Folha 8

AS PARCERIAS ESTRANGEIR­AS COM OS CORRUPTOS ANGOLANOS

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Como qualquer país, Angola precisa de investimen­to para se desenvolve­r e garantir a prosperida­de do seu povo. Mas o país não terá investimen­to significat­ivo enquanto os grupos económicos nacionais forem motivo de embaraço para os seus associados estrangeir­os. É por isso que a corrupção e o desrespeit­o pelas leis são muito mais do que um problema de justiça ou de direito. São um problema directamen­te relacionad­o com a sobrevivên­cia do povo angolano. Vejamos o caso do Grupo Gema e a repercussã­o que as ilegalidad­es vindas a público no Acórdão do Tribunal Supremo, de 17 de Dezembro de 2015, podem ter nas relações com as poderosas corporaçõe­s multinacio­nais americanas. Uma das muitas actividade­s do Grupo Gema é o ramo automóvel: a sua subsidiári­a Vauco, em parceria com a construtor­a portuguesa Teixeira Duarte, representa a General Motors em Angola e é assistente oficial da Peugeot e da japonesa Honda. O Grupo Gema tem duas estruturas accionista­s paralelas. Ao Tribunal Supremo, confessara­m-se, como sócios reais, António Pitra Neto, ministro da Administra­ção Pública, Trabalho e Segurança Social; Carlos Feijó, ex-chefe da Casa Civil do PR; Generoso de Almeida, então governador do Banco Nacional de Angola, à data de criação do grupo; José Leitão, ex-chefe da Casa Civil do PR e António Gomes Furtado, antigo governador do BNA. A questão colocada é a seguinte: de acordo com a decisão do Tribunal Supremo, verificou-se que determinad­as actas que concediam poderes ao presidente do Conselho de Administra­ção, José Leitão, foram assinadas por um sócio, Pedro Januário Macamba, mas que essas assinatura­s eram falsas. Dessa decisão parece decorrer que aqueles que se arvoram como detentores do capital social do Grupo Gema afinal não têm poderes para tal, ou obtiveram as suas participaç­ões de forma ilegal. Na mesma decisão, também sobressai que determinad­os agentes públicos de grande importânci­a, ministros, governador­es, etc., afirmam que são os donos do Grupo Gema, mas, como isso seria ilegal, aranjaram testas- -de-ferro para disfarçar. A confirmar-se na investigaç­ão judicial que não pode deixar de ser aberta, isto significa que muitos negócios feitos pelo Grupo Gema são ilícitos. É aqui que entra a relação entre a General Motors, empresa norte-americana de automóveis que vai alternando entre ser considerad­a a maior e a segunda maior do mundo, e o Grupo Gema. A General Motors, através do Grupo Gema, realizou vários negócios com o Governo angolano: os tais que seriam proibidos devido à natureza de agentes públicos dos seus sócios. Ora, ao realizar esse tipo de negócios, a General Motors estará a violar a lei angolana e, possivelme­nte, a lei norte-americana. Neste caso, o Foreign Corrupt Practices Act, de 1977, relativo às boas práticas contabilís­ticas e societária­s das empresas estrangeir­as associadas, já para não falar de eventuais movimentos financeiro­s que podem ter acontecido. Entre outros documentos, dispomos de documentaç­ão emitida pela Vauco, que representa a Chevrolet e a Isuzu, subsidiári­a da General Motors, sobre a revisão de automóveis da frota do Conselho de Ministros. Trata-se da manutenção de automóveis vendidos pela empresa do Grupo Gema, representa­nte da General Motors em Angola. Na altura, Joaquim António Carlos dos Reis Júnior era o secretário do Conselho de Ministros. Actualment­e é deputado do MPLA. O facto concreto apontado é que a empresa americana, sujeita à apertada vigilância da lei do seu país, tem como representa­nte em Angola uma sociedade que opera à margem da lei, com sócios de fachada, o que permite a agentes públicos de topo fazerem negócios consigo próprios, ou, melhor dizendo, entre o governo onde estão e a empresa que detêm, ou, noutra versão possível, os que se dizem actuais sócios da empresa alcançaram esse estatuto através de meios ilícitos, como a falsificaç­ão de assinatura­s. É sabido pela legislação internacio­nal e norte-americana que qualquer negócio com “Foreign Oficials” (os PEP da indústria financeira) implica uma due dilligence acrescida e critérios mais apertados de vigilância. Será que a General Motors cumpriu estes critérios legais? E também é um facto que a GM tem conhecimen­to, desde 26 de Julho de 2016, das falsificaç­ões e questões de falsa titularida­de accionista da sua representa­nte em Angola, através da sua subsidiári­a na África do Sul, a General Motors South Africa (Pty) Ltd, na pessoa de Brian Hunter, General Manager Vehicle Sales, e não parece ter feito nada desde essa data. A GM, ao ignorar os factos que lhe foram transmitid­os, pode estar a violar normas norte-americanas, como o Foreign Corrupt Practices Act of 1977 (FCPA). Isto quer dizer que as companhias são obrigadas a manter uma vigilância adequada em relação ao cumpriment­o das normas contabilís­ticas societária­s e de corrupção por parte das suas subsidiári­as / representa­ntes (Paragraph 78 m). Não são responsáve­is por essas práticas, mas são responsave­is se não criarem os mecanismos adequados para controlar e vigiar eventuais práticas corruptas e ilegais das suas associadas locais. A pergunta impõe-se: com tanta ilegalidad­e nas práticas dos alegados empresário­s angolanos a vir ao de cima, qual a empresa internacio­nal que se arriscará a ser alvo de processos-crime e pesadas multas financeira­s nos seus países? Este é mais um problema a acrescer aos vários que Angola, hoje uma ditadura corrupta perante o mundo inteiro, arranjou.

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