Folha 8

NOTAS SOBRE A V CONFERÊNCI­A DE ADVOGADOS NO LUBANGO

- MARCOLINO MOCO

Um tanto quanto por critério subjectivo, a realização da V Conferênci­a de Advogados, na minha qualidade de membro da classe, foi o facto dominante da quinzena. Ainda mais quando realizada na fresca capital da Huila, a cidade do Lubango, com todos os seus pitorescos ícones; desde humanos, gustativos e naturais. Diferentem­ente da IV Conferênci­a de Advogados, que teve lugar no Huambo, em 2013, em que intervim em painéis relacionad­os com as normas e violações flagrantes dos direitos fundamenta­is, ausente por períodos prolongado­s do país e curioso em aperceber-me da evolução das coisas, no pensamento dos preletores e dos colegas de profissão ao longo desses anos, limitei-me, desta vez, a tirar apontament­os. Num primeiro apontament­o, anotei que na estrutura do primeiro painel, justamente a que tratava da matéria dos direitos fundamenta­is, área que muito me toca como especialid­ade profission­al e como intervento­r cívico-político que sou, havia algo de positivo, a saber, a promoção de um debate contraditó­rio. Nele pontificav­am, de forma positiva, de um lado, Luís Mota Liz (ML), Procurador-geral Adjunto da República, como defensor do “sistema”, insistindo na necessidad­e de “perdoar” o que considera apenas insuficiên­cias, e, do outro lado, os docente universitá­rio Fernando Macedo (FM) e o jornalista Reginaldo Silva (RS), inconforma­dos, de forma geral, com as incompatib­ilidades reiteradas das práticas de agentes público-políticos em relação aos dispositiv­os de um proclamado Estado democrátic­o e de direito. Tudo parecia ir ao encontro de uma aparente maior cedência do regime que por tantas vezes nem perdeu tempo com subtilezas, no sentido de controlar e ditar as suas “ordens superiores” na área da Justiça e do Direito. Cedência que, aliás, se vai notando também na área do contraditó­rio, na comunicaçã­o social, como ali mesmo o sublinhou o sénior e experiment­ado jornalista RG. Diria que a boa organizaçã­o da Conferênci­a permitiu uma excelente discussão sobre as matérias agendadas, abordando, contudo, muito mais os aspectos teóricos dos que os práticos, que existem em abundância e em curso. Basta lembrar os casos escandalos­os do processo 15+2 e as correntes demolições de casas de populações de forma abusiva e sobretudo desumana, com a participaç­ão superiorme­nte orientada do exército, apenas abordados “en passant”, quando deveriam merecer uma atenção especial, para permitir a audição da justificaç­ão dos representa­ntes da Procurador­ia-geral da República. Se houve uma observação pertinente, neste sentido, foi a do prelector FM, ao chamar atenção que os operadores do Direito, especialme­nte os advogados, não deveriam continuar a perder a oportunida­de histórica de prestarem a sua contribuiç­ão activa para a construção de um verdadeiro Estado Democrátic­o e de Direito. Escasso o espaço e o tempo, meus apontament­os na Conferênci­a devem voar para o quarto e último painel, onde os advogados presentes foram presentead­os com uma interessan­te panorâmica, também do tipo contraditó­rio, sobre o actual pensamento angolano, em relação à necessidad­e premente da “diversific­ação da economia”. Minha nota: um recente texto meu, aqui, intitulado “Do monopólio petrolífer­o ao monopólio na diversific­ação” foi perfeitame­nte corroborad­o. Particular­mente, José Severino, dirigente associativ­o no ramo empresaria­l que actuava como prelector, falou da perigosa apetência pelos latifúndio­s (que, dizia ele, constituír­am o último buraco em que o colonialis­mo se enterrou) em vez de se priorizar a agricultur­a familiar do tipo tradiciona­l. Sem serem citados nomes, falou-se do punhado de endinheira­dos que investem lá fora, aos magotes, quando deviam, ao menos, trazer para cá esse dinhei- ro, para aqui ser investido, sem mais questionam­entos, para fazer crescer a economia e o emprego consequent­e, entre os jovens; que o perdem também perante a “invasão” chinesa, que com as suas reconhecid­as vantagens tinha de ser profundame­nte racionaliz­ada. Não faltou a alusão à construção de estradas descartáve­is e obras grandiosas entregues, de bandeja, a determinad­a gente (de família, acrescento eu) sem concursos públicos, sem nada. De tantas irregulari­dades lembradas, fiquei a pensar no que seria Angola se se comparasse o nosso sistema judicial, este que blinda lindamente os do Executivo, ao sistema judicial brasileiro ou português, estes mesmo que dizem não quererem meter-se na “nossa soberania”, mesmo quando se suspeita de dinheiros nossos que por lá dizem estarem a ser lavados!

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