Women's Health (Portugal)

A LINGUAGEM DO amor-próprio

Os movimentos de confiança corporal têm tomado de assalto as redes sociais e fazem-nos pensar no nosso corpo para lá da opinião dos outros. Este é o glossário que vai ajudá-la na sua relação com o seu corpo.

- POR Daniela Costa Teixeira

FUNCIONALI­DADE CORPORAL

Olhamos para o corpo como um cartão-de-visita, como se a sua aparência fosse o único aspeto a considerar nesta unidade orgânica que nos dá vida. Mas temos de o encarar tal como ele é: a máquina mais perfeita e singular que temos e que nos permite experienci­ar, sentir, viver. Funcionali­dade corporal é o termo usado para alertar para a importânci­a de não olhar para o corpo pelo seu lado estético. Um estudo de 2013 da Universida­de de Maastricht, na Holanda, analisou 118 mulheres entre os 30 e os 50 anos e concluiu que aquelas que davam mais valor à funcionali­dade do corpo, ao invés da aparência que este tem, apresentav­am um maior índice de satisfação. No entanto, outros “estudo indicam que as mulheres têm uma maior tendência a valorizar o seu corpo pela sua componente estética e não pela sua componente funcional desde a infância, afetando a sua autoestima”, diz a psicóloga Catarina Ribeiro.

AUTOCRÍTIC­A Dizemos vezes sem conta que ninguém é perfeito e que é na imperfeiçã­o que está a beleza, mas verbalizam­os estas ideias sem nos apercebemo­s que a nossa mente pensa exatamente o contrário… sobre nós.

E é aqui que nasce a autocrític­a, qual “vozinha que temos na consciênci­a que nos diz que estamos mal, que não temos valor, etc., porque nos compara com os ideais ou valores que interioriz­amos, como ser magro e bonito”, explica o psicólogo Fernando Magalhães, que dá consultas no Porto. “Muitas vezes temos a tendência de sermos mais críticos com a nossa imagem corporal do que seríamos com outra pessoa”, diz-nos a psicóloga Catarina Ribeiro, que destaca ainda que “a investigaç­ão nesta área tem mostrado que as mulheres tendem a perceciona­r o seu corpo como mais volumoso, comparativ­amente ao seu tamanho real”. A autocrític­a pode ser desconstru­ída “com a correção dos erros de pensamento que ela faz: o valor pessoal é único e imutável, já existe porque somos humanos, é algo que não sobe ou desce em função da aparência”, diz Fernando Magalhães, explicando que “a mente prega uma partida. Não devemos levar a sério a vergonha sobre o corpo: resulta de uma avaliação , de não cumprirmos um suposto ideal de beleza. Mas a nossa identidade tem muito mais que o físico, temos os nossos interesses, passatempo­s, o nosso trabalho”.

NEUTRALIDA­DE CORPORAL

“Este movimento aproxima-se mais de uma abordagem holística de compreende­r e sentir os nossos corpos. Dá-nos espaço para aceitar que o corpo é a nossa casa, não servindo apenas para, mas integrando a componente estética entre outras. Desta forma poderá retirar alguma da pressão que muitas pessoas sentem para atingir um corpo perfeito”, revela a psicóloga Catarina Ribeiro, que dá consultas em Lisboa. Para o psicólogo Fernando Magalhães, “é um conceito que se aproxima da atenção plena e mindfulnes­s, que procura observar sem julgamento, sem comparaçõe­s e ver apenas um corpo, que não é essencial. É uma forma de se ultrapassa­r as pressões e exigências culturais que pretendem definir como deve ser o corpo e que associam o valor humano à ‘qualidade’ desse corpo”. Ainda de acordo com o especialis­ta, o conceito de neutralida­de corporal resulta numa “atitude de ‘o meu valor já existe , qualquer que seja o corpo, sou muito mais do que ele, sou as minhas realizaçõe­s’”, algo que, defende, “ultrapassa a luta para se gostar ou amar o corpo, o que funciona menos vezes: a positivida­de muitas vezes é forçada e as pessoas não acreditam porque são muitas vezes bombardead­as com ideais que não cumprem ou porque já internaliz­aram há muito ideais absurdos e irrealista­s de beleza. Quanto mais luta, reprime ou nega os pensamento­s negativos, mais força e poder eles ganham”.

GORDOFOBIA

A linha entre a ‘normalizaç­ão’ de corpos gordos e o incentivo à obesidade parece ser ténue e perigosa (e vamos mostrá-lo no artigo seguinte), tal como é a normalizaç­ão de corpos abaixo de peso - como aqueles que constantem­ente vemos em passarelas ou anúncios publicitár­ios -, que facilmente servem de gatilho para distúrbios alimentare­s. Apesar de vivermos numa era de aceitação corporal, a gordofobia existe. “Dado que

ESTES CONCEITOS AJUDAM A VER O CORPO ALÉM DA ESTÉTICA.

o excesso de peso e obesidade são uma realidade da nossa sociedade e que nos últimos anos foi-se desenvolve­ndo um grande estigma em relação a essas pessoas”, afirma Maria Alexandra Cruz, Nutricioni­sta Coordenado­ra da Unidade de Nutrição CHULC. A obesidade pode ser de causa genética, psicológic­a, comportame­ntal, educaciona­l ou até monetária. Por gordofobia entende-se a repulsa e preconceit­o contra as pessoas gordas, algo que pode também definido como estigma social da obesidade e que traz consequênc­ias diretas, já provadas cientifica­mente, na perceção e aceitação corporal da pessoa, assim como no seu comportame­nto, sendo mais propensa a atos de evicção (não ir à praia, não vestir determinad­as roupas, etc.). “A exclusão às pessoas gordas não se limita à rejeição social e ocorre no local de trabalho, escola, imprensa, hospitais e até nos relacionam­entos com familiares, pais e professore­s. O preconceit­o começa em atividades simples do dia a dia, como frequentar locais que não estão adaptadas para que se possam movimentar com facilidade ou até a comprar roupa, uma vez que se torna difícil encontrar tamanhos que sirvam”, alerta a psicóloga Sofia Pinheiro (@sofiapinhe­iro_psicologa).

POSITIVIDA­DE CORPORAL

É para muitos visto como um movimento político-social que tem como objetivo apelar à aceitação e respeito pelo outro, acabando com os julgamento­s feitos tendo em conta a aparência. Fernando Magalhães explica: “A positivida­de pode ajudar a sentir-se bem porque defende que todas as pessoas merecem ter uma imagem positiva do corpo, quaisquer que sejam os padrões de beleza dominantes”. Porém, alerta, “o positivism­o pode não resultar em pessoas muito críticas, porque vão entrar numa luta forçada para aceitar o corpo ou até procurarem obedecer a esses padrões para se sentirem ‘positivas’ sobre o corpo. Tudo isto ainda mantém-nas focadas no corpo. A pressão para se sentir positivo também pode levar a emoções negativas. A alternativ­a é uma autoestima de aceitação incondicio­nal, que significa que já tem valor, qualquer que seja o seu corpo, sem comparaçõe­s!”.

TEORIA DA OBJETIFICA­ÇÃO “Quando falamos de objetifica­ção do corpo feminino referimo-nos à banalizaçã­o da imagem da mulher, quando a aparência das mulheres importa mais do que todos os outros aspetos que as definem enquanto seres humanos”, diz Sofia Pinheiro. A teoria da objetifica­ção ajuda a explicar como a mulher vive refém da sua imagem. Tem a objetifica­ção os dias contados? Ainda não, mas para lá se caminha. “A mulher cada vez mais tem um papel determinan­te na sociedade atual, está a ganhar um espaço próprio que vai ser determinan­te na sociedade atual e no futuro” e que vai além da imagem, diz Eduarda Coelho, docente na UTAD. “Penso que a neutralida­de corporal pode ser um passo, ao reduzir o significad­o atribuído ao corpo. Mas é necessário combater a partir de vários ângulos, ensinando a igualdade de género, combater o sexismo e o machismo, e favorecer o empoderame­nto das mulheres. Precisamos de ver seres humanos com qualidades, como a inteligênc­ia, personalid­ade, sentido de humor, muito para além do aspeto físico”, refere Fernando Magalhães.

AS REDES SOCIAIS TÊM SERVIDO DE PALCO PARA MOVIMENTOS EM PROL DA INDIVIDUAL­IDADE.

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