MARIO VARGAS LLOSA: UNIVERSAL DA LITERATURA O escritor peruano Mario Vargas Llosa celebrou em Março, 80 anos com uma festa de arromba que se estendeu por três dias. Quase 400 pessoas para um regabofe no luxuoso hotel Villa Magna, em Madrid. Na lista de co
Vargas Llosa costumava viajar à Arequipa, a cidade peruana onde nasceu, todos os anos em seu aniversário. Ainda que as celebrações de seus 80 anos ocorram em Espanha, o Peru continua no centro das preocupações do escritor. Cinco esquinas, seu novo livro, publicado no início do mês nos países de língua espanhola, é ambientado em Lima, a capital peruana, durante a ditadura de Alberto Fujimori (1990-2000). Uma das figuras centrais no romance é Vladimiro Montesinos, chefe do serviço de inteligência do ex-ditador – ambos estão presos por crimes contra a humanidade. Cinco esquinas narra a relação promíscua entre a ditadura e a imprensa sensacionalista, especializada no assassinato de reputações. Veículos alinhados ao regime se converteram em fábricas de escândalos cujo único propósito era destruir os opositores de Fujimori. “Foi algo original da ditadura fujimorista, criar e financiar diários para castigar seus críticos”, afirmou Vargas Llosa à imprensa espanhola. Vargas Llosa, quando moço, fazia coro a outros escritores latinos, como o colombiano Gabriel García Márquez, que sonhavam com o socialismo nos trópicos. A passagem dos anos, porém, levou o peruano a caminhar a passos largos rumo à direita. Em 1990, ele concorreu à presidência do Peru pela coalização Frente Democrático (Fredemo), defensora de reformas neoliberais e cujo programa de governo ganhou o apelido de “thatcherismo andino”. Vargas Llosa foi derrotado por Fujimori, que soube capitalizar o receio que as medidas de austeridade propostas pela Fredemo despertavam nos mais pobres. Os adversários do escritor também apelaram para o conservadorismo popular e liam – em público – trechos tórridos dos romances do libidinoso candidato liberal, um mestre do erotismo literário. Ao recuperar os horrores dos anos Fujimori em Cinco esquinas, Vargas Llosa manda um recado ao Peru, que vai às urnas escolher um novo presidente no dia 10 de abril. Keiko Fujimori, filha do ex-ditador, lidera as pesquisas. >> As histórias infantis de James Joyce Cinco esquinas ainda não ganhou edição em português, mas acaba de chegar às livrarias brasileiras um livro de Vargas Llosa que pode ser lido até pelos mais pudicos – não contém cenas eróticas. O barco das crianças (Alfaguara, 112 páginas, R$ 49,90) é o segundo livro infanto-juvenil do escritor. A primeira incursão de Vargas Llosa pela literatura infantil foi em 2010, ao publicar Fonchito e a lua. O pequeno Fonchito (que também é coadjuvente de vários livros adultos de Vargas Llosa, como O herói discreto) morria de vontade de beijiar Nereida, que aceitaria o carinho do menino em troca de um presente: a lua. Em O barco das crianças, Fonchito já é um mocinho. Todo dia, a caminho da escola, ele passa por um velhinho que contempla o mar. Interrogado pelo menino, o velho se faz se Sherazade e promete contar uma história – mas só um pedaço por dia. Fonchito volta todas as manhãs para ouvir mais um capítulo da história de um barco apinhado de crianças que singra os mares desde o tempo das Cruzadas. “Aprendi a ler aos cinco anos de idade. Foi a coisa mais importante da minha vida”, discursou Vargas Llosa ao receber o Nobel. “Quase 70 anos depois, lembro-me com nitidez como essa magia – transformar as palavras dos livros em imagens – enriqueceu minha vida, quebrando as barreiras do tempo e do espaço”. É essa magia que Fonchito econtrava todas as manhãs ao se sentar no mesmo banco que aquele velhinho a olhar o mar. E é essa magia que os leitores encontram ao mergulhar nos livros de outro velhinho, Vargas Llosa, o mais novo octogenário da literatura.