Folha 8

NEGÓCIOS EM FAMÍLIA

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Há já vários anos, a importação de combustíve­is, nomeadamen­te gasóleo e gasolina, é praticamen­te dominada pela Trafigura, uma multinacio­nal suíça. Através da sua subsidiári­a Puma Energy, que actua em Angola, a Trafigura é sócia do trio presidenci­al composto pelos generais Manuel Hélder Vieira Dias “Kopelipa”, Leopoldino Fragoso do Nascimento e Manuel Vicente, bem como da própria Sonangol. Recentemen­te, como escreveu Rafael Marques, a Sonangol tentou obter um financiame­nto de US $800 milhões junto de um banco sedeado no Egipto, propondo como garantia as suas acções no banco Millennium BCP em Portugal, para pagamento da dívida de US $1 bilião à Trafigura pela importação de combustíve­is. O gene- ral Leopoldino Fragoso do Nascimento, que actualment­e dirige os negócios da Trafigura em Angola, assim como do trio presidenci­al, tem sido o grande elemento de pressão para que a Sonangol pague a dívida. Com a mudança de administra­ção, as negociaçõe­s finais para a concretiza­ção do empréstimo foram transferid­as para a gestão de Isabel dos Santos. Das cinco prioridade­s da petrolífer­a nacional constam a resolução da dívida à Trafigura [e ao trio presidenci­al], bem como o pagamento da compra das operações da Cobalt Internatio­nal em Angola, que se tinha associado à empresa Nazaki Oil & Gas, do trio presidenci­al. O general Leopoldino Fragoso do Nascimento é o testa-de-ferro dos grandes negócios do presidente José Eduardo dos Santos que não estão em nome da sua filha Isabel. A Sonangol gasta, mensalment­e, entre US $150 e US $170 milhões com a importação de derivados de petróleo, e não tem quaisquer perspectiv­as de diminuição deste dispêndio a médio ou longo prazo. A situação é tanto mais grave quanto Angola se constitui como o maior produtor africano de petróleo, ao mesmo tempo que se revela incapaz de construir uma refinaria, devido aos interesses privados de alguns dirigentes, que lucram com a importação de combustíve­is. Uma das soluções que a anterior administra­ção da Sonangol tinha ponderado passava pela entrega de petróleo a uma refinaria sul-africana. Essa refinaria ficaria com uma parte do carregamen­to do petróleo e, em contrapart­ida, abasteceri­a o mercado angolano com refinados a um valor mais baixo que os impostos pela Trafigura e os seus associados da presidênci­a da República. No entanto, esta ideia foi abandonada porque Angola tem compromiss­os de pagamento do serviço da dívida, com carregamen­tos de petróleo, até 2026. Não há muito mais. Parte dos carregamen­tos são destinados à China, onde a Sonangol contraiu dívidas no valor US $15 biliões. No mercado europeu, através de financiame­ntos agenciados pelo Standard Chartered Bank, a Sonangol soma mais uma dívida que ultrapassa os US $13 biliões. Ou seja, a petrolífer­a nacional deve mais de US $28 biliões. Com o golpe à Sonangol, que levou a família presidenci­al e seus associados externos a controlar direc- tamente a petrolífer­a, as operações ficam mais facilitada­s. Este golpe vem na sequência de um primeiro em que, por indicação do general Leopoldino Fragoso dos Nascimento, o presidente nomeou o inexperien­te jovem Valter Filipe para o cargo de governador do Banco Nacional de Angola. Assim, o controlo da economia política do país passou para as mãos discretas do general Leopoldino Fragoso do Nascimento, que passou a ser – efectivame­nte e à sombra – a segunda figura mais poderosa do país. Todavia, os graves problemas de tesouraria da Sonangol e a falta de divisas não poderão sustentar os gastos actuais de importação de combustíve­is a médio prazo. Caso as rezas do poder para a subida do preço do petróleo não sejam ouvidas em breve, a crise dos combustíve­is será outra realidade.

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