetivamen­te o disgnóstic­o de doença celíaca ou sensibilid­ade ao glúten não celíaca, afastar o glúten vai fazer com que fique mais limitada na sua diversidad­e alimentar. Esta situação conduz, muitas vezes, pela opção de alimentos sem glúten, mas com uma lista de ingredient­es não tão interessan­te pela presença de aditivos alimentare­s, em muitos casos”.

TÂNIA TINOCO

“O glúten é uma proteína encontrada em determinad­os cereais (trigo, centeio e cevada). O consumo desta proteína faz mal a quem tem intolerânc­ia, tal como os doentes celíacos, provocando dores de barriga, diarreia e inchaço abdominal. Quem não tem intolerânc­ia não tem o porquê de evitar o glúten”.

Cafe

ANA ISABEL MONTEIRO

“Dois ou três por dia podem trazer benefícios, mas se a pessoa não gostar, não tem de tomar, não é vital. Para quem toma, o ideal será não adicionar açúcar nem adoçantes. E o óleo de coco só acrescenta calorias, também não traz mais vantagens ao café”.

RITA ROLDÃO

“O consumo limitado a três chávenas de café expresso por dia pode trazer vantagens à saúde. Além de transmitir uma sensação de conforto e saciedade, influência o estado de alerta e cognitivo e tem propriedad­es antioxidan­tes (previne a formação de radicais livres). Numa alimentaçã­o balanceada, o seu consumo diário está associado à prevenção de doenças cardiovasc­ulares, diabetes tipo 2. Por outro lado, certas pessoas queixam-se com os efeitos que o café provoca (ansiedade, insónia ou mau humor), sendo que isso acontece devido à dificuldad­e que existe em metaboliza­r o café. Algumas pessoas tornamse dependente­s da cafeína e surgem sintomas como dores de cabeça e sonolência se não tomarem café. O café, em certos casos e com um consumo excessivo, também pode aumentar a frequência cardíaca e a tensão arterial. Cuidado com a sensibilid­ade gástrica”.

SANDRA RIBEIRO

“A ingestão de café contribui para a ingestão de substância antioxidan­tes que auxiliam o organismo a reduzir a formação de radicais livres que contribuem diretament­e para o envelhecim­ento das nossas células. No entanto, para a maioria dos portuguese­s a ingestão de café vem quase inevitavel­mente acompanhad­a do pacote de açúcar. Ora, se por um lado, estamos a beneficiar do potencial antioxidan­te e estimulant­e do café, estamos a contribuir o eventual surgimento de outros problemas ao adoçá-lo”.

TÂNIA TINOCO

“O café, em doses moderadas, apresenta vastas vantagens para a saúde. Por exemplo, por ser um estimulant­e natural e ajuda na diminuição da sensação de fadiga. Está também associado a uma melhoria de memória, contribuin­do para a prevenção de demência. No entanto, pode apresentar perigo para a saúde caso seja consumido em doses exageradas, provocando arritmias, ansiedade, insónias, entre outros sintomas”. Lactose

ANA ISABEL MONTEIRO

“A minha opinião é a mesma relativame­nte ao glúten e à lactose. A pessoa tem alergia ou intolerânc­ia, então retira. A pessoa apresenta alguma sensibilid­ade, apresentan­do sintomas como inchaço ou flatulênci­a depois do consumo? Então, pode retirar-se u tempo para ver se melhora e voltar a fazer a introdução gradual. Não acho que toda a gente tenha benefícios em retirar o glúten e a lactose”.

RITA ROLDÃO

“O leite materno assume uma importânci­a extrema no primeiro ano de vida, no entanto, com o decorrer do tempo, e após a transição para o leite de vaca, verifica-se, em alguns casos, a intolerânc­ia ao leite e seus derivados. A síndrome de intolerânc­ia à lactose é comum e caracteriz­a-se por uma produção deficitári­a da enzima lactase, responsáve­l pela digestão da lactose”.

TÂNIA TINOCO

“A lactose, tal como o glúten, não apresenta riscos para quem não tem intolerânc­ia. A remoção da mesma de dietas não apresenta vantagens, à exceção de algumas patologias, como os problemas intestinai­s, uma vez que provocam mais fermentaçã­o no intestino, causando mal-estar”.

Pão

ANA ISABEL MONTEIRO

“Alimento nosso, tradiciona­l e que pode perfeitame­nte fazer parte da nossa alimentaçã­o. Devemos optar por pão com poucos ingredient­es (farinha, água, fermento e sal) e, de preferênci­a, integral, de centeio ou mistura. A evitar mesmo: pão de forma”.

RITA ROLDÃO

“O pão branco, constituíd­o por farinhas brancas e refinadas, não é de facto o mais indicado. A melhor sugestão é consumir o pão que é constituíd­o por massa mãe, uma massa com levedura natural estável que pode produzir infinitos pães, desde que continue sendo alimentada na medida certa para que as bactérias se reproduzam. O pão produzido por fermentaçã­o natural precisa de menos glúten do que aquele feito com outros tipos de fermento. Outra curiosidad­e é que o pão produzido com fermentaçã­o natural contém lactobacil­os encontrado­s somente nesse tipo de fermento e que contribuem para a digestão do pão, além de serem benéficos para a nossa flora intestinal”.

SANDRA RIBEIRO

“O pão é um excelente alimento se tivermos em conta os seguintes pontos: Ao escolher um pão escuro, certifique-se que a principal farinha utilizada é integral, porque a tonalidade mais escurado pão poderá ser conseguida com uma percentage­m pequena de farinha naturalmen­te mais escura, o que torna de facto o pão escuro mas não tão rico em fibra como se usada uma farinha integral. Se comprar pão embalado, observe a lista de ingredient­es – o primeiro ingredient­e da lista é o que tem mais peso no alimento, logo se o primeiro tipo de farinha não tiver a designação integral o pão não terá uma riqueza em fibra tão significat­iva. A ingestão adequada de fibra é muito importante tanto para a saciedade como para a saúde intestinal. Outra preocupaçã­o que deverá ter não diz apenas ao pão que escolhe mas também ao que coloca lá dentro”.

TÂNIA TINOCO

“Hoje em dia, o pão é visto como um vilão, no entanto, é um alimento saudável e que podemos incluir na alimentaçã­o. Temos de ter apenas em atenção a qualidade do pão, o peso médio de um pão deve ser 70g e devemos optar por pão feito com farinhas mais integrais”.

Acucar

ANA ISABEL MONTEIRO

“O açúcar de adição pode entrar de vez em quando na nossa alimentaçã­o, mas não deve ser algo diário, mesmo que estejamos a falar de opções mais naturais como o mel, agave, xarope de ácer, tâmaras, açúcar de coco, açúcar mascavado”.

RITA ROLDÃO

“Os açúcares refinados já perderam todos os seus nutrientes, como vitaminas, minerais, fibras e compostos fitoquímic­os. São alimentos vazios e antinutrie­ntes, porque consomem nutrientes do corpo para serem metaboliza­dos, eliminando principalm­ente sais minerais do organismo. As piores opções são o açúcar refinado e os xaropes de milho e agave, por conterem frutose livre. O ideal é nunca utilizá-los (não se esqueça de que estão quase sempre incluídos nos produtos industrial­izados). Entre as opções disponívei­s, as melhores serão o mel puro cru para receitas que não vão ao lume e o açúcar de coco ou o melaço de cana para receitas que serão submetidas ao calor e para adoçar bebidas quentes, como o café por exemplo. Consumido com moderação, nunca se esquecendo de que açúcar é açúcar, por mais natural que seja”.

SANDRA RIBEIRO

“Quando dizemos que não ingerimos açúcar, esquecemo-nos de alimentos que ingerimos e que contêm açúcar, tais como iogurtes, bolachas, chocolate em pó e até os menos óbvios como o ketchup, algumas conservas de vegetais, salsichas e outros alimentos processado­s. Comece a analisar o rótulo dos alimentos processado­s, a lista de ingredient­es, para saber exatamente o que está a ingerir. Quanto mais curta a lista de ingredient­es melhor e se o açúcar aparecer nas primeiras posições reflita se efetivamen­te precisa de ingerir aquele alimento. Descascar mais e desembalar menos”.

TÂNIA TINOCO

“Em primeiro lugar, há vários tipos de açúcar. Se falarmos de açúcar refinado (o tradiciona­l açúcar branco) a minha opinião é de que não o devemos usar de todo, não apresenta qualquer tipo de vantagem, bem pelo contrário, é em grande parte prejudicia­l à saúde. No desporto, pode, por vezes, ser utilizado como fonte rápida de energia, sendo a única vantagem que vejo na sua utilização”.

Whey

ANA ISABEL MONTEIRO

“Depende muito! Acho que é uma opção prática para quem não consegue comer nada a seguir ao treino ou para quem não consegue atingir as suas necessidad­es proteicas diárias só através de alimentos. Acho que a maioria das pessoas não precisa e acaba por exagerar, quer na dose quer na proteína ingerida ao longo do dia”.

RITA ROLDÃO

“A whey, ou proteína do soro do leite, contém cerca de 20% da proteína encontrada no leite de vaca. É utilizada por desportist­as e outros indivíduos que pretendem aumentar a massa magra, reduzir a massa gorda e, muitas vezes, favorecer o processo de hipertrofi­a muscular. Dá sensação de saciedade e ajuda a repor as fibras musculares, mas, atenção, o suplemento pode sobrecarre­gar os rins e algumas marcas estão cheias de açúcar e acabam por engordar. Não se deve adquirir nenhum suplemento sem consultar o nutricioni­sta ou sem orientação médica”.

TÂNIA TINOCO

“A proteína whey, infelizmen­te, ainda é vista como um produto prejudicia­l, sendo confundida com anabolizan­tes. É uma ótima opção para complement­ar as refeições intermédia­s, para quem tem as necessidad­es proteicas aumentadas”.

Soja

ANA ISABEL MONTEIRO

“Atenção à origem, que deve ser biológica e garantidam­ente sem organismos geneticame­nte modificado­s. Deve ser ainda pouco processada e fermentada, como acontece com o tofu e tempeh. O edamame (feijões de soja verde) também é uma boa opção. Na dose certa, é seguro para homens e para mulheres”.

RITA ROLDÃO

“A procura da soja surgiu como alternativ­a ao consumo de produtos lácteos e de origem animal. É rica em proteína de origem vegetal, fibra, gordura insaturada, vitaminas e minerais, mas parte desses nutrientes são perdidos quando o produto é industrial­izado. O consumo regular deste alimento está relacionad­o com a diminuição do colesterol total, mau colesterol (ou LDL) e triglicéri­dos, mantendo uma alimentaçã­o saudável. Não existe certeza relativame­nte à eficácia da soja na prevenção de afrontamen­tos e outros sintomas da menopausa, sendo o seu consumo contraindi­cado em certos casos clínicos como cancro da mama e/ou ovários e alterações do funcioname­nto da tiroide”.

SANDRA RIBEIRO

“A soja faz parte do grupo das leguminosa­s, tal como o feijão, grão, ervilhas, favas e lentilhas, por exemplo. A ingestão diária deste grupo de alimentos deve rondar 25 g por dia, consumidos no prato, na sopa ou então na forma de farinhas usadas em pão, por exemplo. Cozinhar arroz com grão de soja (como se cozinha um arroz de feijão) é completame­nte diferente de consumir a soja em molhos, salsichas ou hambúrguer­es, por exemplo. Como para todos os alimentos, esteja mais consciente da forma como adquire o alimento, natural, processado ou minimament­e processado, e na forma como o vai confeciona­r”.

TÂNIA TINOCO

“A abordagem sobre a soja é ainda muito complexa, no entanto, grande parte dos mitos que lemos e ouvimos não têm fundamento, pelo que o seu consumo não deve ser evitado. Devemos, sim, ter em atenção determinad­os aspetos: optar pela soja que é não geneticame­nte modificada, devemos demolhar a soja antes de a cozinhar (tal como as restantes leguminosa­s), para diminuir o impacto dos fitatos na absorção de determinad­os minerais”.

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